Tivemos mais um ano atípico, na verdade, um novo normal. Passamos por várias fases na vivência da pandemia. Houve um tempo um pouco estranho, em que ficou difícil de se relacionar bem com as pessoas da mesma casa. Tudo mudou. A convivência foi intensa. O trabalho foi para casa, a casa para o trabalho… agora os eventos híbridos, limitados, carteira de vacinação…
E apesar de tanta mudanças, teve gente que soube aproveitar essa estranheza do tempo presente para não fingir mais a sua dor para ninguém, principalmente para os de casa. Alguns aproveitaram para acender a luz da sala e, ao invés das tela, ligaram os corações. Ficaram conectados uns com os outros, em casa. Entre choros e sorrisos entrelaçados. A lembrança do cheiro da roupa e do perfume foram despertados num abraço demorado.
As divisões das paredes acabaram. Aproveitaram para tentar contar os fios de cabelos brancos; para contar e ouvir as histórias de família. Aprenderam a ler a verdade da alma se desligaram das notícias mentirosas.
Reaprenderam a pôr a mesa, a ajudar a tirar o pó da casa, a pôr a roupa no varal, a partilhar os excessos com quem necessitava, a fazer o prato que cada um gostava, a assar um pão quentinho pra tomar com café, a fazer o bolo que antes só ficava na vontade e na vitrine da padaria, a passar mais tempo nas refeições…
E assim, aprenderam não só a dividir as contas para pagar, mas as dores e as alegrias que o dinheiro não compra. Aproveitaram para reaprender o sentido da presença. Cada um no que é, sendo quem é, com hora certa pra estar on-line ou off-line, pra escolher o simples e duradouro, para ensinar a lição de casa dos filhos, para aprender um novo esporte ou a cortar o cabelo, para jogar ludo ou o velho e bom banco imobiliário.
Aproveitaram pra não mais reclamar da toalha molhada em cima da cama, nem dos pares de tênis jogados pela sala. Aproveitaram este tempo tão estranho para não mais serem estranhos um para os outros dentro pra própria casa. Reaprenderam a ser o que precisavam (e não o que os outros esperavam que fossem).
Aproveitaram para reaprender sobre a fragilidade e a não se assustar com ela.
Aproveitaram para lembrar que eram comuns — e que em casa, não tinham papéis para atuar.
Neste tempo estranho, se lembraram de quão normal, extraordinário e maravilhoso é simplesmente ser pai, mãe, filhos e irmãos. A casa não é o lugar das máscaras.
A minha família é o lugar onde posso ser quem sou.