Mais uma vez, imersos na ótica do Amor podemos perceber mais do que nos diz o óbvio.
Jesus é especialista em transubstanciar (perdoe o neologismo, mas ele irá nos ajudar, ok?), mas profundo como só Deus pode ser, essa transubstanciação a que nos referimos, evoca de maneira compulsória uma palavra grega que completa o seu sentido: metanoia. Metanoia significa mudança de pensamento, ou mudança de mentalidade. E é exatamente isso que Jesus faz. Ele nos recria em uma nova mentalidade.
São Lucas, o evangelista da ciência, inicia sua narrativa relatando de forma clara a metanoia, a mudança na psique de Zaqueu, que após ser fitado pelo Senhor, passa de chefe dos cobradores de impostos e de conhecido ladrão público (pense aí em algum de nossos chefes de estado envolvido nos maiores escândalos de corrupção já relatados. Pensou? Zaqueu estaria em um churrasco desse cara.) a um misericórdia do Filho de Deus, que transformado pelo Senhor sente-se impelido a amar.
E perceba: esse amor não é romântico à lá Disney, mas trata-se de um amor concreto. Um amor que leva Zaqueu a procurar a restituição de quem injustamente foi cobrado, e mais: necessitado de amar, ele se inclina a indenizar os injustiçados. Entende o que um simples olhar do Senhor pode fazer? Percebe que como o coração da Hemorroisa entendeu, a presença do Senhor é o bastante para o que quer que seja, uma vez que Ele, causa primeira de todas as coisas pode tudo? Mas Ele nos conhece, sabe de nossa incapacidade e por isso nos dá ainda mais…
A tradição judaica diz que apenas o chefe da família ou o anfitrião pode proferir a benção sobre os alimentos e que aos convidados e familiares cabe aguardar que este, após a benção distribua como queira o alimento aos demais que calmamente o recebam. A mesma tradição, segundo um fragmento do pergaminho do mar morto nos diz ainda que ninguém deve levantar a mão para abençoar o pão sem que este seja o patriarca ou hospedeiro, a menos que seja o Messias, a quem eles esperavam e que soberanamente abençoaria a tudo e a todos.
Pois bem, na narrativa da Paixão, São Lucas nos mostra O Senhor olhando para os limites de nossa carne e para as lentidões de nossa temporalidade ao aderir às tradições e costumes para nos mostrar que Ele é Deus. Ao enviar Pedro e João para prepararem a ceia da páscoa, justamente os pede para procurarem o desconhecido e em sua casa prepararem a páscoa (Lc 22, 10-12), e ali, na casa de seu anfitrião, Ele levanta a mão e profere a benção ao partir do pão. Segundo a lei Ele dizia naquele ato: Eu sou o Messias.
Segundo o coração de Deus, ele ia muito além! O pão e o vinho ali, junto à revelação messiânica deixam de ser pão e vinho e tornam-se corpo e sangue. A transubstanciação aconteceu! Preservam-se os aspectos, os costumes, a lei, mas a substância é o próprio Senhor, e metanoia é inevitável, entende? Como não converter o pensamento? Como não inclinar o coração? A substância que vence toda e qualquer morte, disfarçada no pão e na lei. O rito que acompanharemos neste tríduo pascal fará memória do mistério de transubstanciação que converte morte em vida.
Quais são as suas mortes? Quais os pensamentos e mentalidades que precisam ser recriados? Quais os anseios que lhe fogem o controle e lhe afastam do céu? Apresente a Ele! Não receberemos este ano as espécies eucarísticas, poderemos, no entanto, rendermos ao Senhor o que em nós Ele precisa transubstanciar. Sem medos, sem angústias. Lembre-se: Ele conhece os limites e as lentidões do nosso coração. Muito mais do que nós Ele é paciente e infinitamente mais do que nós mesmos deseja nos salvar.
Não se preocupe em pedir grandes mudanças. Não se culpe por não arder mais do que tudo em seu coração o fim da fome no mundo, se esse não for o caso. Seja realista, simples como o pão que Ele transformou em corpo. Apresente a sua ansiedade com a crise, a sua justa preocupação com o sustento dos seus, aquele seu familiar, aquela dependência, ou o pecado de estimação… Enfim, você já me entendeu… Apresente isso aí que passou na sua cabeça se a preocupação de rodeios ou palavras bonitas. Se Ele transubstanciou farinha, água e uva, imagina só você, com todos os seus dons e talentos criado por amor, pelo Amor e para o amor.
Santa comunhão!
Christian Rité, Amigo do Shalom Santo Amaro