A capital do Brasil vai receber no próximo dia 11 de junho, uma quarta-feira, a Caminhada Jogue a favor da vida – Denuncie o tráfico de pessoas. O evento é uma das várias iniciativas da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB) na prevenção e combate ao tráfico humano, que movimenta cerca de 32 bilhões de dólares em todo o mundo, segundo a Organização das Nações Unidas.
Com a parceria da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a rede internacional de religiosas contra o tráfico Talitha Kum, a caminhada tem a coordenação da rede Um Grito pela Vida, grupo pertencente à CRB, que trabalha há seis anos com a questão em vários estados e municípios brasileiros.
Irmã Rosa Maria Martins, mineira consagrada à congregação dos Missionários São Carlos Borromeo Scalabrinianas, condeceu entrevista ao Zenit sobre a caminha e a questão do tráfico humano. Irmã Rosa trabalha como assessora executiva para comunicação da CRB e encontra no próprio carisma uma ligação muito forte com a campanha desenvolvida pela entidade. A congregação de São Carlos tem como missão acolher os migrantes que estão fora da pátria de origem e sofrem com o desemprego e preconceito, entre outros.
Logo que começou a adentrar o assunto de tráfico de pessoas, irmã Rosa participou da CPI de mesmo tema, no Congresso Nacional. Lá teve contato com a triste história de várias mulheres iludidas pelo sonho de serem modelos e trabalharem em países estrangeiros: elas acabaram caindo na mão de traficantes. “Nunca tive antes um contato mais próximo com pessoas que sofreram com o tráfico na própria pele. Na CPI pude conhecer esta chocante realidade e ter uma compreensão maior do drama destas meninas”, conta.
Além do convite para trabalho no exterior, outra ação comum entre os criminosos é a adoção ilegal de crianças nascidas em famílias carentes. Muitos pais também se deixam levar pela conversa de que os filhos levados por ‘pessoas de bem’ terão uma vida melhor do que a deles, que sofrem em meio às dificuldades da miséria.
Irmã Rosa conta que a CRB trabalha no sentido da conscientização destas pessoas. “As religiosas trabalham de forma discreta mas efetiva nas bases. As pessoas atingidas por este crime estão inseridas em uma realidade complexa, em que se tornam vulneráveis. Se o país não oferece educação e condições de sobrevivência, muitos acabam vendo nestes convites uma oportunidade. Mas em pouco tempo percebem que caíram em uma armadilha”.
Segundo a irmã Rosa, as mulheres são as mais visadas neste crime lucrativo. Elas formam um perfil específico: em geral, são desempregadas, mães solteiras, têm baixa escolaridade, são menores de idade, moram em regiões periféricas e já sofreram abuso. Em todo o mundo, 30% das mortes de mulheres tem causa no tráfico de pessoas e exploração sexual.
O Brasil é trânsito e destino para o tráfico interno e externo de milhares de crianças, adolescentes e jovens, na faixa etária de 10 a 29 anos. As regiões com maiores rotas de tráfico internacional e interestadual são o norte e nordeste, seguida de perto pela sudeste. A lucratividade desta atividade ilegal no país só perde para a do tráfico de drogas.
A organização da campanha contra o tráfico humano durante a Copa começou após um diagnóstico revelar que os países sede das duas últimas edições da Copa (Alemanha e África do Sul), tiveram um significativo aumento da exploração sexual – decorrente do tráfico de pessoas – durante a realização do evento.
A caminhada
Marcada para começar às 19h, com concentração no Museu Nacional da República, a caminhada pretende reunir entre 500 e 1000 pessoas na Esplanada dos Ministérios. O itinerário começa com orações e reflexões de dom Leonardo Ulrich Steiner, bispo auxiliar de Brasília e secretário geral da CNBB, irmã Maria Inês Vieira Ribeiro, presidente da CRB, e padre George Tarjra Albuquerque, assessor pastoral da arquidiocese de Brasília.
Os participantes da caminhada devem trazer lanternas e uma flor, que será colocada no gramado frontal ao Senado Federal. O ato simbólico quer trazer à memória crianças, jovens, homens e mulheres que morreram ou desapareceram como vítimas do tráfico de pessoas. Todo o percurso será silencioso e feito de forma oracional. De duas a três faixas do Eixo Monumental devem ser utilizadas para a caminhada.
A iniciativa nasceu em um retiro espiritual dos jesuítas, em que participaram integrantes da CRB. “A organização para a caminhada já está quase toda estabelecida. A caminhada tem a ação de Deus, é da vontade d’Ele. Aproveitamos a ocasião para oferecer a caminhada à Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, padroeira de Brasília e também uma mulher, que entende o sofrimento das mulheres que passaram e passam pelo tráfico de pessoas”, explica irmã Rosa.
A iniciativa também conta com o apoio das Pontifícias Obras Missionárias (POM), Centro Cultural Missionário (CCM), Comunidade de Vida Cristã (CVX), Cáritas Brasileira, Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, pastorais e movimentos da arquidiocese de Brasília e da Ação Episcopal Alemã Adveniat, entre outros.
Quem vier participar deve deixar o carro em estacionamentos próximos ao Teatro Nacional.
CPI do tráfico
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas no Brasil aprovou o relatório final, no fim de maio, e produziu o projeto de lei 6934/13, alterando diversos aspectos da legislação brasileira. Entre as propostas estão a criação de um tipo penal básico para o tráfico de pessoas.
As tipificações atuais na legislação nacional são voltadas para o crime de tráfico internacional de pessoas com fins de prostituição e o tráfico de crianças e adolescentes. Por outro lado, o tráfico para trabalhos forçados ou semelhantes à escravidão, assim como transplante de órgãos não têm tipo penal correto. As penas para os crimes mencionados também passam a ser mais rígidas.
As regras para adoção também ficam mais rígidas. O projeto de lei procura assegurar o respeito estrito à ordem estabelecida no Cadastro Nacional de Adotantes.
Tráfico em Portugal
Em relatório divulgado em maio pelo Observatório do Tráfico de Seres Humanos (OTSH), do Ministério da Administração Interna de Portugal, o número de pessoas sinalizadas como prováveis vítimas de tráfico humano mais do que triplicou no país: passou de 81, em 2012, para 299, em 2013. O aumento chega a 269%. Assim como o Brasil, Portugal também é rota, destino e origem do tráfico de pessoas.
Entre as 299 pessoas, 49 são menores, 27 dos quais em investigação. A maioria é composta por estrangeiros, tendo os romenos mais representatividade com 185 sinalizações. Também há cidadãos da Guiné-Bissau, Nigéria, Bulgária e Brasil. Os portugueses são 31, dos quais 17 menores de idade.
O acréscimo destas sinalizações pode ser explicado pelo aumento das denúncias relacionadas com exploração laboral, sobretudo as ligadas à agricultura.
Fonte: Zenit