Formação

“Bendita és tu que creste!”

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“Zacarias! Zacarias!”, grita José ao aproximar-se da casa. O velho sacerdote aparece à porta e saúda o pequeno grupo com gestos de alegria e acolhida. José, espantado ao perceber sua mudez, tenta entender o que lhe acontecera. Zacarias faz sinal para que entrem e, batendo palmas, chama a atenção de um vizinho que aproxima-se para explicar tudo.

Ligeira, Miryam corre até onde está Elisabete, sentada a fiar no pátio da casa.
“Shalom, Elisabete!”, disse Miryam, de mansinho, para não assustar a prima grávida, já pesada.
À suave saudação, Elisabete responde com um grande grito, assustando Miryam:
“Miryam! Miryam!…”
E levantando-se, apressada:
“Quem sou eu para que me visite a Mãe do meu Senhor?”
E, sem conter-se, sem deixar Maria falar:

“Tu és bendita mais do que todas as mulheres!” Prostra-se, como pode, diante da prima, emocionada:
“Bendito é o fruto do teu ventre!… Bendito é o fruto do teu ventre, Miryam!”

Surpresa, Maria apressa-se em levantar Elisabete. As duas, rindo e chorando, abraçam-se várias vezes. Loucas de alegria, choram e riem, riem e choram, abraçam-se e se distanciam para se olharem melhor e, depois, abraçarem-se de novo.

Elisabete, olhos brilhantes, marejados de alegria, rosto cheio de luz e graça, finalmente pára e acaricia suavemente o rosto de Miryam, agora feliz por poder refulgir toda a sua beleza. Contempla-a e repete, mergulhando no mistério:

“Como me é dado que venha a mim a Mãe do meu Senhor?”
Iluminada pelo Santo Espírito, tomada pela alegria da salvação, faz, novamente, sua pergunta:
“Como me é dado que venha a mim a Mãe do meu Senhor?”

Miryam ri e a beija. Preocupada com a gravidez da prima, tenta, em vão, fazê-la sentar-se:
“Quando tua saudação de Paz, teu doce “Shalom” chegou aos meus ouvidos, daí penetrou em todo o meu ser e eis que a criança saltou de alegria em meu seio!” e, tomando a mão de Miryam coloca-a sobre o próprio ventre. Maria pode sentir os pezinhos a saudá-la, a saudar Yeshuah, a Salvação. Quanto mais as mãos de Maria acariciam o ventre de Elisabete, mais João chuta, “anda”, mexe, vigoroso, apressado. E quanto mais ele mexe, mais Maria ri e ri. Pura felicidade.

Elisabete joga-se nos braços de Miryam e fica ali longo tempo. Faz-se um silêncio infinito. Ambas sorriem, abraçando o mistério. Finalmente, Elisabete olha Miryam no fundo dos olhos e exclama, concluindo a confirmação daquilo que, aos homens, era impossível:

“Bendita és tu que creste!” E, segurando suavemente o rosto de Maria com as duas mãos:

“O que te foi dito da parte do Senhor se cumprirá!”

Miryam sente suas entranhas alargarem-se infinitamente, abrangendo, acolhendo o passado, o presente, o futuro, o céu e a terra, o tempo e a eternidade, o mundo visível e o invisível. Seus braços abrem-se, erguem-se, seu ser inundado de imensa, indizível alegria. E ela, buscando o canto não expresso da ishah, repetindo o riso feliz de Sara, ecoando a voz agora firme de Ana, o amor corajoso de Débora, o júbilo humilde de Judite, a vitória paciente de Ester, a fidelidade ungida de Rute, prorrompe em canto e dança que jamais se repetirão:

“Ah, Elisabete! Elisabete! Adhonay, Elisabete, Adhonay fez em mim o impossível! Minha alma está cheia de alegria, transborda de felicidade! Haverá felicidade igual à minha? Sim, a mim me resta o louvor, a exaltação, a exultação, o júbilo, a gratidão ao Eterno que me escolheu, ao Todo-Poderoso que me preservou, a Adhonay que me salvou!

Minha alma exalta o Senhor! Meu espírito se enche de júbilo por causa de Elohim, meu Salvador! Ele pôs os olhos sobre mim, a sua humilde serva, por pura misericórdia me elegeu, me preservou! E por isso, doravante todas as gerações me proclamarão feliz, bem-aventurada! …
Sim, porque o Todo-Poderoso fez por mim o impossível! Maravilhas fez em mim o Senhor! Santo… Santo… Santo! Este é o seu Nome! Só Ele é bom e sua bondade se estende de geração em geração sobre aqueles que o temem! Sua misericórdia é eterna! Sua misericórdia alcançou-me! Sua misericórdia criou-me! Sua misericórdia cumulou-me do Sumo Bem!

Ele interveio com toda a força de seu braço! Dispersou os homens de pensamento orgulhoso! Precipitou os poderosos de seus tronos…” e, com os olhos cheios de lágrimas, olhando os olhos molhados de Elisabete:
“… e exaltou os humildes, os pequenos… exaltou-me… a mim, a menor!”
Depois, como se visse uma multidão imersa no Kairós:
“Os famintos, Ele os cobriu de bens, e os ricos …” parou, com certa tristeza, para depois concluir, pronta para a misericórdia:
“…os ricos, despediu-os de mãos vazias.”
Em seguida, olhando a prima, rosto já marcado por rugas, esposa de um sacerdote que aguarda, paciente, o tempo favorável:

“Veio em socorro de ti, Israel, seu servo, lembrado de Sua bondade, como dissera aos nossos pais, Elisabete, em favor de Abraão e de sua posteridade para sempre!”
Miryam dança e dança, cheia do Espírito, ora em silêncio, ora cantando, ora dizendo muitas outras coisas que Elisabete não consegue entender, ora repetindo partes do seu cântico e, nele, muitos outros cânticos de muitas outras mulheres de Israel cuja fé havia preparado este dia.
“Simples, transparente, luminosa, cheia de graça, a Mãe do meu Senhor!”, admira-se Elisabete, agora sentada, em silêncio. “Uma criança, uma menina, uma belíssima menina! Uma mulher única, uma inigualável mulher, esta Mãe do meu Senhor!”

Sempre silenciosa, acolhe o abraço da Mãe que, ofegante da dança, senta-se aos seus pés, reclina a cabeça sobre o seu ventre, a sentir o carinho, agora suave e calmo, das mãozinhas, dos pezinhos, do rostinho de João que, nela, adora o Filho.

Lá fora, continua a “conversa” de José e Zacarias, os dois eleitos que têm em suas mãos a responsabilidade de velar sobre o cumprimento das promessas dos profetas, escondidas, dois meninos, no doce calor do ventre das duas esposas.


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