Quando falamos em Igreja, levantamos um grande assunto. Pois se trata de um grande projeto, nascido de Deus, fundado em Cristo, assumido pelo Espírito Santo, destinado a reunir toda a humanidade.
Em nosso tempo, este assunto recebeu uma atenção especial por ter sido tema central do Concílio Ecumênico Vaticano Segundo. Depois de dois mil anos de caminhada histórica, pelo Concílio a Igreja resolveu se olhar de frente, para se perguntar como Deus a quer, e conferir como historicamente ela se encontra, e que passos é chamada a dar para se colocar mais de acordo com os desígnios que Deus tem a respeito dela.
Isto colocou em questão, evidentemente, todos os que invocam o nome de Jesus, e querem se sentir integrados em seu projeto de Igreja. Isto é muito salutar. Pois, em princípio, a reflexão sobre a Igreja deveria deslocar o olhar das disputas entre os cristãos, para centrar o olhar em Cristo, no seu Evangelho, e no exemplo que nos deixaram os primeiros cristãos. Para a partir daí, todos percebermos o grande desafio que apresenta a vivência autêntica deste ambicioso projeto de Deus, colocado com temeridade nas mãos da humanidade.
Vivemos hoje, portanto, um tempo em que o assunto Igreja está mais em evidência. Não estranha que ele suscite uma forte discussão toda vez que volta ao centro de nossas atenções.
A experiência mostra que para falar adequadamente sobre a Igreja, é preciso despir-nos de atitudes arrogantes, e assumir a postura de quem quer contar com a graça de Deus e a luz do seu Espírito. Para garantir esta atitude, nada melhor do que colocar-nos em oração, pois ela nos coloca em sintonia com o mistério de Deus.
Daí o velho ditado teológico, que afirma: “lex ordandi, lex credendi”. Isto é, “a lei da oração é a lei da fé”. Ou em outras palavras, a oração nos ensina a crer. Somos convidados a crer da maneira como rezamos. Na justa suposição de que quando nos colocamos em oração, damos a palavra a Deus, que nos conduz pelos caminhos da sua verdade, que são os mesmos caminhos do seu amor.
Pois bem, desde os primeiros concílios ecumênicos, onde a Igreja procurou as palavras humanas mais adequadas para expressar as grandes verdades divinas que ela recebeu, rezamos no Creio da seguinte maneira a respeito da Igreja: “Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica”. Assim rezamos, com a graça de Deus. Assim devemos crer, em obediência à verdade que esta oração expressa.
Claro que com isto não está dito tudo. Tanto que depois desses concílios que guiaram a Igreja por longos séculos no primeiro milênio, surgiram novas discussões, que infelizmente resultaram em grandes e dolorosas divisões, que ao contrário de diminuir, parecem se agravar, mesmo depois do leal esforço do último Concílio em colocar as bases para a reconciliação histórica de todos os cristãos.
É orçoso constatar que o peso do pecado humano ainda continua exercendo forte influência na maneira como os cristãos abordam a questão da Igreja. Deveríamos estar mais atentos, para ver o que colocar na conta do pecado, e o que colocar na conta da graça, a situação concreta em que se encontra a Igreja, para usar um singular que tenta envolver a todos os que possuem a boa intenção de integrar a verdadeira comunhão eclesial querida por Deus.
Na oração eucarística rezamos pela Igreja “santa e pecadora”. É santa em sua origem, pois brotou da misericórdia do Pai, nasceu do amor de Cristo, e é sustentada pela ação do Espírito. Olhando para Deus, nele encontramos a Igreja perfeita. Olhando para a humanidade, logo percebemos os estragos produzidos pelo pecado.
Bem dizia João 23 que a união dos cristãos precisa começar pela oração. Pois ela nos coloca em sintonia com a Igreja perfeita que está em Deus, e nos mostra que o caminho da unidade não avança com discussões, mas progride pela humildade e pelo amor.
Dom Demétrio Valentini
Bispo de Jales (SP)
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Fonte: CNBB