Contar uma história não é fácil. É preciso muito talento, imaginação, conteúdo e até uma certa técnica teatral para que seja possível prender a atenção de um ouvinte por muito tempo. No meu caso, quem me conhece sabe que o bom humor e o velho “exagero” cearense são elementos base para as minhas histórias. Quando se trata de escrever um livro, então, é necessário um talento maior ainda, para que o escritor não caia na superficialidade nem se torne prolixo, e continue a prender a atenção do leitor até a última página.
Com o passar dos séculos, este desafio de escrever vem se tornando cada vez mais difícil, pois a competição com filmes, séries, games, redes sociais, vídeos etc. é muito acirrada. Quando se trata da internet, o que vemos é que existe uma crescente linguagem digital que privilegia demasiadamente a rapidez da informação e acaba substituindo palavras e frases inteiras por símbolos e abreviações.
E isso é bom ou ruim? Digamos que é amoral. O problema é o mal costume gerado pela quantidade excessiva de horas que se passa no ambiente digital, onde tudo acontece em milésimos de segundos. Quando se retorna para a vida real, todas as coisas parecem lentas demais ou até uma grande perda de tempo.
Nesta perspectiva, o que dizer, por exemplo, de uma história que se passa em um tempo no qual a energia elétrica não existia, o sistema de comunicação mais eficaz eram os mensageiros que iam a pé ou a cavalo entregar as cartas escritas à pena tinteiro e o meio de transporte mais moderno era a carroça?
Trata-se do ótimo romance histórico/religioso intitulado “As Fundações” de Santa Teresa de Ávila, escrito em 1573, em pleno Século de Ouro Espanhol, período que representou o auge da cultura clássica da Espanha. O livro é o relato de Teresa a respeito de suas aventuras pelas estradas do País, nas quais a santa deixava a segurança do convento onde vivia para fundar outros mosteiros da Ordem Carmelita em várias regiões.
As narrativas de Teresa são o resumo dos vinte impressionantes anos que dedicou às fundações de novas casas para religiosas e revelam uma personalidade decidida por fazer a vontade de Deus, capaz de enfrentar desde as intempéries do clima europeu até enfermidades e assaltantes, e tudo isto utilizando-se apenas de um desconfortável e lento coche como meio de transporte.
A linguagem utilizada é capaz de segurar o leitor na trama e consegue balancear bem os momentos dramáticos e as situações cômicas, sem perder o profundo cunho espiritual da história. Resumindo, este é um livro que vale muito a pena ser lido, pois possui uma qualidade literária excelente e, acima de tudo, ajuda também a crescer na “determinada determinação” necessária para seguir a missão particular que cada um possui, seja como religioso, leigo ou consagrado.
Particularmente, a experiência que tive ao ler “As Fundações” foi como ser transportada para a Idade Média, com todas as suas edificações, personagens e outras realidades que a santa tanto soube registrar em sua obra e que a torna este tesouro de imenso valor histórico, cultural e espiritual para a humanidade.
E não me venha com a desculpa que não tem tempo para ler, afinal, se Santa Teresa, naquela época, encontrou tempo para fundar tantas casas missionárias, viajando por toda a Espanha em uma charrete, quanto mais nós, que economizamos tantas horas com transportes e meio de comunicação tão velozes, se soubermos administrar o nosso dia, com certeza encontraremos tempo para ler não só a dica desta semana, mas até todas as obras desta maravilhosa autora.
Ficha
Autor: Frei Patrício Sciadini
Editora: Shalom
Idioma: Português
Páginas: 370
Ano: 2011