Nossa família morava em São Benedito, no então município de Montenegro. Era constituída pelos pais, três avós (o avô paterno morreu cedo) e dez filhos. Os avós, um após o outro, foram acometidos de longa enfermidade. A mãe e a irmã mais nova cuidavam deles. Vendo a mãe extenuada, sugeri que contratássemos uma outra pessoa para cuidar dos avós. A mãe reagiu: “Dos nossos pais, cuido eu”. Compreendi que era uma questão de amor filial.
O amor tem uma dimensão de cruz, de doação, de colocar a vida a serviço de causas que valem uma vida. A Semana Santa, que se inicia com o Domingo de Ramos e culmina na Páscoa da Ressurreição, em resumo é isto: Jesus Cristo doa sua vida por amor à humanidade.
O povo, palmas na mão, aclama o Senhor na entrada de Jerusalém. Cinco dias depois, acompanha seus líderes religiosos e pede sua condenação. A raça humana é inconstante e frágil. Para salvá-la só mesmo o amor divino!
O amor de Cristo nos deixou o memorial da Eucaristia: Ele mesmo como alimento e sustento de seu povo a caminho. Comunhão com Cristo e ceia fraterna entre irmãos. É cerne da solidariedade cristã. Na quinta-feira santa a Igreja celebra este mistério de amor.
Na sexta-feira santa celebramos a tortura da flagelação, da humilhação, do caminho ao Calvário com a cruz às costas, da crucificação entre dois malfeitores e a morte na cruz. A liturgia da paixão e morte começa em silêncio: os celebrantes se prostram no chão sem palavras. O silêncio é profundo. É reverência, é gratidão. O povo, à noite, costuma fazer uma procissão em memória do Senhor morto por amor à humanidade. Mesmo a sociedade secularizada respeita o silêncio da sexta-feira santa.
Sábado santo, após silêncio reverencial irrompe em alegria: Cristo ressuscitou. O tempo antigo se rasga pelo meio. Surge vida nova, a nova humanidade, ornada da graça de Cristo, conquista redentora pela cruz e ressurreição.
O bispo Nguyèn Van Thuán, prisioneiro dos vietcongues, no Vietnam, enviou através de uma criança um bilhete à comunidade católica: “Durante a agonia no Getsêmani, o Senhor levou consigo os três apóstolos por quem nutria um afeto especial: Pedro, Tiago e João. Tendes medo de ser um dos seus amigos mais queridos”?
Quem sabe, durante a Semana Santa, nós mostramos a Jesus que pertencemos ao grupo que o ama também de modo especial!
Dom Sinésio Bohn
Bispo de Santa Cruz do Sul
Fonte: CNBB