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ElenaArreguy Sala
Missionáriada Comunidade Católica Shalom em Israel/Haifa
Os textosdo evangelho de S.João são sempre emblemáticos para quem os lê e com eles reza.Eles se entranham em nós e são fecundos de vida. A Palavra ilumina e fazexpandir aquilo que somos diante de Deus e do que Ele é para nós.
Assim que fazemos a opção por Jesus, depois de umaexperiência forte com o Espírito Santo, quando passamos a assumir nossaidentidade de filhos de Deus e ultrapassamos a barreira do ritualismo e da meratradição cultural católica, descobrimos a Palavra de Deus e começamos adevorá-la. A palavra é exatamente essa: devorar. É a fome e a sede maisprofunda da alma que se manifesta e que passa a ser saciada com aquilo queverdadeiramente a sacia. E o evangelho de S.João oferece verdadeiros banquetespara a alma. Quase sem perceber decoramos partes dos textos, e passamos a nosreferir aos capítulos e seus respectivos temas e personagens com a maiorliberdade. Falamos do cego de nascença (Jo 9), do Bom Pastor (Jo 10), deNicodemos (Jo 3), da oração de Jesus por nós (Jo 17), da pecadora pública deJerusalém, pega em adultério e perdoada (Jo 8), do discurso sobre a Eucaristiae o Pão da Vida (Jo 6)… E assim, sucessivamente, personagens e relatos nosrevelam Jesus Cristo, nosso Deus e Senhor, aquele que morreu e ressuscitou, ecomo Ele se comunica e relaciona com aqueles que são seus. O discípulo que seauto-alcunha de discípulo amado, revela como ninguém o amor de Jesus, o Amor doPai, as entranhas do coração de Deus. Se alguém quiser saber como se parece,como sente, quais os desejos mais autênticos, que espírito move o coração doDeus dos cristãos, que o descubra e se abasteça do que nos revela João, ocaçula dos apóstolos.
Um dos encontros mais belos do quarto evangelho é o de Jesuscom a Samaritana. Muito conhecido, muito explorado, já exaustivamente comentadoo diálogo travado entre esta mulher pagã, não judia, com Jesus. Ela que setorna grande e corajosa evangelizadora, após ter ela mesma bebido da água vivaoferecida por Jesus, e não somente da água do poço de Jacó. Entretanto, o quehá de novo neste encontro que seja luz para nós? O que há de novo na Palavra deDeus que nos faça crescer na vivência concreta e diária do Evangelho?
Creio que valha a pena nos determos no que acontece entre oencontro de Jesus com essa mulher e a partida dela, em missão, em abertaevangelização na região onde vivia. O que acontece entre o primeiro passo e oresultado dele é o encontro de amor com o Esposo. É Jesus quem toma ainiciativa de puxar conversa. Ele está à espera. Isso nos dá a certeza de que,como evangelizadores, semeadores da Palavra e construtores do Reino, (aquiloque somos chamados a ser quando assumimos a vocação Shalom), nosso papel élevar a pessoa, qualquer pessoa, todas elas, ao encontro de Jesus, onde Ele aespera, o espera. Jesus espera aqueles que são seus e lhes foram dados pelo Paie com eles trava um diálogo de verdade de, na verdade, começando umrelacionamento pessoal que vai ao encontro de tudo o que a pessoa precisa para setornar adoradora e livre em ‘espírito e em verdade’.
Seguindo os passos da Samaritana e vendo esta conversaacontecer, notamos que o Senhor a alcança onde está a sua maiorvulnerabilidade: na sua vida sexual, nos seus afetos e emoções, nos seusrelacionamentos amorosos com o sexo oposto. Sem que Ele alcance esta dimensãoda sua existência ela não poderia se tornar aquilo que ela vem a ser: umtestemunho livre e eficaz. Não sei se entre nós há muitas pessoas que tenhamtido cinco maridos ou cinco mulheres, cinco ‘companheiros ou companheiras’, comquem tenham vivido maritalmente. Mas creio que entre nós há inúmeros coraçõesque amaram e se apaixonaram e se envolveram emocionalmente e até fisicamentecom cinco ou até mais do que cinco pessoas. E é aí que Jesus quer tocar, querpensar as feridas (sendo Ele mesmo o Bom Samaritano!), quer soprarressurreição. Jesus não se escandaliza absolutamente com nada que diz respeitoa nós, pois ele sabe o que há no coração humano, mas Ele seguramente quer nosdar um sopro de vida que nos sacie a sede de amor, libertando-nos de tantosjogos e comportamentos que só nos tem levado à dor, à solidão e ao pecado. Elequer se apresentar a nós como o Esposo, ensinando-nos a não mais buscar naspessoas aquilo que somente Deus pode dar. Ele é o Esposo que nossas vidasanseiam sofregamente encontrar.
Quando a Samaritana replica e pede: ‘Dá-me de beber!’, elapede a Jesus o dom do Espírito para conseguir libertar-se de suas desordensafetivas. E aí aparece o Esposo que se apresenta e pede água e dá água viva!Seguramente naquele tempo, mesmo havendo fofoca e falatório, não poderia havertanta exposição das desordens sexuais-comportamentais à luz do dia como vemoshoje na TV, no cinema, na internet e no ambiente social que nos cerca e no qualvivemos. Mas seja às claras, seja escondido, pois as realidades existenciais doser humano são atemporais, o Senhor nos espera para que a Ele entreguemos todasas desordens sexuais e relacionais presentes em nossa história.
Não adianta abafar, não adianta esconder, nem tampouco negaras marcas deixadas em nós, no corpo, na mente, nos afetos e na alma, pelasconcupiscências de nossa própria carne e da carne dos outros em nós! Quantas pessoas sofreram agressão sexual,abuso sexual! Quantas pessoas sentem em si mesmas a desordem e a compulsãomanifestada no homossexualismo, na masturbação, nos jogos de sedução emanipulação do próprio corpo e do corpo alheio, entre homens e mulheres, entremulheres e homens! Quanto mau uso do corpo humano em busca de amor e desegurança!
Mesmo que já estejamos ativamente empenhados naevangelização, o Senhor nos convida a não esconder nada dele, a não deixarqualquer sombra maculando nossa alma. O Senhor quer fazer brilhar a limpidez daágua viva onde se encontram as vergonhas e a mesquinhez, nosso calcanhar deAquiles, nosso pecado e tudo o que ficou distorcido como consequência dele noentendimento que temos sobre nós mesmos. Jesus quer nos ensinar a viver plena elivremente o dom da nossa sexualidade e identidade, o dom de nosso corpo. Jesusnão nos quer vivendo de aparências, com vida dupla ou de discursos. Jesus pedeque chamemos ‘os nossos cinco maridos’ – e cada um sabe o nome que cada umassumiu em sua história de vida! – e osapresentemos a Ele. Só assim Ele pode se tornar verdadeiramente nosso Esposo.
E nesse caminho, é a graça da castidade, dom do Espírito,que fará de Jesus verdadeiramente o Esposo. É o dom da castidade que tornaJesus o grande amor de nossas vidas, e coloca aos poucos a ordem do amororiginal em nós. Seja qual for nosso estado de vida Jesus não nos quer impurosou puritanos, reprimidos ou depravados. O mais belo de todos os homens, querfazer este novo em nós: quer arrancar-nos das mentiras e das manipulações dacultura secular que nos empurra para o pecado e para a mentira, e quer fazer detodos nós belos e belas como Ele, almas esposas. Só assim nosso testemunho seráfecundo como foi o da Samaritana. Só assim daremos prova de verdadeiraconversão. E que o Esposo nos ajude a jamais desanimar…