As urnas, neste primeiro turno das eleições, desenharam umagramática cuja sintaxe traz o desafio de ser destrinchada e compreendida. Umacomplexa tarefa que inclui diferentes intérpretes, desde os analistaspolíticos, partidos, especialistas de variados campos do saber, entrelaçando aopinião pública, até os marqueteiros com suas incursões nos propósitos deexitosos resultados. Contudo, a interpretação argumentada mais importante éaquela do eleitor que voltará às urnas no segundo turno. Não só. Está posta aexigente tarefa de configurar o mapa atual do Congresso Nacional e também dasAssembleias Legislativas.
Não é bom relegar o acompanhamento dos executivos estaduaiscom suas tarefas e obrigações de intervenção mais rápida e determinante nosproblemas de infraestrutura e necessidades básicas da população. A tarefa deacompanhar, promover o diálogo e participar das discussões que definem aspolíticas públicas, é o lado exigente da condição cidadã de ser eleitor. Nessadireção há que se avançar de modo político mais amadurecido enquanto secompreende que o eleito, no exercício de sua função, está a serviço dasociedade e de suas necessidades, sempre ancorado na justiça social e nodireito.
Sem esse monitoramento e permanente discussão em fóruns,comitês e grupos de acompanhamento, cria-se a situação propícia de se deixarque o serviço político perca sua finalidade, sendo regido por interessescartoriais. Se a sociedade se omite e não se envolve nas necessárias discussõese vigilâncias, tratando de modo substantivo as questões e carências, abreportas para cenários deprimentes e abomináveis na política, permitindo que estanão dê conta de sua tarefa central, a de garantir a justa ordem da sociedade edo Estado. Adverte o Papa Bento XVI, na sua Carta Encíclica Deus Caritas est,n. 28, que assim sendo, o Estado não seria regido pela justa ordem e“reduzir-se-ia a uma grande banda de ladrões, como disse Santo Agostinho umavez”. E ainda, “A justiça é o objetivo e, consequentemente, também a medidaintrínseca de toda política. A política é mais do que uma simples técnica paraa definição dos ordenamentos públicos: a sua origem e o seu objetivo estãoprecisamente na justiça, e esta é de natureza ética”.
A natureza ética da justiça, em se considerando o mapa dasurnas no primeiro turno, e o que vai acontecer no segundo turno, de importânciadeterminante para o futuro na sociedade brasileira, comprova um equívoco quandoopiniões desclassificam ou desconsideram o papel da religião, dos gruposreligiosos confessionais ao redesenhar o quadro político. Ouve-se por aí aopinião de que seitas e a Igreja Católica se envolveram indevidamente noprocesso eleitoral. É exato considerar essa participação indevida quando hámistura de caráter partidário com a inabilidade ao tratar candidatos de modo ainfluenciar preconceituosamente.
Este é um risco que inclui uma compreensão que pode levar auma idealização dos candidatos, com a conclusão de que nenhum é perfeito,portanto não merecedor de seu voto. Não se encontra candidato perfeito. Bastapensar que são candidatos de um partido com suas coligações. É claro que nãovai se desconsiderar um dos inumeráveis aspectos que a gramática das urnasindicou: trata-se do anseio por pessoas com integridade que garantam um exercícioadequado e indispensável da autoridade moral.
Um anseio que aparece aqui e ali contracenando, de modooposto, com escolhas que revelam protesto, sinal de descrédito. Mas, apareceramtambém as surpresas reveladoras do desejo de inovação. Voltando à participaçãoeleitoral a partir dos valores nos quais a confissão religiosa se pauta, não sepode deixar de considerar a força advinda daí influenciando nos resultados. Nãoserá, para não ser inadequada, uma influência partidária, nem aquela daconstituição de bancada, não apreciada, decisivamente, pela Igreja Católica.
Mas, a influência da impostação ética, oferecendo critériosque respeitem o exercício soberano de escolha do eleitor, na sua liberdade e nasua capacidade de refletir e decidir. Não se pode estacionar na idealização de um candidato. As condições docandidato, iluminadas pela ética, que é e deve ser o coração da confissãoreligiosa, funcionará como uma lâmpada iluminando o caminho – com seus altos ebaixos, luzes e sombras – na gramática de sintaxe complexa que as urnasconfiguraram e estão exigindo novos entendimentos para definições adequadas nasociedade.
É indispensável multiplicar diálogos em todos os níveis,debates e intercâmbios com analistas de campos diferentes e distintos pontos devista na tarefa cidadã de compreender, decifrar e posicionar-se diante dagramática das urnas.