Ficção no comshalom.org
Acompanhe no comshalom.org o dia-a-dia da família formada por Poliana, uma baiana casada com um árabe cristão, seu esposo Amir e seu filhinho Rafael. Através desses personagens, você vai conhecer o Oriente Médio, seus costumes e sua tradição.
Poliana passou o cinto de segurança em Rafael e fechou a porta do carro. Já eram 14h e os comércios começavam a fechar por conta do shabbat ( שבת), ou seja, por causa do sábado. Em Israel, o final de semana começa às sextas-feiras e vai até o dia seguinte, permanecendo em funcionamento apenas os serviços essenciais. Em Jerusalém e em outras cidades judias, até mesmo os ônibus param completamente, a malha ferroviária que liga o país de norte a sul também é destivada, em Haifa, os ônibus diminuem quase a zero, porém ainda remanece alguma frota circulando. Domingo é dia normal, o primeiro dia da semana! Muitos trabalham (não todos, pois os árabes cristãos, a depender de onde trabalhem, tem esse dia livre), nas escolas judias têm aula, mas não nas escolas cristãs. Como você pode ver, santo leitor, é um mundo dividido!
Poliana, então, dirigiu-se à sua casa na rua Abbas, número 70, no Monte Carmelo, entre o convento masculino dos Carmelitas Descalços e o Bahai (em outra ocasião explicamos sobre ele, ok?). Tirou as coisas do carro, deu banho em Rafael, esquentou o almoço dele que já tinha deixado pronto anteriormente, arrumou as coisas em casa, ela própria tomou banho, no entanto, não almoçou (não estranhe o leitor, que tenha Rafael almoçado por volta das 15h da tarde, esse é o horário normal de almoço entre as famílias israelenses). Embora na dúvida de fazer ou não o jejum melquita durante a quaresma, Poliana já havia aderido ao jejum às sextas-feiras, orientado na Igreja de Rito Romano. Já estava habituada a isto com algum tempo no grupo de oração.
Às 17h45min, pegou Rafael e desceu para a missa na Paróquia Carmelita de São José, na rua Hameginim. Na mesma rua está situada a casa comunitária da Comunidade Shalom. Rafael, embora esteja nos seus cinco anos de idade, não tem tanta dificuldade de se concentrar como os meninos de sua geração, mas sempre que encontra seus amigos na igreja fica doído para sair e jogar futebol no pátio. Poliana, no início, resistiu, mas agora já está acostumada, depois de haver conhecido a mãe de uma das crianças, a qual tomava conta delas.
Toda concentrada na missa, sentiu-se cansada dos afazeres do dia. Realmente havia sido um longo dia e queria mesmo uma cama bem quentinha, pois naquela semana fazia bastante frio, no inverno mais rigoroso que enfrentara até então. No entanto, por mais cansada que estivesse, não podia deixar de ir à missa. Era ali o lugar em que descansava, ali o lugar em que encontrava refúgio e revigorava as forças. Não sabia bem explicar. Às vezes, se distraía, como naquele dia, em que passou rapidamente da concentração para distração, pensando em tantas coisas. Às vezes, não sentia nada diferente: nenhum grande arroubo, ou apaixonamento. Sentia apenas paz e uma renovação de vida cuja explicação só poderia ser a presença real de Cristo na Eucaristia. Era o seu momento de encontrar-se com Jesus e isso parecia bastar-lhe.
A oração é esse encontro em que a fidelidade diária treina a inconstância da alma, gera frutos de estabilidade e a alma fica em paz.
Quantos sacrifícios fazemos para estar com Deus, não é verdade? Mas vale a pena! Só n’Ele encontramos o repouso, como nos diz Santo Agostinho. Então, podemos cansar-nos por Ele, visto que Ele “deseja obras”, mas nos cansemos nas obras d’Ele e não nas nossas e n’Ele encontraremos descanso.
Pois é caro leitor, por aqui encerramos hoje. Que Deus nos dê uma profunda fidelidade na nossa oração; a fidelidade prova e faz crescer o amor e “orar não é pensar muito, mas muito amar”. (Santa Tereza de Ávila). E você anda distraído na oração? Então transformemos a distração em oração.
P.S.: Poliana nesses dias, para fazer gozação comigo, perguntou-me se eu sabia mesmo o que era ser melquita, pois fazia três textos que falava do assunto e não explicava! Disse a ela que Deus criou o mundo em sete dias e que Jesus deixou o vinho melhor para o final e que eu não era mais “sabido” do que eles e por isso iria trilhar o mesmo caminho. Sorrindo largamente e sem argumentos, virou-se de costas para mim e voltou a prestar atenção na palestra do cunhado.
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Um grande abraço e até a próxima
Thiago Freire