Me chamo Afonso Azevedo, tenho 28 anos e pela infinita misericórdia de Deus fiz minhas primeiras promessas como Comunidade de Aliança no dia 20 de junho de 2021. Desejo agora contar um pouco do caminho pelo qual o Senhor foi me conduzindo até chegar a esse dia, que na verdade não é um ponto de chegada, mas de constante partida.
Moro da cidade de Coreaú, localizada a 52 km da cidade de Sobral, no norte do estado do Ceará. Costumo sempre falar que minha vida se inicia em 2015, quando tive minha primeira experiência com Deus e brinco que antes disso eu ainda não existia. Levava uma vida bem tranquila, fazia faculdade de Engenharia Civil, trabalhava como concursado em uma empresa do governo federal, tinha uma família estabilizada, aparentemente a vida dos sonhos de qualquer jovem de 23 anos. Mas não era assim que me sentia.
Fui conquistando todas essas coisas que sonhava, mas algo faltava em mim, não sabia o que era, mas sentia que a minha vida não poderia ser só isso, era muito pouco, faltava o real sentido de viver. Sempre fui muito calmo, calado, muito tímido e introspectivo, isso dificultava muito a minha relação com as pessoas, praticamente não tinha amigos. Levava uma vida sem sentido e sozinho e uma tristeza quase constante.
Experiência de Amizade
No final de julho de 2015 fui convidado para participar do grupo de oração Shalom que ocorria na minha cidade, Coreaú, resolvi aceitar o convite e participar desse grupo de oração. Cheguei no salão onde ocorria o grupo, não conhecia ninguém, fico no meu canto calado, mas algo ali já me chamou atenção, aquelas pessoas tinham algo de diferente, uma alegria, um brilho diferente. Fui muito bem acolhido, mas ainda permanecia muito fechado pela minha timidez, porém me violentei e na semana seguinte retornei ao grupo de oração e foi nesse dia que minha vida começou. Era dia de adoração ao Santíssimo Sacramento no grupo, a oração em línguas para mim ainda causava estranhamento, a então pastora do grupo se aproxima, impõe suas mãos e começa a rezar por mim.
Até então a imagem que tinha de Deus era de um deus que vivia no céu, que tinha formulado leis e mandamentos que deveriam ser seguidas e que quando eu morresse me julgaria e me mandaria pro céu ou inferno, porém naquele dia conheci um deus muito diferente disso, conheci o Deus que me ama de verdade, que me conhece, que sabe das coisas que acontecem na minha vida e mais do que saber, se preocupa comigo e quer o meu bem, que não é indiferente às minhas dores e necessidades, que sabia de todos os meus pecados e mesmo assim continuava me amando.
De fato, naquele dia me senti amado por Deus, naquele dia o olhar de Deus, que era todo amor e misericórdia, se cruzou com o meu, que era todo tristeza e solidão e Ele me amou. Desse olhar nunca me esqueço, desse amor sempre me recordo. Agora eu podia respirar aliviado, tinha achado o que tanto me faltava, tinha descoberto o que tanto eu procurava e não sabia, tinha encontrado a minha casa. Esse foi o meu sentimento naquele dia, achei a minha casa, achei o meu lugar.
“Desse olhar nunca me esqueço, desse amor sempre me recordo.”
Descobri a graça da oração pessoal, do estudo bíblico, de que todos os dias poderia novamente fitar o meu olhar no olhar de Cristo e ser amado por Ele e como resposta O amar, descobri o melhor dos amigos que eu poderia ter, descobri aquele que se importa de verdade comigo, que não é indiferente a minha vida. Essa amizade me levou a me abrir às novas amizades e assim termos amigos em comum, os amigos de Deus eram meus novos amigos, passei, a cada semana me violentar para vencer a minha timidez e estar aberto aos outros e a Deus.
“Os amigos de Deus eram meus novos amigos”
Resposta de gratidão
O amor de Deus por mim era algo tão grande e impressionante que em mim nascia uma enorme gratidão e eu tinha que retribuir de alguma forma todo esse amor, surgia aí o desejo de me consagrar, de entregar a minha vida em gratidão ao Senhor.
Em 2016 ingresso no vocacional e inicia-se aí um processo de discernimento mais direcionado em vista de fazer a vontade de Deus, não por imposição, mas por gratidão. Durante todo o meu processo vocacional o Senhor foi me direcionando ao outro que são as pessoas sedentas por Deus e ao grande Outro, que é Ele mesmo.
Cada vez olhando menos para as minhas fraquezas e infidelidades e mais para a força e misericórdia de Deus. O amor pela Comunidade crescia a cada dia, porém as minhas fraquezas iam ficando cada vez mais claras, nesse tempo aprendi muito com nosso mestre São Francisco, lendo o livro “O Irmão de Assis” e assim como ele, também rezava “Quem sou eu e quem é Deus?”, nisso fui crescendo no autoconhecimento e consequentemente na gratidão a Deus que mesmo sabendo do meu nada me escolhia para tão bela vocação.
Não tinha mais dúvidas que a Comunidade Shalom era a minha casa, não tinha dúvidas que queria ofertar a minha vida por inteiro, mas ainda não calava no meu coração para qual forma de vida o senhor me tinha criado. Sempre admirei muito a Comunidade de Vida, a coragem de deixar tudo, a oferta total, mas foi rezando com a Comunidade Aliança que o Senhor me firmou.
Acredito que a vontade de Deus não nos é revelada como um passe de mágica, a minha experiência pessoal é de que Deus me forma e me conduz na minha própria vida, é sempre uma iniciativa de Deus, é sempre Deus o primeiro a querer, o meu principal papel é deixar Deus fazer, perceber o movimento de Deus na minha vida e colaborar com esse movimento, dizer sim.
Dependência da Graça
No Escrito Shalom, o Moysés nos fala “Foi no decorrer da caminhada, na vivência da nossa fé, na correspondência ao chamado que nos fazia, que Ele foi mansamente desenhando em nós toda grandeza da nossa vocação e nos dando a graça de compreendê-la.”
Vivenciando a vida da Comunidade de Aliança, durante a experiência vocacional, percebi a graça de Deus me formando, era algo que eu não conseguia viver de forma natural, eram muitos compromissos, muitas atividades, eu não estava mais aguentando, era demais pra mim, foi aí que enxerguei a mão de Deus a me formar e me conduzir, era insuportável para o meu eu atual, para corresponder eu precisava de Deus, precisa ser dependente da graça, eu não conseguiria viver aquilo por mim mesmo, eu precisava me sacrificar mais, eu precisa me ofertar mais, eu precisava me deixar formar mais por Deus e Deus só me formaria, só me podaria no que eu precisava, dentro da Comunidade Aliança, com as renúncias e graças próprias dela.
Fui percebendo que o Senhor me chamava a essa obra de “escondimento” própria da Comunidade de Aliança, a nossa oferta não é vista, muito menos aplaudida, na maioria das vezes incompreendida pelos que nos rodeiam, é uma oferta concreta e frutuosa, mas muito silenciosa, muitas humilhações e obstáculos, porque permanecer no mundo e não ser mais governado por ele é e sempre será uma batalha que precisa ser vencida todos os dias.
Ser Eucaristia para a humanidade
Era isso que o Senhor queria de mim, humildade e luta diária e assim me deixar ser transformado em alimento para o mundo que, por mais que não saiba, necessita desse alimento que é o próprio Deus, ser eucaristia viva para aqueles que me rodeiam, cuidar desse povo necessitado, apascentar esse povo que o Senhor me dava, me deixar ser consumido por eles, era a essa missão que Deus me chamava e atraia, era isso que preenchia o meu coração.
Tinha encontrado o meu lugar no mundo, porém os medos e incertezas ainda persistiam em mim, o medo de não conseguir corresponder, a incerteza do futuro, medo das renúncias, medo da temível falta de tempo, tudo isso me aterrorizava. Esse medo me dominava porque o meu olhar e a minha esperança ainda estavam centrados em mim mesmo, nas minhas forças.
Confiança na fidelidade divina
No meu retiro final o Senhor veio de fato vencer na minha vida, me mostrou que não importa as dificuldades e desafios que estão pela frente o que importa é se Ele estará comigo. Se estiver junto a Jesus a vitória é certa. Sempre falo para os meninos que hoje eu acompanho, a nossa vida é como um livro que vamos escrevendo durante a nossa existência, porém o final desse livro já está escrito, no final da história Cristo vence a morte causada pelo nosso pecado, Cristo vence na nossa vida, esse é o final da história, então não tem motivo para temer, muitos capítulos serão escritos, mas nada muda o final.
Se permanecer com Cristo não preciso temer as tempestades e agitações. O meu papel é simplesmente perseverar, ser fiel a voz de Deus que me chama e me deixar conduzir por Deus que, para nós que somos chamados a esta vocação, também se manifesta pelas autoridades constituídas.
Nossa grande tarefa é dizer sim a Deus e perseverar até o fim. Certezas que serei fiel até o fim não tenho, me conheço e sei das minhas fraquezas, mas tenho certeza que Deus será fiel até o fim, então caminho na fé, é necessário caminhar na fé e para que a fé exista e seja exercitada, é preciso ter essa aparente incerteza, é preciso se lançar em alto mar, se jogar do abismo, adentrar na escuridão e depois de dar o passo na fé, nunca parar, não voltar atrás, não desistir, não desanimar, sempre levantar e recomeçar.
Confio mais em Deus do que em mim mesmo, confio mais na voz que me chamou do que nas minhas capacidades, confio muito mais no olhar que me fitou e amou do que nos meus sonhos e planos passageiros. Durante esses anos em que estou dentro da Comunidade não me arrependi nenhum dia, porque são as dificuldades e consequentes graças que me são apresentadas no meu dia a dia que me fazem mais maduro, mais consciente que sim esse é o meu lugar, sim é aqui que Deus me quer, é aqui que sou feliz, é aqui que pela graça e misericórdia de Deus permanecerei para sempre.
Afonso Azevedo – Consagrado da Comunidade de Aliança em Sobral (CE)
emocionada com esse testemunho, sua história de vida dentro da comunidade mim fortalece meu desejo de seguir nessa caminhada nada fácil