Sabe aquela montoeira entulhada impedindo a livre abertura das gavetas? Papéis e outras inutilidades, reflexos da nossa mania de guardar as coisas para mais tarde jogarmos fora? Isso se denomina protelar, adiar, retardar, prorrogar, procrastinar.
Todos nós fazemos isso com uma certa frequência, raro são os afortunados que lidam com o tempo de forma a não deixar nada para resolver depois. Existe um tipo de protelador que escapa a todos os limites de normalidade, e é dele que iremos falar agora.
Sua mesa é limpa e desentulhada na aparência, com a impressão de ausência de habitação, mas, se pudermos vasculhar suas gavetas, veremos que se encontram abarrotadas de compromissos adiados ou esquecidos, contas a serem pagas, anúncios a serem feitos, cartas a serem encaminhadas e uma enorme quantidade de correspondências não lidas e, ainda, papéis avulsos, catálogos, memorandos, pequenos objetos inúteis; enfim, um caos…
É impossível se comunicar com um protelador, ele nunca está, e se solicitamos que nos dê um retorno telefônico, esperamos em vão. Também não adianta recorrermos desesperadamente à Internet, seu e-mail sempre volta, pois ele nunca confere seu correio eletrônico.
O seu comportamento é repetitivo e inalterável, jamais podemos contar com sua atenção, principalmente nas urgências, dando-nos a impressão, com ares de mistério, de que vive muito ocupado. Em reuniões, chega atrasado, é sempre notado e esperado, o que lhe dá uma satisfação narcísea, base de sua personalidade em desajuste.
Confiança legítima jamais terá de seus pares. Sofre assim de solidão e, se demitido, suas chances de ser novamente empregado são ínfimas, pois no mundo atual, o que mais se exige é habilidade para resolver rapidamente os problemas sem burocracia.
A protelação é um mal que atinge o que há de mais vital do ser humano, a esperança. Corrói as expectativas com a morosidade do tempo estéril e de quem espera ansiosamente e depende do protelador. Quando solicitado que responda a um pedido de alguém, na maioria das vezes, não diz sim nem não, apesar de saber que, muitas vezes, a resposta será negativa, ele retarda e procrastina o retorno ao outro, deixando-o “seco” na condição de dependente de sua resposta.
A procrastinação habita preferencialmente os cargos burocráticos inertes e autoritários do poder público e privado, longe do alcance da democracia. Usura, sovinice e avareza são três palavras sinônimas para expressar a secura da alma do protelador.
A insônia é um mal comum nessas pessoas, sendo freqüente o acordar de madrugada após pesadelos medonhos, “como se a cabeça estivesse na gaveta do escritório”, com enorme aflição pelos projetos adiados.
Antes que esse mal nos acometa, urge, portanto, cuidarmos para sairmos na inércia, adquirirmos competência e redefinirmos a relação com os outros, conquistando mais liberdade para caminhar e crescermos profissionalmente e, assim, retirarmos os atrasos das gavetas, explicitarmos a “bagunça por sobre as nossas mesas” e resolvermos os problemas em tempo hábil.
Fonte: Revista Shalom Maná
Paulo César de Souza
Formação 2002