Quem venera realmente a paixão doSenhor deve contemplar de tal modo, com os olhos do coração, Jesus crucificado,que reconheça na carne do Senhor a sua própria carne.
Trema a criatura perante osuplício do seu Redentor, quebrem-se as pedras dos corações infiéis e saiampara fora, vencendo todos os obstáculos, aqueles que jaziam debaixo de seustúmulos. Apareçam também agora na cidade santa, isto é, na Igreja de Deus, comosinais da ressurreição futura e realize-se nos corações o que um dia serealizará nos corpos.
A nenhum pecador é negada avitória da cruz e não há homem a quem a oração de Cristo não ajude. Se ela foiútil para muitos dos que o perseguiam, quanto mais não ajudará os que a ele seconvertem?
Foi eliminada a ignorância daincredulidade, foi suavizada a aspereza do caminho, e o sangue sagrado deCristo extinguiu o fogo daquela espada que impedia o acesso ao reino da vida. Aescuridão da antiga noite cedeu lugar à verdadeira luz.
O povo cristão é convidado agozar as riquezas do paraíso, e para todos os batizados está aberto ocaminho de volta à pátria perdida, desdeque ninguém queira fechar para si próprio aquele caminho que se abriu também àfé do ladrão arrependido.
Evitemos que as preocupaçõesdesta vida nos envolvam na ansiedade e no orgulho, de tal modo que nãoprocuremos, com todo o afeto do coração, conformar-nos a nosso Redentor naperfeita imitação de seus exemplos. Tudo o que ele fez ou sofreu foi para anossa salvação, a fim de que todo o Corpo pudesse participar da virtude daCabeça.
Aquela sublime união da nossanatureza com a sua divindade, pela qual o Verbose fez carne e habitou entre nós (Jo 1,14), não excluiu ninguém da suamisericórdia senão aquele que recusa acreditar. Como poderá ficar fora dacomunhão com Cristo quem recebe aquele que assumiu a sua própria natureza e éregenerado pelo mesmo Espírito por obra do qual nasceu Jesus? Quem nãoreconhece nele as fraquezas próprias da condição humana? Quem não vê quealimentar-se, buscar o repouso do sono, sofrer angústia e tristeza, derramarlágrimas de compaixão, eram próprios da condição de servo?
Foi precisamente para curar anossa natureza das antigas feridas e purificá-la das manchas do pecado, que oFilho Unigênito de Deus se fez também Filho do Homem, de modo que não lhefaltasse nem a humanidade em toda a sua realidade, nem a divindade em sua plenitude.
É nosso, portanto, o que estevemorto no sepulcro, o que ressuscitou ao terceiro dia e o que subiu para aglória do Pai, no mais alto dos céus. Se andarmos pelos caminhos de seusmandamentos e não nos envergonhamos de proclamar tudo o que ele fez pela nossasalvação na humildade do seu corpo, também nós teremos parte na sua glória.Então se cumprirá claramente o que prometeu: Portanto, todo aquele que sedeclarar a meu favor diante dos homens, também eu me declararei em favor delediante do meu Pai que está nos céus (Mt 10,32).