Piada de nerd: Só ctrl+s salva! Apesar de tola, a piada nos lança uma análise de como as novas tecnologias já entraram tão fortemente em nossa cultura, em nossa linguagem e até em nossa espiritualidade.
Sem querer, no dia a dia, é normal utilizarmos processos de computação para nossas ações. Por exemplo, quando alguém nos faz uma pergunta difícil e quer a resposta imediata, sem perceber dizemos “calma, estou processando”. Quem nunca se pegou dizendo para uma amiga ressentida com algo, “deleta isso da tua vida”? Conheço uma pessoa que quando está muito cansada me diz “estou quase off-line”. Interessante que mesmo que não falemos, entendemos bem o que quer dizer. E para os mais plugados, quando alguém chega na conversa de fora do contexto dizem: “Dá um F5, te atualiza”.
Na espiritualidade, porém, a piada do crtl+s é inadequada. Quando falamos de salvar, precisamos separar SALVAÇÃO de SALVAMENTO. São bem diferentes!
Salvamento ou salvação?
Na linguagem de informática, ctrl+s é arquivar na memória permanente tudo o que foi registrado. Agora mesmo me lembrei e acabei de dar um crtl+s para salvar esse texto no meu computador antes que dê um TILT (lol). Textos, imagens e sons precisam ser salvos, ou então se perdem. Falamos do salvamento de arquivos, que garante que não se percam mesmo que a máquina seja desligada, ou o sistema trave. Só um delete pode apagar do HD essas informações.
E a salvação? Na salvação, o efeito é contrário. Na Cruz, Jesus nos salva, mas de maneira diferente. Ele não o faz dando um ctrl+s e gravando no seu “HD” os nossos pecados, ao contrário, redime, apaga tudo! Cristo, na Cruz, realiza a obra redentora, assume todo o pecado humano e o perdoa, esquece-o, deleta-o.
Às vezes, achamos que Deus tem um grande word aberto sempre, no qual digita todos os nossos pecados e os ctrl+s todos os dias. Ao contrário, Deus é misericórdia e todos os dias nos perdoa, ou seja, deleta todos os nossos pecados. Não importa quantas páginas de pecado, nem a quantidade de vezes que pecamos. Ele deleta 70×7. Como aconteceu à pecadora arrependida[1], que tinha arquivado tantos pecados, listas e listas extensas, a misericórdia de Deus nos salva, deletando tudo.
Perder um arquivo na linguagem da computação é não salvá-lo. Na linguagem espiritual, quando Deus salva, Ele esquece. Para os mais entendidos, na confissão, se dá um “shift+del” em tudo. Ficamos novinhos em folha, ou melhor, de fábrica. Não tem mais como recuperar nada, uma vez perdoado, esquecido para sempre, limpos como no dia do nosso batismo. “Ainda que seus pecados sejam vermelhos como púrpura, ficarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como escarlate, ficarão como a lã.” (Is 1,14)
E a perdição?
A perdição se dá quando insistimos em arquivar nossos pecados e fazer para nós uma lista que nem Deus quer ver, mas que insistimos em “salvar”. Impomos sobre nós mesmo a resistência à misericórdia de Deus, não deixamos à sua disposição deletar, mas os arquivamos.
O que é pecado sem perdão que Jesus nos diz em Lc 12,10? O que seria a blasfêmia contra o Espírito Santo, senão a recusa de aceitar a salvação que Deus oferece ao homem através do Espírito Santo, ou seja, negar a redenção de Jesus?
“Ora a blasfêmia contra o Espírito Santo é o pecado cometido pelo homem, que reivindica o seu pretenso «direito» de perseverar no mal — em qualquer pecado — e recusa por isso mesmo a Redenção. O homem fica fechado no pecado, tornando impossível da sua parte a própria conversão e também, consequentemente, a remissão dos pecados, que considera não essencial ou não importante para a sua vida. É uma situação de ruína espiritual, porque a blasfêmia contra o Espírito Santo não permite ao homem sair da prisão em que ele próprio se fechou e abrir-se às fontes divinas da purificação das consciências e da remissão dos pecados.”[2]
Em palavras digitais: só não tem como deletar o que você não quer ou o que não existe. O delete está a sua disposição, mas ele só executa a ação se você pressioná-lo. Transformando em dica: faça como Deus, que arquiva o que vale a pena e por isso nos salva apagando a nossas ofensas, como nós apagamos daqueles que nos tem ofendido. #FicaaDica
Cloud computing
Hoje em dia, com cloud computing, a tecnologia de arquivamento nas nuvens, nem é necessário mais salvar, tudo é salvo automaticamente quando é modificado. Acessado de qualquer lugar, porque tudo está “nas nuvens”.
Na tecnologia do Kingdon of God, ou do Kingdon of Heavens, é possível também realizar apagamentos todos os dias através dos sacramentos, especialmente da Eucaristia e da Reconciliação. Nessa tecnologia, eles não são automáticos, mas são bem simples de fazer. Não precisa de tutorial, basta clicar no botão “arrependimento” e tudo vai direto para o coração de Deus benevolente e misericordioso.
Como nos diz o Papa Francisco, “Deus jamais se cansa de nos perdoar. Nós é que nos cansamos de pedir perdão”. O coração de Deus não é um HD que arquiva nossos pecados. O coração de Deus é misericórdia, disposto sempre a nos perdoar, por isso nos oferece a cada dia gratuitamente a sua misericórdia.
[1] Cf. Lc 7, 39-50
[2] João Paulo II, Carta Encíclica Dominun et vivificantem. Sobre o Espírito Santo na vida da Igreja e do Mundo, 46.
Franco Galdino
Muito legal!!!
Ainda não sabia a diferença de salvamento pra salvação hehehe
Linguagem ótima, texto muito bom! E toca bem no jovem de hoje!
Aí sim, tá falando a minha língua!!! Ótima analogia com o mundo informático, com Deus tudo é contrário mesmo.