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Entrevista com Ronaldo Pereira: Jovens cristãos inseridos no mundo

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ronaldo juventudeRonaldo Pereira, jovem guerreiro que soube ofertar de forma incondicional a sua vida pelos jovens, missionário da Comunidade de Vida Shalom, faleceu em fevereiro de 1995 em um grave acidente de carro próximo a cidade de Fortaleza, quando vinha de uma missão. Foi Presidente da RCC Jovem do Ceará e Coordenador do Projeto Juventude para Jesus da Comunidade Shalom. Ele havia dito muitas vezes: “Meu maior desejo é dar a vida pelos jovens!”.

Bem humorado e muito organizado, como afirmou sua mãe Socorro Pereira, o jovem, depois de sua conversão, passou a ter um grande respeito e devoção a Nossa Senhora, inclusive inserindo na Comunidade o ícone Maria Porta do Céu e a Consagração a Nossa Senhora segundo o método de São Luís Maria Grignion de Montfort.

Em julho de 1993, a Revista Shalom Maná, publicou entrevista com ele, sobre o Projeto Juventude para Jesus: o que é, como surgiu e qual a sua participação nas primeiras etapas de fundação do Projeto. Confira:

Shalom Maná: O que é o Projeto Juventude dentro da Obra Shalom?

Ronaldo: O Projeto Juventude é uma estrutura pastoral que trabalha com jovens, na evangelização e na formação, com o mesmo carisma Shalom, de uma maneira específica, desenvolvendo os potenciais da própria juventude Shalom. Existe uma estrutura de intercessão; uma estrutura de cura e aconselhamento; um setor para promoção esportiva; um setor para desenvolver a fraternidade, através de festas, confraternizações, lazeres; um setor de comunicação para maior interação entre os jovens de Fortaleza. Temos, também, uma secretaria, um setor de engajamento, onde estamos sempre buscando serviços, oportunidades de trabalho para os jovens na Obra, em ministérios materiais e espirituais. O Projeto se propõe a evangelizar e a formar jovens através dos próprios jovens.

SM: você tem convivido bastante com os jovens, com as suas dificuldades, com o seu entusiasmo e abertura para Deus. Como é a espiritualidade jovem?

R: A espiritualidade do jovem segue aquilo que fala Santo Agostinho, “a Graça supõe a natureza”, então, é influenciada, de certa forma, pela formação humana, cultural e psicológica, e pelo momento que o jovem vive. Esses aspectos naturais interferem na espiritualidade do homem em si. E o jovem traz características próprias em termos de instabilidade, de emocionalidade, em momentos de grande ousadia, em outros momentos de profunda retração. É próprio da juventude os extremos. Também a falta de perseverança no jovem, sem dúvida, é um dos grandes problemas, mas ao mesmo tempo em que ele tem esse problema, tem muitos outros talentos que Deus lhe deu e que compensam. E Deus, pela Sua Igreja, pelo ministério de Jesus e pelos Santos que trabalharam com jovens sempre mostrou que é no jovem que reside essa semente que Deus quer fazer no seio da Sua Igreja, porque ele traz muitos talentos que compensam essa dificuldade, essa fragilidade, que são naturais do seu desenvolvimento físico, psicológico e humano. Então, a dificuldade da perseverança existe, é um fato, mas, progressivamente, com o amadurecimento da fé e o amadurecimento humano, vai se dissolvendo. O jovem traz outros talentos: a fé, a ousadia, o vigor, a força de criar coisas novas, o desejo de se doar, de se lançar, que compensam, de certa forma, sua falta de perseverança. E cada vez que surge um jovem que usa esses talentos naturais para buscar a santidade e dar um testemunho vivo, os outros aderem por sua vez a esse grande chamamento de Cristo. Por outro lado, a espiritualidade do jovem sofre essas interferências do seu comportamento natural e humano e exige um trabalho de auxílio e orientação. Tendo conhecimento dessas fragilidades, buscamos, assim, com essa pedagogia, aproveitar o que existe de bom nessa fase tão nobre, que é a fase em que nos abrimos para o mundo, em que somos mais generosos ao nos doarmos para Deus, onde temos uma busca mais radical da vontade de Deus.

SM: Quais os frutos do Projeto Juventude na Obra Shalom?

R: O grande fruto do Projeto são as transformações de vida dos jovens, que, por meio da evangelização, encontram o Deus Vivo, e aderem a esse chamado de vida nova. Muitos engajados em um grupo de oração têm realmente uma vida nova, uma caminhada para a santidade, outros se engajam mais afincadamente na Obra, assumindo compromissos, e muitos abraçam vocações específicas. Muitos jovens já abraçaram a vocação carmelita, salesiana, outras comunidades da Renovação Carismática e outras ordens religiosas. Grande parte assumiu o chamado à vocação Shalom. E muitos que passaram por grupos de oração de jovens estão hoje em comunidades missionárias. Acho que o grande fruto do Projeto Juventude não é só para o Shalom, mas para a própria Igreja de Fortaleza, para a Igreja de Deus. Este fruto consiste em que, tendo uma experiência com o Deus Vivo através da evangelização, acabam, numa atitude de louvor e gratidão, doando a própria vida para servir ao Reino de Deus, para morrer em favor de Jesus, através do serviço na Sua Igreja.

SM: Em relação ao lazer, é muito comum a idéia de que o jovem cristão não se diverte. Ao mesmo tempo, o Projeto tem incentivado o lazer na juventude. O que você poderia dizer sobre isso?

R: Realmente, o que existe é uma mentalidade errada de que o cristão não se diverte. E, na verdade, é vontade de Deus que se resgate também o lazer para Cristo, e é missão nossa, como cristão, ser, para o mundo, modelo de lazer, porque o que vemos é, cada vez mais, acirrarem-se as armas do inimigo através do lazer que o mundo oferece, tendo em vista principalmente a juventude. Esses blocos de carnaval fora de época; nas FM’s, a linguagem que é passada; as mensagens que são introduzidas nas músicas, transmitidas pela televisão, que é talvez, queiramos ou não, uma peça de lazer fundamental na vida de todo ser humano, hoje. Quantas horas uma pessoa não passa diante de uma televisão? Na verdade, temos criado lazeres alternativos, temos cristificado alguns ambientes. É o que acontece com os jovens cristãos que vão para lanchonetes, numa turma de amigos cristãos e se divertem ou promovem festas nas casas de amigos, com aquela orientação pastoral que a gente dá, no sentido de não haver desvio na seleção de músicas e tudo mais. Então existe essa mentalidade de que o jovem cristão não se diverte, não pode ter lazer porque o mundo apresenta esse cenário acirrado pelo pecado. A verdade é que nós devemos resgatar o lazer.

SM: E como nós podemos fazer esse resgate?

R: Acredito que seja colocar a vida nova, que recebemos de Deus nessas formas de diversão. Não é simplesmente discernir, separar: eu posso ir para esse lugar, eu não posso ir para esse outro lugar. Também se faz isso. Mas o básico é contaminarmos esses ambientes com essa Vida Nova, que é o próprio Cristo, com muita naturalidade, com muita simplicidade, sem levantar faixa, sem nada, simplesmente na maneira de ser, na conduta, com a mentalidade cristã, em frequentar uma praia, uma lanchonete, ou ir para um filme que eu vejo que não tem mentalidade nem traz mensagem anticristã.

SM: Como está a formação cultural do jovem hoje em dia?

R: Nós observamos que os jovens, ao se converterem, permitem que Jesus Cristo, a Salvação, atinja as suas vidas, mas atinja somente alguns aspectos que eles salientam muito, que é a salvação da vida no sentido da cura das feridas, da libertação do pecado, tudo no âmbito da espiritualidade, e esquecem que Jesus Cristo, ao se sacrificar na cruz, ofereceu–se como salvação para o homem como um todo. Ele quis salvar não somente a alma, mas também o corpo. Nós temos uma visão muito clara quanto à cura física, por meio dessa salvação, mas Jesus também quis salvar a mente do homem.

A cultura, a sociedade, a economia, a política, a educação, enfim, tudo está ao redor. Então, a salvação de Jesus Cristo tem um efeito muito completo: o eu-pleno, o eu-todo-ser, e não alguns aspectos da minha vida. O que observamos é que os jovens reduzem essa experiência com Deus a um plano espiritual, que deve ser intenso, mas que deve transbordar em todo o ser, na vida, nos estudos. O cristão deve ter uma formação humana superior aos não cristãos. Um exemplo bíblico é São Paulo. São Paulo estudava Teologia para melhor expressar a fé, para melhor evangelizar. Ele não estudava a Teologia pela Teologia, para ter conhecimento, mas colocava a Teologia a serviço da fé. É necessário abrir a mente com relação a isso, mais que o mundo. Agora, como cristãos, temos a necessidade de termos uma boa formação, como São Paulo tinha, para que, tendo essa boa formação cultural possamos ser cristãos autênticos e inseridos no contexto da realidade, para que nunca possam nos acusar de alienados, mas sermos reconhecidos como jovens com os pés no chão e com o coração ligado em Deus. E assim, o nosso testemunho vai ter mais eficácia, porque não seremos lunáticos, mas jovens cristãos inseridos no mundo.

Fonte: Revista Shalom Maná


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