Formação

Ensinai-nos a rezar

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Por que rezar? É fácil ou difícil rezar? Depende da idéia que fazemos de Deus. Depende da imagem que temos de nós mesmos.

Rezar é um diálogo que se estabelece entre duas pessoas que se amam, um diálogo que parte da confiança, da escuta, da abertura, da disponibilidade. É um diálogo que se faz sempre mais empenhativo e totalizante. Sob certos aspectos, não é fácil rezar e disso todos temos experiência. É difícil entrar no clima de oração que exigem desprendimento momentâneo de ocupações absorventes para ter espaço de encontro com Deus.

No evangelho de hoje, Lucas 11, 1-13 nos conta como nasceu a oração do Pai nosso. Vendo um dia Jesus rezar, os discípulos experimentaram grande desejo de rezar como Jesus e disseram: “Senhor, ensinai-nos a rezar”. É necessário deixar-se animar pelo mesmo desejo de aprender do Senhor o que é a oração e como rezar. Também desta vez a resposta de Jesus supera nossas expectativas. Ao invés de dar-nos definição da oração ou método seguro para rezar, ele nos introduz imediatamente no mistério da oração, nos coloca em comunicação direta com o Pai: “Quando rezardes, dizei, Pai…”.

Nestas simples palavras entrevemos toda a novidade da oração cristã. Trata-se precisamente de fazer o que fez Jesus, estar um pouco de tempo com ele, permanecer em colóquio com ele que sabe tudo de nós. Descobrimos assim algumas características mais belas da oração: comunhão no amor, dom gratuito do Espírito.

A oração deve ser expressão de disponibilidade que não será confundida com certo modo praticado por não poucos cristãos: oração prevalentemente ou exclusivamente de pedidos.

Este aspecto da oração é legítimo. Jesus mesmo colocou no Pai nosso os pedidos do pão, do perdão, da proteção, mas não deve ser o aspecto prevalente do encontro com Deus com perigo de deformá-la reduzindo a preocupação prevalentemente egoísta e individualista.

Jesus satisfez seu desejo, dando-lhes a sua própria oração. O Pai nosso deve ser lido assim: como a onda de oração de Jesus propagada pelos séculos, com um fluxo de oração que da cabeça se transmite a todo o corpo.

O Pai nosso é verdadeiramente a continuação da oração de Jesus. Todas as orações de Jesus, narradas nos evangelhos, se iniciam pelo clamor ao Pai. “Agradeço-vos, ó Pai… Sim, Pai, porque assim foi do vosso agrado… Pai santo, se é possível, afaste-se de mim este cálice… Pai, em vossas mãos entrego o meu espírito”.

É exatamente no grito “Abba, Pai” que Jesus se deu a conhecer como o Filho único de Deus. Mas ninguém tinha ousado, antes dele, dirigir-se a Deus com nome assim confidencial, familiar, nosso papai. Toda oração do Pai nosso está contida nesse grito inicial. Encerra a essência mesma da oração do cristão, grito confiante de filho, dirigido a um Deus sentido como pai amoroso e bom. Mas rezamos: “Que estais no céu”, acima de nós, não apenas como doçura, mas um pai bom, forte, livre, capaz de defender dos perigos.

“Seja santificado o vosso nome” não por nós, como se faltasse alguma coisa à sua santidade, mas santificado em nós, isto é sua santidade seja proclamada por nós com palavras e testemunhada na vida. O contrário desta afirmação é a blasfêmia, com que o nome Deus ao invés de santificado, é profanado.

“Venha a nós o vosso reino”. O reino de Deus está no coração da mensagem e da vida de Jesus; representa a finalidade da sua vinda no mundo. Jesus o compara a um tesouro escondido, a uma pérola preciosa. Pedimos que a mensagem evangélica chegue a todos os homens acerca do sentido de cada homem e até os confins da terra, e penetre em intensidade em todos os aspectos da vida humana; que edifique toda nossa existência.

A vontade de Deus é que todos os homens sejam salvos. É vontade de amor, mesmo quando não a compreendemos. “Seja feita a vossa vontade” equivale a dizer que o seu projeto de amor sobre nós se realize logo. Por isso, não a nossa vontade, mas a dele.

Essa atitude de abandono não pode ser limitada aos momentos específicos de oração, mas investe toda a vida. Assim todo momento de nossa existência torna-se oração, se somos atentos ao desígnio divino que se cumpre em nós e no universo. Viver olhando em profundidade as coisas, os acontecimentos, as palavras, em tudo a presença e ação do Pai. Assim viveu Jesus.

Cardeal Dom Geraldo M. Agnelo
Arcebispo de São Salvador da Bahia


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