Depois do convite que fizemos na semana passada, me conta uma coisa, você iniciou a arrumação da sua casa interior, isto mesmo, do seu coração? Quais foram os entulhos que você encontrou e que precisam ser descartados? Você teve mesmo a coragem de jogar fora aquele utensílio de estimação (pecado), que quando é utilizado (praticado) traz tantas consequências desastrosas à sua vida e à vida de outros? Você partilhou com alguém as feridas de seu coração? Ou guardou os seus desafios entre você e Deus?
De minha parte, posso partilhar com você que tenho pensando muito sobre a virtude da paciência, clamado a Deus que me ensine a ser menos irada, e mais misericordiosa, comigo, e com os outros. Eita que o negócio é desafiante! Mas vamos adiante. O convite é faxinar antes da Páscoa. Somos convidados a vivermos o mistério da morte e ressurreição do Senhor unidos a Ele e não posso fugir daquilo que ainda é velho em mim. Somos chamados a colocar em sua cruz as nossas dores, físicas, emocionais, espirituais, as nossas mortes, para que com Ele ressuscitemos! É a palavra de Deus em Is. 53, 4, que me diz: “e, no entanto, eram os nossos sofrimentos que ele levava sobre si, nossas dores que ele carregava.” Eu não quero permanecer na vida velha. E você?
Falando em guardar as coisas no coração, não poderia deixar de falar sobre a nossa mãe, que adotou esta postura diante de fatos que foram acontecendo em suas vidas, conforme narra Lc. 2,19. Ela tinha um coração limpo, livre, corajoso, humilde, dócil, temente, silencioso, de alguém que aderiu interiormente à vontade do Pai para sua vida, qual seja, a verdade pautada no Amor.
Segundo a Bíblia de Jerusalém, “a verdade é a expressão da vontade de Deus a respeito do homem, tal qual nos foi transmitida por Cristo. Nós a “conhecemos” no sentido que ela habita em nós, como um princípio de vida moral: “caminhamos” (= vivemos) segunda suas diretivas, “fazemos a verdade”, i.é, agimos em conformidade com aquilo que ela exige de nós. Ela se opõe, portanto, “ao mundo” como uma espécie de meio ético: aqueles que pertencem “ao mundo” só podem odiá-la, aqueles que são “da verdade”, obedecem à mensagem de amor que Cristo nos transmitiu da parte de Deus. Eles são santificados pela verdade como também pela palavra de Cristo. Uma vez que essa verdade nos é dada por Cristo, este pode afirmar que ele é a Verdade que nos conduz ao Pai, assim como depois de sua volta para junto do Pai, é o Espírito que, conduzindo-nos em toda a verdade, será a Verdade, ou o Espírito de verdade.”
Ela tinha vontade própria que se uniu, pela fé, à vontade Daquele que a criou. Sua intimidade com Deus era admirável, o que restou demonstrado no Magnificat. Seus lábios, diferentemente dos nossos que muitas vezes são utilizados para a murmuração, eram usados para o louvor, e diante daquilo que ainda lhe era desconhecido, sua postura permanecia firme, dia após dia, abandonada totalmente à Palavra. Ela sabia em quem havia colocado a sua confiança. E mesmo diante da maior dor que poderia ter sofrido, a experiência de ver Jesus sendo crucificado, confiou naquilo que Ele disse a João, que ela era a mãe dele, e que ele disse a ela, que João era seu filho.
Um minutinho! Falando sobre murmuração, na carta aos Filipenses, 2, 14-16, recebemos uma ordem: “Fazei tudo sem murmurações nem reclamações, para vos tornardes irreprováveis e puros, filhos de Deus, sem defeito, no meio de uma geração má e pervertida, no seio da qual brilhais como astros no mundo, mensageiros da Palavra de vida.”
Nada de reclamação, então! Avancemos na limpeza! A depender do que encontrarmos dentro de nós, não podemos desanimar.
Continuando, vimos em Jo. 19, 25-27, que João levou Maria para sua casa e a acolheu como sua mãe, e Maria aceitou o encargo de ser mãe de João. E eu, e você? Também levamos Maria para nosso coração? Damos a ela o lugar que Nosso Senhor pediu? Se Maria estiver no centro, Jesus lá estará, o Espírito me santificará, e o Pai me amará mais ainda.
Nestes tempos de dor no qual estamos atravessando, temos uma santa companhia, Maria. Ela tem muito a nos ensinar com sua postura de fé e silêncio, e, como nos disse o Papa Francisco “era silenciosa, mas dentro do seu coração, quanta coisa dizia ao Senhor! (…) Ela, com o silêncio, cobriu o mistério que não entendia e com este silêncio deixou que este mistério pudesse crescer e florescer na esperança (…) O silêncio é o que protege o mistério. Que o Senhor nos dê a graça de amar o silêncio, de procurá-lo e ter um coração protegido pela nuvem do silêncio”.
Porque será que o silêncio é tão importante? “A “ditadura do barulho” gera confusão, descaminho, tristeza. O barulho nos deixa surdos diante das coisas que realmente importam na vida. O mundo nos propõe a aparência e o barulho que nos distrai de Deus e do amor ao nosso próximo. O silêncio nos faz enxergar verdades sobre nós mesmos e os outros. Ele nos traz a novidade de uma visão renovada da realidade e dos outros; nos faz julgar menos e amar mais. O silêncio nos abre à misericórdia de Deus, ao perdão dos outros e à expectativa de ser melhores.”
Então! Por motivos diversos, tantas e tantas vezes, preferimos o barulho ao silêncio e em meio a tantas informações que nos chegam, nos esquecemos de Maria. Não nos relacionamos com ela, seja por meio do santo terço, seja por meio de novenas, seja por meio de um diálogo aberto como o fazemos com nossos amigos, seja por meio da livre e amorosa consagração à ela.
Se nos relacionássemos com a Palavra de Deus da forma como somos chamados, veríamos que Maria é o exemplo de santidade que deveríamos seguir nestes tempos de provação. E, pela força de sua intercessão, estaríamos mais próximos a Jesus. A Palavra de Deus é viva! Se observo o que lhe aconteceu, aprenderei que mesmo nos momentos de dor, eu preciso seguir o Mestre, não voltar atrás.
Jesus já nos alertou sobre não escutarmos a Palavra de Deus, em Jo. 8,37. Isto porque, ainda somos dependentes de tantas palavras contrárias ao Reino.
Maria viveu um dia de cada vez o mistério que o Pai tinha reservado à sua família, mistério este de vida, que passou pela morte de seu Filho.
Que hoje possamos aprender com ela a viver o nosso hoje, em silêncio, com um coração que sabe escutar, obedecer, mais do que nunca, esperar e confiar nas promessas do Pai, no mistério divino que nos envolve neste tempo para sermos mais próximos a Ele, para compreendermos que não deixará de ser nosso Pai mesmo quando permite que o sofrimento bata à nossa porta, afinal, tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus.
Que hoje peçamos a Deus a graça da libertação de toda palavra que nos afasta de Deus, que nos feriu e nos impediu de aderirmos ao Amor de Deus.
E com relação à intimidade com Maria, peça ao Espírito a graça de ser seu amigo, de rezar o terço. Tenho certeza que Ele fará maravilhas em seu coração, por meio da devoção e amor à nossa mãe, preparando-o para a Páscoa que se aproxima. Sigamos com ela!
Referências
1 Nota de rodapé explicativa à alínea “a” de João 8,31, fls. 1.865: “Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.”
2 https://noticias.cancaonova.com/especiais/pontificado/francisco/papa-indica-silencio-para-compreender-o-misterio-do-encontro-com-deus/ (Acessado em 05/04/2020)
3 https://pt.aleteia.org/2017/11/28/por-que-o-papa-levou-nossa-senhora-do-silencio-para-o-vaticano/ (Acessado em 05/04/2020)
Por Maria Isabel Rodrigues