Formação

Frei Patrício: Somos um povo a caminho

Somos um povo a caminho. Não sozinhos, mas com todos os que creem, estejam onde estiverem. Nunca cremos no que nos parece crível, no que gostamos, mas o que nos é proposto para crer pela mesma Palavra de Deus e pela Igreja.

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No Brasil, durante o mês de agosto, celebramos o mês vocacional. Temos, assim, uma oportunidade que nos convida a refletir sobre os diferentes carismas que o Espírito Santo espalha, com abundância, sobre a humanidade para o bem de cada um. Sempre a definição de carisma que dá São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios, capítulo 12, me obriga a parar e a meditar “é um dom que Deus dá a alguém para o bem da comunidade.”

 Tudo o que somos e temos é dom. Não é apenas fruto do nosso trabalho e da nossa decisão, mas é bondade de Deus, e nada podemos e devemos considerar nossa propriedade exclusiva, pessoal. Na verdade, somos chamados a compartilhar com os outros. Se houvesse partilha como houve na multiplicação dos cinco pães e dos dois peixinhos, acabaria a pobreza, as divisões, a luta e a guerra.

Por que há divisões e guerras? Porque temos no coração o “vírus” da ganância, que nunca diz “basta”. Queremos sempre mais, ainda que não façamos uso. Ao guardar, foram criados bancos, armazéns, onde tudo se acumula sem ser usado. Deus diz “Nós”, e nós dizemos “Eu”. Jesus diz “Pai nosso” e “pão nosso” e nós, com orgulho, dizemos “Meu pai” e “meu pão”. Com isso, ficamos órfãos e famintos.

Faltam as vocações. Mas por quê?  Não podemos reutilizar a velha palavra “não tem filhos”, “os jovens não querem nada”, etc. dos etc. Deveríamos dizer por que eu não convido outros para a alegria de ser do Senhor na vida religiosa, no sacerdócio e na família. As vocações, nos diz o Papa São João Paulo II, são uma resposta de Deus à comunidade que reza. Cada comunidade deveria ter a capacidade de prover para seu povo os seus ministros sagrados, seus sacerdotes, seus consagrados e religiosos.

 Vou explicar. Não sei se a minha ideia é certa ou errada, mas sinto no coração que, um dia, chegaremos lá. No início da missionariedade apostólica, quando Paulo ia evangelizar, por exemplo a comunidade dos filipenses ou dos gálatas, antes de partir, escolhia dentro da comunidade os que pudessem continuar a manter viva a chama da fé, a celebrar os sacramentos, a assegurar a força e a fidelidade da doutrina.

Quem sabe nós não estejamos vivendo um momento em que o Espírito Santo nos chama a refletir que não é bom enviar à comunidade do Egito um irmão da comunidade do Brasil e ao Brasil um irmão da Índia? Cada comunidade constituída deve se preocupar em prover para a Igreja não só o sustento material, mas principalmente os ministros, os sacerdotes, os consagrados, segundo as próprias necessidades pastorais. Como provêm os catequistas, os cantores, por que não prover também os sacerdotes, os consagrados e as consagradas? São ideias que podem escandalizar um pouco hoje, mas daqui a mil anos serão normais. Cada comunidade deve ser capaz de viver não só a própria fé mas de difundi-las: “Ide e pregai o Evangelho a todas as criaturas.” (Mc 16,15)

 A sabedoria é a fidelidade de Deus e do homem

Tendo meditado antes de escrever este pequeno texto sobre o livro da Sabedoria, me parece que encontrei uma resposta para mim e para os meus leitores. Deus é fiel às Suas promessas e exige que não tenhamos medo de dar testemunho do Seu amor no meio do mundo que não crê e combate abertamente a verdade e o verdadeiro Deus.

Um dia, o Papa Bento XVI disse, e o Papa Francisco o tem repetido, que os “verdadeiros inimigos da Igreja não estão fora da Igreja, mas dentro da mesma Igreja”. Pode parecer um despropósito, porém, ao refletir bem, é a maior verdade que pode ser proclamada. Quem é cristão e não se esforça para ser fiel à própria fé, se torna inimigo da mesma fé que professa. A nossa identidade cristã não é individualista e tampouco personalista.

Nós seremos como Igreja e a seguiremos, e quando virmos que os mesmos homens de Igreja não são fiéis, devemos gritar e dar testemunho de Jesus. Os judeus viveram  momentos de perseguição, os cristãos viveram e vivem perseguidos, mas não desanimam. As últimas palavras da leitura devem ser bem meditadas “Os piedosos filhos dos bons ofereceram sacrifícios secretamente e, de comum acordo, fizeram este pacto divino: que os santos participariam solidariamente dos mesmos bens e dos mesmos perigos. Isto, enquanto entoavam antecipadamente os cânticos de seus pais.” (Sb 18,9)

A fé não se vê nem se discute, se vive

Somos um povo a caminho. Não sozinhos, mas com todos os que creem, estejam onde estiverem. Nunca cremos no que nos parece crível, no que gostamos, mas o que nos é proposto para crer pela mesma Palavra de Deus e pela Igreja. Eu sofro muito quando escuto ataques à Igreja, ao Papa, aos Bispos, aos cristãos, dizendo que são heréticos ou que destroem a fé. Vejo, então, que a única maneira que temos para evitar tudo isto é crer que quem conduz o povo é o mesmo Deus, que enviou o seu único Filho, Jesus Cristo, que se fez carne e habitou entre nós e se fez caminho, verdade e vida.

Não devemos ter medo, a leitura do capítulo 11 da Carta aos Hebreus é de uma beleza única e ela nos conforta e dá coragem. Seguimos os passos dos mártires, que nunca buscaram o mais fácil, mas sempre a Cruz de Jesus, sendo fiéis ao amor de Deus. Caminhar juntos, ser santos é a melhor maneira para combater todos os erros. A nossa vocação é a santidade.

Esperamos Jesus de pé

O Evangelho de Lucas de hoje é uma longa página. Não se pode pretender, portanto, compreendê-la em dez linhas de comentários. O melhor comentário da Palavra de Deus é, no entanto, meditá-la todos os dias e verificar se a vivemos, pois nós somos o melhor livro de exegese bíblica, quando vivemos com santidade de palavras e de obras o Evangelho de Jesus.

Que Jesus vai vir não é fantasia, que Ele vem amanhã é fantasia pura. Quem espera alguém que sabe que virá e não sabe quando chegará, permanece sempre pronto, acordado, esperando sua vinda, e não quer ser pego de surpresa, dormindo ou metido em “orgia”, dizendo “não é hoje que vai chegar…”.

Há três vindas de Jesus ao nosso meio: a primeira se mostra pelos avisos que o Senhor nos envia, por WhatsApp, mensagem, e que devemos saber ler, para saber se as coisas vão mal, se há guerra, se há crime, se há terrorismo. Pode ser que sejamos vítimas destas coisas quando menos esperarmos.

 A segunda se trata da vinda de Jesus que vai acontecer na nossa morte. Quando será? Não sabemos, mas sabemos, sim, que vamos e, por isso, devemos estar bem preparados para este encontro com Jesus, no qual seremos julgados no amor, mas segundo os dons que temos recebido.

A terceira, a vinda final citada em Mateus 25, se refere àquela em que todos seremos julgados e, então, começarão o mundo novo e a nova terra, sem males e sem ódio. Devemos estar preparados para as três, afinal não sabemos quando, mas temos a certeza de que vão acontecer. Senhor, dai-nos a graça de estarmos preparados.

Escola de oração

Para sermos felizes de fato, é preciso que vivamos a nossa vocação. Para isso, devemos nos manter firmes na vida de oração e na leitura da Palavra, a fim de ouvirmos a voz de Deus e entender o que Ele nos pede. Assim, estaremos cientes também de quem somos. Pela fé vivida, O esperaremos. Dessa forma, com fé, com vida de oração e na constante vivência do Evangelho, como diz o Santo Padre Francisco, é possível “identificar a palavra, a mensagem de Jesus que Deus quer dizer ao mundo com a tua vida. Deixa-te transformar, deixa-te renovar pelo Espírito para que isso seja possível, e assim a tua preciosa missão não fracassará. O Senhor levá-la-á a cumprimento mesmo no meio dos teus erros e momentos negativos, desde que não abandones o caminho do amor e permaneças sempre aberto à sua ação sobrenatural que purifica e ilumina.” (Gaudete et Exsultate, 24)


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