Nesta semana celebrávamos na Santa Missa o sacrifício de Jesus, e em ação de graças a Deus vivíamos a memória de Santo Inácio de Antioquia. Aliás o mês de outubro está repleto datas importantes em memória de mártires. Diante do altar, presidia a celebração Padre Guilherme Silva, aos 27 anos de idade. Ao seu lado, o padre Hubertus Bottcher, alemão de quase 60 anos. Na outra ponta, Monsenhor Catão Torcato, aos 84 anos, prestes a celebrar 60 anos de sacerdócio. Três gerações diferentes tendo ao redor do pescoço a estola vermelha do sangue dos mártires. Santo Inácio de Antioquia, diante do fim atroz que lhe fora reservado, esperava a hora derradeira dizendo que ninguém tinha o direito de tirar-lhe o presente do martírio, e que, se na arena do testemunho os leões do imperador Trajano não o devorassem, então, ele mesmo morderia os leões para provocá-los. O cristianismo, portanto, não foi erigido na história da humanidade por um conjunto de doutrinas pregadas, mas por um sem número de testemunhas.
Como Aquele que seguiam, milhões morreram pelo que acreditavam, e outros tantos morrem até os dias de hoje. O cristianismo foi adubado por sangue, não o alheio, mas o próprio. Não coagidos a entregá-lo, pois a vida seria poupada se houvesse a negação das crenças, mas livremente entregaram a vida por amor a Deus e aos homens.
Essas testemunhas não foram heróis nos conceitos do mundo, libertadores da pátria, ativistas políticos, militares sobreviventes de guerras sangrentas. Aos olhos do mundo foram homens e mulheres derrotados, não foram heróis. Não foram heróis e nem tinha superpoderes. Foram pescadores, os primeiros. Foram agricultores, donas de casa, pastores de rebanhos, foram também mendigos, leprosos, prostitutas, ladrões, todos com um característica que os uniam: conheceram o amor de Deus, que transformou suas vidas e jamais negariam esse acontecimento, a quem quer que fosse. Não só não negariam, mas nunca se omitiriam, oportuna ou inoportunamente, em proclamar essa experiência e favorecer que outros a vivessem. Os mártires não são heróis. São não só sacerdotes, mas mães, pais, filhos, casais. São homens e mulheres, jovens e idosos, ricos e pobres, porque é sem distinção que o sangue de Cristo se derrama.
Os três homens naquela celebração não são heróis. Eram homens comuns, que experimentaram que Cristo ressuscitou dentre os mortos, venceu a
morte, e, pela graça de Deus, abraçaram a consagração de vida. São homens ordinários, mas que sendo humildes permitiram que a ação de Deus os conduzissem a uma vida extraordinária.
A vivacidade dos dois mais velhos era como a do padre mais novo, a mesma alegria, entusiasmo, plenitude de vida, de sentido. Como corpo dos cristãos, fazem parte da herança deixada pelos primeiros cristãos, que foram à morte para deixar vida. Mártires cristãos não tem superpoderes, mas vencem o tempo, as limitações do corpo, os medos carregados na alma.
Os mártires não são heróis, são carne e ossos, alma, alegrias e prantos, homens e mulheres simples, como qualquer um, mas que, edificados pelo batismo, sustentados pela graça, foram indagados pelo mundo a negar a salvação pela morte e ressurreição de Jesus, e tiveram uma única resposta: eu vi!
Mártires não são heróis, são testemunhas que permaneceram até o fim testemunhas.