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O Escândalo da Pregação de Jesus

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O escândalo pré-pascal consistiu na oferta de Salvação feita aos pobres e aos pecadores, para os quais Jesus olha com infinita misericórdia antes mesmo que eles tenham consciência do seu pecado. Aconteceu com Zaqueu, aconteceu com a Samaritana, aconteceu com a pecadora que ia ser apedrejada, aconteceu com Levi…O Deus que Jesus prega é Pai dos pequeninos e perdidos, que quer tratar com os pecadores e se rejubila quando um deles acha o caminho de casa (Lc 15,7-10). Porque Deus é assim, bom e sem limites, porque Deus ama os pecadores, é que Jesus escancarou as portas do Reino da Salvação, chamou a todos sem exceção, “como uma galinha chama todos os pintinhos para o abrigo de suas asas” (Mt 23,37), para serem como ramos inseridos no tronco que é Ele mesmo. E a todos, Jesus pronuncia o perdão não só com palavras, mas com atos. Um grande exemplo disto é a sua comunhão de mesa com os pecadores(Mc 2,15/Lc 15,2).

No Oriente, receber alguém à mesa significa até hoje uma oferta de paz, confiança, fraternidade e perdão. Assim sendo, as refeições de Jesus com os pecadores são expressão da sua missão e mensagem, uma expressão clara do amor Redentor de Deus. Além disto, trazem uma mensagem escatológica, pois prefiguram o banquete salvífico do fim dos tempos, ao qual todos somos convidados, e livres para escolher (Mt 8,11). Jesus investiu no pecador, de quem todos já tinham desistido, expressando o caráter ilimitado da sua misericórdia. As portas do Reino estão abertas para todos, e os que livremente decidirem entrar nele receberão riquezas diante das quais todos os seus valores anteriores empalidecerão. este é o dom por excelência, do tempo da Salvação que está a irromper-se.

O anúncio da Boa-Nova foi recebido com uma tempestade de indignação primeiramente pêlos círculos farisaicos, porque era por eles considerado dever religioso mais importante manter a separação com referência aos pecadores. Para estes, Deus ajuda os justos, mas para os pecadores, só vale o julgamento e o mérito. Aos olhos de Jesus, os fariseus são homens que realmente tentam fazer a vontade de Deus. Jesus via a sua disponibilidade, seu jejum, seu sacrifício, suas obras, seu zelo missionário. Todavia, os vê em perigo e distanciamento de Deus, porque enxergam minuciosamente os atos de pecado, concedendo-lhe graus de importância de tal modo, que não vêem a essência do pecado, que a revolta contra Deus, e que esta pode se instalar até mesmo antes de qualquer ato, pela recusa do próprio coração a Deus. Lá onde o pecado não é levado a sério, o homem que confia nas suas obras pensa bem demais sobre si mesmo, auto justificando-se, e assim corrompendo sua vida inteira. O homem que pensa bem demais de si mesmo não perscruta o coração de Deus, porque está seguro no seu julgamento positivo sobre si mesmo. Por isso, toda a sua piedade tem em mira unicamente que os homens o tenham por piedoso. E igualmente, o homem que pensa bem demais de si mesmo não leva a sério o irmão. Tem-se por melhor e o despreza (Lc 15,25-32/Lc 7,39).

A casuística rabínica apresenta uma série de pecados “imperdoáveis”, o que impede de se ver a raiz de cada um deles. É a bagatelização do pecado, que impede de ver que não só o assassinato, mas já a palavra ofensiva de ira é gravíssima. Por isso, é que seu excesso de “leis” impedem de enxergar a raiz do pecado e converter-se. Jesus se expressa diversamente em Mc 3,28s: Deus pode perdoar aos homens todos os pecados, até mesmo toda sorte de blasfêmia que disserem. Mas a blasfêmia contra o Espírito Santo não se perdoa. O que significa isto? O pecado dos indiferentes e empedernidos, que vivem obcecados de auto justificação, o que os torna surdos ao evangelho. Os pecadores públicos já não tinham como auto justificar-se, por isto abriam-se facilmente à misericórdia divina: o publicano, a pecadora, a Samaritana, etc. Os fariseus piedosos, pensando bem demais de si mesmos, estão mais longe de Deus que os pecadores notórios.

Jesus censura os fariseus porque estes, enquanto pagam escrupulosamente o dízimo, mandam às favas a justiça, a misericórdia e a fidelidade interior (Mt 23,23s). Cumprem exteriormente os preceitos, mas seu interior é impuro. Dão dinheiro aos pobres, observam cuidadosamente as horas de oração, jejuam duas vezes por semana (Mt 6,1-18), mas toda a sua piedade está a serviço do desejo de recompensa e da soberba, e daí a hipocrisia. Assim, se assemelham a sepulcros pintados de branco na primavera, mas por dentro são só ossadas (Mt 23,27s). Aos olhos de Jesus, eles estão expostos ao perigo de não entrar no Reino de Deus.

Na sua censura aos contemporâneos, às gerações que se recusam a crer, Jesus inclui também os sacerdotes (Mc 11,15-17). Estes fizeram do templo um covil donde partem para empreendimentos de roubo. Abusam da sua posição usando a casa de Deus para negócios e lucro. Assim, pretendem colocar Deus a serviço do pecado pelo fanatismo, pela tentativa de realizar trocas com Deus. E inclui também os escribas, a quem Jesus endereça uma censura totalmente diversa: Querem ser respeitados, procuram lugares de honra, saudações e títulos, e assim transformam a glória de Deus na sua própria. Com sermões sérios, exortam o povo enquanto alimentam intenção de levar a cabo crimes piores. Pregam a vontade de Deus e todavia não a realizam. Lançam, pesados fardos nos ombros dos homens e no entanto não os querem tocar nem com a ponta dos dedos(Veja Mt 23,1-13.16-22.29-36).

Jesus contempla como os homens correm para a perdição enquanto acusam os outros, os acontecimentos. e por vezes até o próprio Deus. Você por acaso não enxerga que está na posição de acusado, você que acusa Deus e aos outros? E que sua causa é desesperada porque o intervalo da graça está passando? É o último minuto para entrar em acordo com o juiz (Mt 5,25) Vista o traje nupcial, antes que seja tarde demais (Mt 22,11-13). Jesus vem inaugurar o Tempo da Graça, mas este tempo tem um limite. Pode ser o limite desta vida, pode ser o limite da sua volta. Por isto, abrir-se à misericórdia que transforma é a necessidade da hora. A conversão é necessária não só para os “pecadores públicos”, mas até mais para os que, segundo o julgamento do mundo “não precisam de penitência” (Lc 15,7). Os que se julgam honestos, piedosos, que não cometeram nenhum pecado público. Para eles, sim a conversão é mais urgente, porque ainda nem sequer conhecem a verdade sobre si mesmos. A verdade de que ninguém é justo diante de Deus. Este é o primeiro passo para a sua conversão.

Os que esperavam o fim, a separação iminente dos justos e pecadores, chegam a perguntar a Jesus porque ele não afasta os pecadores do grupo que o segue. Mas a esta pergunta Jesus respondeu com a parábola do Trigo e do Joio (Mt 13,24-30), porque ainda não chegou a hora, ainda é o intervalo da Graça. Quando vier a hora, o próprio Deus, que conhece o coração de cada homem, fará a separação. Nenhum de nós pode fazê-la. Mas Jesus, ao chamar os que o acompanhavam, insistiu na Urgência do seu apelo (Lc 10,7/Mt 8,22). Sua missão significa o prelúdio para a chegada do tempo escatológico da tribulação. O mundo, dominado pelo pecado, caminha para a morte. A urgência do apelo à conversão mostra que ainda se dispõe de um último tempo de Graça, que não é longo (Veja Mt 24,37-39/Mt 25,1-12/Lc 14,15-24). Por isto, cumpre entrar urgentemente no Reino, e experimentar desde já as suas primícias.

Por Ana Carla Bessa
Consagrada da Comunidade Shalom
Escola de Formação Shalom
escoladeformacao@comshalom.org


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