Dom Walmor Oliveira de Azevedo
A espionagem de todo tipo é marca antiga nas práticas dosque consideram este um caminho eficiente na busca da verdade e no tratamentoadequado da realidade. Morbidez, comércio, dinheiro, disputa de poder,vingança, interesses, perversidades, vantagens, planos para prejudicar e odesejo incontrolável de dominação, uma lista incalculável de outros itens,compõem este quadro que leva à prática da espionagem. Já se atingiu umaverdadeira sofisticação neste âmbito, enquanto ao mesmo tempo se mantém aescuridão própria do que não é praticado às claras. A sofisticação dos avançostecnológicos inclui uma lista surpreendente de artefatos que dão suporte a estaprática. Uma caneta presa ao bolso ou um relógio de pulso bastam para gravarconversas. São equipamentos que transmitem freqüência de imagem e som. E otelefone que capta o áudio e o remete para qualquer parte do mundo? Tem tambémmaleta para interceptar ligações de celular.
É um mercado muito bem alimentado. E as câmeras escondidasem bonés, maços de cigarro, bolsas, botões de camisa, fichários e agendas? Domesmo modo que se compra um jantar se encomenda um grampo telefônico. Câmerasocultas, dissimuladas, variados tipos de artefatos para escuta, disfarçados emdespertador, calculadora, mouse; dispositivos microauricular e outros. Há umbom midiático a respeito do assunto, mostrando as possibilidades para osusuários dos serviços e deixando em alerta e paranóicos os outros todos. É umaverdadeira guerra que se instala, com a perversidade do comércio e asofisticação das configurações tecnológicas. De um lado os recursos parabisbilhotar a vida alheia; de outro lado também o desenvolvimento de recursospara garantir proteção e privacidade anulando a espionagem. Este cenáriohospeda, ao mesmo tempo, o lado doentio dos que se alimentam da curiosidade; osque buscam informações e recursos para alcançar interesses próprios e degrupos; os mecanismos para encontrar em falas a saída para prejudicar osoutros; o caminho curto que dispensa o diálogo e a verdade no relacionamento;também a questão do direito à privacidade que a Constituição Federal, artigo5º., garante a cada cidadão.
Esta febre da espionagem, recurso espúrio e doentio na lutamórbida pelo poder, tem um contra ponto muito interessante num ensinamentoclássico e central de Jesus, quando ele chamou os seus discípulos e os enviouem missão. É um contra ponto simples e de extrema sabedoria. Uma sabedoria quedá ao discípulo um incalculável poder de domínio e liberdade sobre talsituação. Enviando os seus discípulos em missão, Jesus fez-lhes importantesrecomendações: “Vede, eu vos envio como ovelhas para o meio de lobos. Sede,portanto, prudentes como as serpentes e simples como as pombas. Cuidado com aspessoas, pois vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas sinagogas.Quando vos entregarem, não vos preocupeis em como e o que falar, pois nãosereis vós que falareis, mas o Espírito do vosso Pai falará em vós. O irmãoentregará à morte o próprio irmão; o pai entregará o filho; os filhos selevantarão contra os pais e os matarão. Não tenhais medo deles. Não há nada deoculto que não venha a ser revelado, e nada de escondido que não venha a ser conhecido.O que vos digo na escuridão, dizei-o à luz do dia; o que escutais ao pé doouvido, proclamai-o sobre os telhados”, narra o evangelista Mateus 10,16-27.
A maestria de Jesus adverte e treina os seus discípulos parauma dimensão ética alargada e enraizada, como caminho único na construção dorelacionamento fundado sobre os pilares da verdade, da liberdade e da justiça.Outra dinâmica ou outra direção estão na contramão dos valores e dos princípiosque devem reger a conduta cidadã e a condição de autêntico discípulo. Há quemindique não falar ao telefone para escapar o risco de ser grampeado. O controlesobre os que espionam é praticamente impossível. Viver a paranóia dadesconfiança geral, certamente, não é o caminho. Contra atacar, parece óbvio,não é o caminho certo na defesa da própria privacidade. O contexto é confuso.Além dos mecanismos sofisticados e dos interesses variados, nesse processo têminteresses muitos que jamais estariam relacionados numa lista de espiões e dosque usam destes mecanismos para alcançar suas metas.
A indicação de Jesus, edificada na transparência de atos eintenções, faz lembrar o tempo das histórias: era uma vez. O tempo dashistórias de verdade. Era uma vez, um homem honesto e simples; pai de família etrabalhador. Sua vida era o trabalho empenhado. Suas escolhas eram simples.Seus interesses eram cidadãos. Seu comportamento era exemplar. Dele semprediziam: é o homem mais honesto da cidade. Não mentia, não fofocava, era fiel ejusto. Conduta moral exemplar. Admirado e respeitado. Este homem jamais tevemedo de espionagem.