Nós, homens e mulheres do III milênio, estamos correndo umgrande risco: tornar-nos de novo “primitivos e brutos na compreensão do amor”,e por isso não podemos entender a beleza da eternidade do amor conjugal que épara sempre e o que “Deus uniu” não pode ser separado. E que todo o homem échamado a se tornar “um” não somente no sacramento do matrimônio, onde duascarnes, “feminina e masculina” são chamadas a ser uma só carne, um só corpo, mas também nos corações.
Os Atos dos Apóstolos nos recorda que na primeira comunidade cristã “havia um sócoração e uma só alma”, e o mesmo Jesus nos fala tão forte desta unidade: “eu eo Pai somos um…ó Pai, que eles sejam um como nós somos um!” Somos chamadosportanto a realizar o desejo mais profundo do corpo, do espírito, ser “um”,superando todas as fragilidades e divisões interiores. Este desejo de unidade étão forte no ser humano que não pode sufocá-lo. É preciso porém que estecaminho para a unidade, seja fundamentado não sobre os sentimentos passageirosmas sobre o amor que é o mesmo Deus. Sem Deus não há comunhão e nem unidade. Umdiscurso que mexe conosco e nos faz sentir mal e nos obriga a buscar por todosos lados, saídas para podermos justificar a nossa falta de amor.
De que amor Jesus fala? Do amor entrega e doação sem reservas ao outro. Por isso, para compreender a beleza do matrimôniohumano, da união sexual do casal, e da união da alma dos amigos, dos cristãos,devemos ultrapassar toda aparência, e mergulhar-nos no amor infinito. A vida éo mais sublime matrimônio entre a nossa natureza humana e Deus; em Jesus somoschamados a esta maravilhosa união de amor. E os místicos com sua profundidade e com sua sensibilidade,nos falam de um matrimônio que transcendendo o corpo, se une a Deus, o“Matrimônio espiritual” onde a pessoa e Deus se fundem sem perder a própriaindividualidade, numa realidade sublime.
O amor não pode ser condicionado a beleza, a juventude, asedução, ao prazer, a felicidade, o amor sempre deve ser marcado pela presençada força da cruz. A unidade exige que cada um saiba renunciar uma parte de simesmo para criar uma nova comunhão.
O que Deus uniu…o homem não separe! Estas palavras deJesus parecem aos olhos de um mundo hedonista onde o sexo perdeu o seu“mistério” e mística, algo de ultrapassado que não tem mais valor. Os que têm“dureza de coração” lutam com todas as suas forças para que a Igreja,“fraquejando”, amenize e “dietize” as palavras do evangelho. Mas a Igrejanão tem autoridade para fazer isto. Eladeve transmitir o evangelho de Jesus que ela mesma recebeu, interpreta-lo, eoferecer uma reta leitura. Por isso o divórcio será sempre uma ruptura do amorinfinito, que fere a dignidade da pessoa e a palavra dada. O amor é para sempreporque nasce de Deus e nos leva a Deus. A palavra de Deus não veio e não éfeita para “massagear” os nossos instintos e sonhos mas para confrontar-nos coma verdade para que a verdade nos liberte a partir de dentro do nosso coração.
Uma vez a sós os discípulos “assombrados, preocupados eangustiados” com as palavras de Jesus sobre o matrimônio quiseram que eleexplicasse. As explicações de Jesus têm uma clareza impressionante e não deixamnenhuma dúvida e brecha. “Jesus lhes respondeu: “Quem divorciar-se de suamulher e casar com outra, comete adultério contra a primeira. E se a mulher sedivorciar do marido e casar com outro, comete adultério”.(Mc 10, 11-12)
O que dizer? Crer. Assumir.
É interessante como Marcos acrescenta logo em seguida otexto das “crianças” que não devem serimpedidas de se aproximar de Jesus. Somente quem tiver o coração de criança serácapaz de amar, compreender o Reino de Deus, mergulhar-se no mistério da unidadedivina e humana. O coração de criança não é marcado pela malícia, mas peloamor. Elas sabem viver o amor e quandose desentendem sabem com extrema facilidade se “reconciliar” por que se amam.Assim deve ser o nosso amor humano e divino. Caminhar para a unidade, e quandopecamos se nos afastamos da unidade, pedir perdão e voltar à união. A dureza docoração nos impede de nos amar e compreender o amor.