Chegamos à última semana do Advento.Aproxima-se o momento em que nossos corações se voltam para o presépiode Belém, na contemplação do Verbo Humanado que veio nos redimir. A vozque ouvimos ao longo deste Tempo, incitando-nos a endireitar nossoscaminhos, a aplainar as vias, aponta-nos o Messias prometido, aguardadodesde as gerações mais remotas do Antigo Testamento. Cumprem-se asprofecias de Isaías.
A perspectiva de um novo mundo, de umavida melhor, a partir da vinda de Cristo, é a mesma que a Liturgiadeste domingo nos apresenta. Na meditação da primeira leituraencontramos a “promessa” que Deus fez a Davi. Essa promessa se renovacom a vinda de Nosso Senhor ao mundo, assegurando-nos a salvaçãoeterna. Javé assegura a Davi, pela voz do profeta Natan, que conduziriaseu povo à felicidade e à realização plenas. Jesus se oferece pelaredenção da humanidade decaída pelo pecado e, antes de subir aos céus,promete: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt28,20).
“Concedo-te uma vida tranqüila,livrando-te de todos os teus inimigos” (2Sam 7,11b), assim Deus falavaa Davi. Essa “vida tranqüila” Cristo a confirma pela graça constante doEspírito Santo, livrando-nos dos inimigos: o mundo, a carne e odemônio. Provém da fé essa tranqüilidade, que melhor se expressa comoconfiança. Confiança nos desígnios divinos e nos meios que nos concede,principalmente pelos Santos Sacramentos, para que avancemos na viaespiritual, buscando uma intimidade maior com Nosso Senhor.
Observe-se que, ao longo do textodeuteronômico, a vida é como que uma “preocupação” em ser assegurada aopovo eleito. Fica claro, desde a criação, que o homem teve a suaexistência em plenitude, por graça do Criador, mas a aniquilou pelaambição. E durante toda a caminhada da humanidade, ao longo dos temposdo Velho Homem e depois de resgatada a sua dignidade, renovadas vezes avida, esse dom unicamente de amor de Deus, é vilipendiadaantagonicamente pelo amor-próprio, pela soberba, pelo desregramento.
Neste dias em que a cultura da morte étão disseminada, com as propagandas pró-aborto, pela legalização daeutanásia, pelas pesquisas biológicas e científicas que atentam contraa ética e a moral, pela permissividade de atitudes que vão contra osprincípios morais, que por sua vez se apóiam na orientação religiosa,por todos esses motivos, e tantas outras formas de se atentar contra adignidade da pessoa humana, o Profeta nos propõe, na Liturgia daPalavra, a rever nossos valores e restaurá-los em Cristo. É Deus quempreside a História e renova constantemente Sua aliança conosco, pormeio da Eucaristia, concedendo-nos paz e inspirando-nos à justiça,indicando a via para a vida em plenitude, verdadeiramente livres esalvos do pecado.
São Paulo, na epístola aos romanos,retoma a mensagem da primeira leitura, que é o plano de salvação queDeus tem para o seu povo. Essa preocupação divina, como nos apresenta oApóstolo, faz parte de Sua natureza, enquanto criador, enquanto pai.Somos filhos amados por Ele, conduzidos como crianças nos titubeantespassos iniciais, amparados sempre para não nos entregarmos à fraquezade nossa existência. Somos os únicos beneficiados pelo projeto desalvação que nos assegura a vida em plenitude, a vida eterna.
O projeto de salvação se realiza emJesus Cristo, reintegrando todos os povos no Reino de Deus. Por isso, oEvangelho segue a mesma perspectiva e apresenta um momento determinantede Seu plano. O “sim” de Maria, o seu convicto “ecce ancilla”, pronta aacolher a vontade divina, é o exemplo de confiança e abandono à vontadede Deus, para nós cristãos. São Lucas nos mostra, ainda, neste domingo,na figura de Maria Santíssima, que é por meio de homens e mulheres quecorrespondem à Sua vocação que Deus vai se manifestando neste mundo,que Ele vai cativando discípulos e missionários da Boa Nova que Cristonos anuncia. Através de nossa generosidade em corresponder à propostaque nos é feita pela Palavra, e por meio de um sincero gesto de amor ede partilha, estaremos cooperando com o projeto de salvação,tornando-nos imitadores de Cristo, enquanto palmilhamos felizes ocaminho que nos levará à realização plena da vontade do Pai.
Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora(MG)