Dom Pedro José Conti
Trêsamigos decidiram viver a própria vida com paixão; depois iriamencontrar-se novamente. O primeiro viajou muito: descobriu novasterras, navegou por novos mares, trouxe para casa produtos nuncavistos; e o seu rosto revelava os sinais da sua intensa experiência. Osegundo estudou: trouxe à luz novos pensamentos, apontou ao homemhorizontes inesperados, idéias e metodologias de pesquisa antesimpensadas; e o seu rosto revelava a nobreza de quem sabe das coisas. Oterceiro amigo começou a namorar, casou, teve muitos filhos, precisoutrabalhar duro para sustentar a numerosa família; e o seu rosto ficoucomo de uma pessoa qualquer, sem nenhum vestígio especial.
Quandoos três se encontraram de novo, o terceiro amigo não pode esconder aprópria decepção: como tinha sido pequena a paixão da vida deleconfrontada com as grandes paixões dos outros amigos.
Quando,porém, voltava para casa, desiludido e magoado, um santo homem o parou,tomou-o pela mão e conduziu-o à beira de um rio que passava por perto.Apontou-lhe uma ponte e disse-lhe: “Está vendo aquela ponte e os doispilares que a sustentam? Os dois pilares são os seus amigos: sem aciência e sem o conhecimento a ponte não se sustentaria. Mas as tábuasda ponte são você, que sustenta o peso de muitos. Aquelas que vocêpensa terem sido pequenas coisas e paixões insignificantes são cada umadas tábuas, que uma após a outra, dia após dia, tornaram possível apassagem de muitos de um lado para o outro do rio. O rosto do homemiluminou-se e assumiu aquela altivez que cada um deveria ter, setomasse consciência do valor grande e profundo de cada gesto pequeno ecotidiano.
Maisuma pequena história. Dessa vez para lembrar os pais no domingo a elesdedicado. Sobretudo aqueles pais que não são famosos, que trabalhamhumildemente, todos os santos dias do ano inteiro. O suor e o esforçodeles passa despercebido. Na realidade a sua labuta é muito grande paraas suas famílias e para todos os que sabem reconhecer as contribuiçõeshumildes de tantos trabalhadores.
Infelizmenteestamos todos um pouco doentes de estrelismo. Damos valor somenteàquilo que nos é apresentado como grande, importante, que se destaca. Arotina cotidiana nos parece inútil e vazia. As coisas feitas sempre nomesmo horário e do mesmo modo ficam logo desprezadas. Quantas criançasesquecem-se dos seus pais simplesmente porque eles saem de manhã paratrabalhar e só voltam de noite cansados. Quantos adolescentes gostariamver os seus pais de baixo dos holofotes, recebendo palmas,reconhecimentos e, talvez, dinheiro. Decididamente estamos desprezandoas coisas simples, os gestos pequenos, repetidos no cumprimentosilencioso e humilde do próprio dever. Um pouco como o arroz e o feijãoque as nossas mães cozinham todos os dias. Quem se lembra de agradecer?
Nãoé por acaso que Jesus escolheu como sinal da Eucaristia o pão. Naqueletempo e na terra dele não tinha nenhum alimento tão cotidiano eindispensável. Uma daquelas coisas tão comuns que nos lembramos delassó quando percebemos a sua falta. Outra “coisa” dessa é a água boa, porexemplo. Por ser tão simples, Jesus escolheu o pão abençoado erepartido como sinal da presença dele, memória do seu amor total naentrega da sua vida. Jesus pode repetir: “Eu sou o pão da vida” –porque nos ama todos os dias, assim como a vida só tem sentido sereaprendemos a amar-nos sempre de novo. Sem precisar de sucesso, deaplausos, de fama e de tudo aquilo que dá vertigem a quem está no topo,e inveja aos que ficam em baixo.
Benditaa vida simples, bendita a rotina do bem, feito no dia a dia, nasimplicidade e na sinceridade. Uma vida que não precisa de brilhoespecial, porque está cheia de gestos luminosos por si mesmos,iluminados pela luz do amor, a única luz que se alimenta e seintensifica por ela mesma.
Paraos filhos que sabem ver, cada pai, por humilde, pobre e simples queseja, é uma grande luz. Benditos os pequenos pais que amam com umgrande amor as suas famílias todos os dias e a vida inteira, sempre.Como Deus Pai.