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A esperança, a última que… não morre!

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Normalmente, a cada passagem de ano, somos levados a depositar nas festas que o acompanham – Natal, Ano Novo e Epifania – todas as nossas expectativas, como se elas trouxessem, por si sós, esperança, renovação e vida nova.
Mas, para que não se transforme em desilusão, a esperança precisa de bases sólidas, que ultrapassam de longe os desmandos éticos e morais a que não poucos se entregam nesse período, para não perderem um instante sequer do novo ano que se inicia. Na prática, essas pessoas são levadas pelos mesmos critérios que norteava seus antepassados, os pagãos do tempo de São Paulo, que repetiam uns para os outros: «Comamos e bebamos, pois amanhã morreremos!» (1Cor 15, 32).
Mas, quem transformou a experiência em sabedoria, sabe que as coisas não são bem assim. Pelo contrário, ao longo do ano vai-se colhendo o que se plantou no início de janeiro, como explicava o mesmo Apóstolo: «Não vos iludais: de Deus não se zomba. O que o homem semeia, isso mesmo colherá. Quem semeia no instinto, do instinto colherá a corrupção; quem semeia no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna» (Gl 6, 7-8).
A verdadeira e única esperança que nunca decepciona não se constrói no pecado. Aliás, nem mesmo nos bens materiais e culturais, que só têm sentido se acompanhados pelos valores éticos e morais. Se alguém consegue ser feliz sem grande parte dos primeiros, sem os segundos, porém, terá a vida transformada num inferno.
É esta também a “verdade” de Bento XVI expressa em sua nova encíclica, publicada no dia 30 de novembro, sob o título: “Salvos pela esperança”: a sociedade não se salvará nem pelo progresso, nem pela ciência, nem pelas revoluções políticas, mas pela esperança radicada na fé e encarnada no amor.
Pela autoridade que lhe vem de “perito em humanidade”, o Papa constata o fracasso da esperança na instauração de um mundo perfeito, fundamentado em ideologias atéias e materialistas, e a ambigüidade do progresso, capaz de gerar imensas possibilidades para o bem, mas, ao mesmo tempo, para o mal.
Para o Papa, a fragilidade do homem impede que o reino do bem se consolide plenamente neste mundo. Ele só será definitivo e autêntico no Paraíso, que não é só a realização das aspirações mais profundas da humanidade, mas também a meta que norteia a quantos se empenham na construção do projeto de Deus na sociedade.
Uma das intuições mais belas da encíclica é revelar que a esperança não é apenas uma virtude, mas uma Pessoa: o Cristo, que é Ressuscitado justamente por ter assumido e superado a dor, o pecado e a morte: «No mundo, passareis por muitas tribulações. Mas, coragem, eu venci o mundo!» (Jo 16, 33).
Em seu escrito, Bento XVI não teme afirmar que, quando se exclui Deus, a esperança se torna perversa, criando um mundo de ilusões, o campo mais fértil para a revolta, a depressão e uma espécie de suicídio coletivo. Tende-se, então, a buscar a salvação no dinheiro, na cultura, no progresso, na economia ou na política. Mas, lembra o Papa, «não é a ciência que redime o homem. Ele só se salva pelo amor, um amor incondicionado».
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) apresentou ao povo brasileiro o documento pontifício com estas palavras: «Temos certeza de que estes ensinamentos do Santo Padre, que acolhemos com alegria, se constituirão em novo alento para nosso povo, para nossas comunidades e para a toda a humanidade tão necessitada da “grande esperança” que dá sentido à vida e força para vencer as dificuldades do dia a dia. Queremos ser, cada vez mais, pessoas de esperança!».
Duas semanas mais tarde, no dia 14 de dezembro, num encontro que manteve com estudantes universitários de Roma, Bento XVI retomou alguns pontos enfatizados pela encíclica:
«As duas grandes idéias-força da modernidade, a razão e a liberdade, parece que se desgarraram de Deus e buscaram sua autonomia, cooperando, assim, para a construção do “reino do homem”, em oposição ao Reino de Deus. Prevaleceu uma concepção materialista, alimentada pela esperança de que, mudando as estruturas econômicas e políticas, surja uma sociedade justa, onde reinem a paz, a liberdade e a igualdade. Contudo, o progresso tecnológico não coincide necessariamente com o crescimento moral das pessoas. Sem princípios éticos, a ciência, a tecnologia e a política podem ser utilizadas, como aconteceu e como infelizmente continua acontecendo, não para o bem, mas para o mal das pessoas e da humanidade».
A esperança é a última… que não morre, porque a história é conduzida por um Pai, cuja tarefa principal é fazer com que tudo – até mesmo o pecado e a maldade humana – concorra para o bem dos que acreditam no amor e o escolhem como ideal de vida (Cf. Rm 8, 28).

Dom Redovino Rizzardo, cs
Bispo de Dourados (MS)
Siet CNBB


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