Formação

Com alegria anunciar

“Somos inflamados pelo Espírito para anunciar a boa notícia do Evangelho” Revista Escuta 2022

comshalom

Quem nunca se sentiu tocado por aquele pregador, professor, ou simples testemunhante, que ao começar a sua fala, diz com tom pesaroso, suavemente melancólico e aquela cara de nada, ou, não raras vezes, fechada, de poucos amigos (e muitos inimigos), que era uma “alegria estar ali naquele momento” para falar para a sua plateia?

>> Acompanhe a Comunidade Shalom no YouTube

Tocado por uma vontade burlesca de rir, ou por um indiscreto pré-juízo de que, talvez, lá no fundo, aquela pessoa está qualquer outra coisa, menos feliz? Pois bem, esta sensação de incomodo vem do fato de que é impossível anunciar a posse de algum bem sem alegria. Sem alegria não há anúncio!

Alegria de anunciar

Santo Tomás de Aquino ensina que a alegria é a paixão que se dá na pessoa que alcança a posse de um bem anteriormente desejado, amado, isto é, “o prazer que acompanha a razão” (São Tomás de Aquino, Suma Teológica, I-II, q. 31, a. 3). De modo que o anúncio de qualquer bem possuído não pode ser feito de outra forma senão cheio de alegria e de fervor, pois quem possui o que ama é feliz. Ora, se isto é válido para qualquer “bem”, quanto mais não o seria para o anúncio de Cristo, nosso Bem Supremo?

O mandato missionário de Cristo conferido aos seus apóstolos e à Igreja “está ainda bem longe do seu pleno cumprimento” (São João Paulo II, Redemptor Missio, 1), apesar de sua realização constituir “o primeiro serviço que a Igreja pode prestar ao homem e à humanidade inteira” (São João Paulo II, Redemptor Missio, 2). Por isso, para recordar-nos de sua importância, desde 1926, com a instituição do terceiro domingo de outubro como o Dia Mundial das Missões, a Igreja celebra de modo especial o mês de outubro como mês das missões. E ainda que já estejamos no final do mês missionário, vale a pena, parar um pouco para refletir sobre esta atividade essencial da vivência cristã que não pode ser feita de qualquer forma, especialmente, sem alegria.

De fato, toda experiência de Deus é envolvida pelo mistério da missão. Desde os primeiros discípulos que foram diretamente chamados por Cristo (cf. Mc 16, 15-18), até os atraídos por Ele através do anúncio de outros ( “Eis o Cordeiro de Deus” – cf. Jo 1, 36), todos que verdadeiramente se encontram com Ele são inseridos num estado de missão, porque é próprio de quem encontrou um bem, alegrar-se e desejar comunicá-lo aos demais.

Desejo de anunciar

“Quem ama, põe-se em movimento, sente-se impelido para fora de si mesmo” (Papa Francisco, Mensagem para o dia Mundial das missões de 2019). Foi desta experiência que nos chegou o brado de São Francisco : “O amor não é amado!”, que para nós, Shalom, ganha um tom especial neste tempo.

No retiro de Escuta do Conselho Geral da Comunidade neste, o Senhor deu a imagem da estigmatização de São Francisco no monte Alverno. Naquele momento, o amor de Jesus a Francisco era experimentado e correspondido pelo santo no mais alto grau.

Leia também|  Shalom 40 anos: tempo de voltar para a origem da Vocação 

A compaixão de São Francisco pelo Cristo fora tão forte que o próprio Deus veio ao seu encontro, imprimindo-lhe a imagem do crucificado, agora já não mais “escupida em tábuas de pedra ou de madeira pela mão de um artífice, mas desenhada nos membros do corpo [do Santo] pelo dedo de Deus vivo” (São Boa Ventura, Legenda Maior, cap. XIII, nº 5).

Em Francisco, o desejo de consolar o Cristo sofredor se encarnou numa via dupla: no amor direto a Cristo na oração, e no amor a Cristo no homem ferido. É nesta via da compaixão que o Senhor que nos inseria neste tempo, neste estado de missionariedade.

Para vivermos isto o Senhor nos dava o Espírito Santo. É o Espírito Santo, amor do Pai e do Filho, que nos impele (cf. II Cor 5,14), e nos impele a uma oferta total. O Senhor, nesta mesma Escuta, convidava a Comunidade a uma oferta total. Recordo uma fala de nosso fundador que dizia que quando pedimos pouco ao jovem, ele não dá nada; quando pedimos muito, ele dá pouco, mas quando pedimos tudo, ele dá tudo, porque é próprio do jovem (e de todo homem) o desejo da totalidade.

É o Espírito Santo que nos conduz a esta compaixão pela humanidade, vinda do amor a Cristo, que nos leva a esta oferta total de amor. Deus sabe cancelar todas nossas resistências e reservas na doação.

Disponibilidade, alegria e gratidão

Este estado de missionariedade, para mim, de modo bem pessoal, é traduzido na disponibilidade, alegria e gratidão. Apesar das minhas muitas limitações e pecados, a bondade e a generosidade de Deus sempre me chamaram muita atenção, a ponto de desejar expressar, dentro do possível, um pouco destes bens que recebo de Deus. É como se ecoasse dentro de mim o dever de gratidão de me fazer “tudo para todos”, em resposta Àquele se deu inteiramente a mim.

Na casa de formação, certa vez, um formador contou da experiência de que quando chegava cansado, no final do dia, em casa, perguntava a Deus se não teria algo a mais que Ele desejaria que fizesse, e muitas vezes chegava-lhe um outro pedido, outra pendência, necessidade, e nestas pequenas coisas via a ação de Deus. Esta experiência me acompanhou desde então e muitas vezes me fez perguntar: Senhor, será que não posso ir além? Ao final, “um coração inflamado por este amor, tudo realiza e a tudo se dispõe”. Sou um pouco metódico, pragmático, mas o Espírito Santo vive quebrando os meus esquemas, dispondo-me a uma oferta que me supera. O resultado final é sempre positivo quando não lhe resisto.

Quando nos ofertamos por amor, desde dentro, comunicamos, sem perceber, o amor de Cristo que nos alcançou. Não é pesaroso. Não é cansaço vão. Não é morte que nos destrói.

Na verdade, é vida que nos recria, ainda que o corpo venha a definhar-se (cf. II Cor 4). O mês de missionário se encerra com a celebração imediata de todos os santos. O grande fruto da missão é a santidade! Possamos todos, com a graça do Espírito Santo, cheios de amor pelo Cristo, sermos novamente enviados em missão, rumo ao homem que sofre, sermos resposta de gratidão ao amor que recebemos de Deus, e como fruto desta oferta de amor, alcançar a santidade! São Francisco interceda por nós.

Que Nossa Senhora, Esposa do Espírito, Toda Pequena, nos acompanhe e abençoe!

Daniel Pereira da Silva Junior
Consagrado Comunidade de Vida
Seminarista, 2° ano de Filosofia
Assistência de Formação


Comentários

Aviso: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião da Comunidade Shalom. É proibido inserir comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem os direitos dos outros. Os editores podem retirar sem aviso prévio os comentários que não cumprirem os critérios estabelecidos neste aviso ou que estejam fora do tema.

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *.

O seu endereço de e-mail não será publicado.