Quem tiver a infelicidade de cometer um pecado e estiver impossibilitado de confessar-se logo, terá sempre um precioso recurso para reconciliar-se sem demora com Deus. Em sua infinita misericórdia, Deus põe à disposição de Seus filhos, para sua santificação, uma incomensurável quantidade de dons e graças.
Alguns destes favores divinos, Ele os dispensa a todo e qualquer fiel. Outros, porém, em sua sabedoria, o Criador os reserva para algumas almas eleitas. É o caso do dom da profecia, do de fazer milagres e de tantos outros, concedidos apenas em determinadas circunstâncias, de acordo com as necessidades da Santa Igreja.
Alguns pensam que a esta categoria especial de dons pertence a graça da contrição perfeita. Isto não é real. Muito ao contrário, esta graça está sempre ao alcance de todos os fiéis, sem qualquer exceção. Mais ainda, ela é de fundamental importância na vida espiritual de todo batizado.
Entre os livros que tratam do tema, destaca-se o do Padre Johann Von Den Driesch, intitulado A Contrição Perfeita – uma chave de ouro para o céu. Nele, esse fervoroso sacerdote da arquidiocese de Colônia expõe a doutrina católica a respeito, com a clareza do bom pedagogo e o ardor do apóstolo empenhado na salvação das almas.
Elementos da contrição autêntica
A contrição – ou arrependimento – é a dor da alma que a pessoa sente por haver pecado; essa dor só é verdadeira quando o pecador detesta a má ação praticada e tem o propósito de não mais pecar. Por exemplo, se um ladrão se diz arrependido de um roubo cometido, mas não tem horror ao crime em si, nem faz o propósito de se corrigir, não se pode afirmar que esteja contrito.
Para ser autêntica, a contrição precisa ser interna, ou seja, provir de fato da alma, não pode reduzir-se a meras palavras pronunciadas sem reflexão.
Deve também ser geral, isto é, abranger todos os pecados, ao menos todos os pecados mortais. É necessário, por fim, que ela seja sobrenatural, quer dizer, que tenha por base alguma verdade da Fé: o temor de Deus que tem o direito de ser obedecido, o amor de Deus que nos ama, o desejo do Céu, o medo do inferno, etc.
Se alguém assalta um banco e depois se arrepende porque está em risco de ser preso, isso não é autêntica contrição, pois se baseia em motivos meramente naturais.
A vontade de afastar-se do pecado
Como acima dissemos, a graça do arrependimento está ao alcance de todos. Para obtê-la, basta manifestar a Deus com sinceridade de alma o seu pesar por tê-Lo ofendido e o firme propósito de não tornar a pecar. “A essência da contrição está na alma, na vontade de afastar-se deveras do pecado e converter-se a Deus”, afirma Padre Johann Von Den Driesch.
Contrição perfeita e imperfeita
A contrição de um pecador pode ser perfeita ou imperfeita, dependendo dos motivos que o levem a tê-la. A contrição perfeita procede do amor: o pecador se arrepende pelo fato de ter ofendido a Deus, infinitamente bom e digno de ser amado sobre todas as coisas.
Imperfeita é a contrição que decorre do temor: a pessoa aborrece o pecado pelo medo de perder o Céu e ser lançada no inferno. Por que é chamada de imperfeita? Porque nela o pecador toma em consideração principalmente a si mesmo, e não a Deus.
Exemplos de verdadeira contrição
Vejamos um belíssimo exemplo de contrição perfeita, tirado do Evangelho. No pátio da casa do sumo sacerdote Caifás, São Pedro negou três vezes a Jesus. Em seguida, saiu e “chorou amargamente” (Mt 26, 75).
Por que chorou São Pedro? Se fosse pelo fato de passar vergonha diante dos outros apóstolos, seria uma dor meramente natural, não existiria verdadeira contrição. Se fosse por medo de ser excluído do Reino de Cristo, ele teria uma contrição autêntica, mas imperfeita.
Ele chorou, porém, por um motivo muito elevado, como diz o Padre Von Den Driesch: “Pedro arrepende- se e chora, antes de tudo, porque ofendeu a seu amado Mestre, tão bom, tão santo, tão digno de ser amado […]. Tem, pois, verdadeira e perfeita contrição”.
Os Evangelhos nos narram mais um magnífico exemplo de contrição perfeita: o da pecadora que se prostra aos pés de Jesus, banha-os com suas lágrimas, enxuga-os com seus cabelos, beija-os e, por fim, os unge com perfumes. E o Divino Mestre declara que “seus numerosos pecados lhe foram perdoados, porque ela muito amou” (Lc 7, 47).
Contrição perfeita e confissão
Que pela contrição perfeita o pecador obtém o perdão dos seus pecados antes mesmo de confessar-se é doutrina afirmada no Concílio de Trento (14ª sessão, cap. 4). Entretanto, adverte o mesmo Concílio, ela não dispensa o pecador da necessidade de acusar-se de todos os seus pecados mortais no Sacramento da Confissão e de receber a absolvição do ministro de Deus. De modo que no próprio ato de contrição perfeita deve estar incluído o propósito de confessar-se.
Quanto tempo depois? É pelo menos muitíssimo aconselhável confessar- se logo que possível.
“Mas é tão difícil ter contrição perfeita!” – poderá alguém pensar. Puro engano! Para dar-nos essa graça, Deus exige de nós uma atitude bem ao nosso alcance: desejá-la realmente e pedi-la com insistência.
O Padre Johann von den Driesch sugere, entre outras, esta curta oração: “Senhor, dai-me a graça do perfeito arrependimento, da perfeita contrição dos meus pecados”. A quem assim pede, com boa vontade e de coração sincero, Deus não deixará de atender.
Efeitos da contrição perfeita
São maravilhosos os efeitos e benefícios que a contrição perfeita nos obtém.
A quem é pecador, ela perdoa imediatamente os pecados cometidos, devolvendo-lhe a graça santificante pela qual ele volta a ser filho de Deus, livrando-o das penas do inferno e restituindo-lhe os méritos perdidos.
Dir-se-á, então, que a contrição perfeita beneficia apenas a quem cometeu pecado mortal. Não é verdade, pois ela robustece o estado de graça naqueles que não o perderam. Cada ato de contrição perfeita aumenta o grau da graça santificante em nossa alma, tornando-a mais formosa aos olhos de Deus!
Eis aí, leitor, um imenso dom que Deus deixou ao nosso alcance. Saibamos bem aproveitar esta dádiva celeste, procurando fazer diariamente muitos atos de contrição perfeita. Pois, além dos benefícios enumerados acima, quem se habitua a fazê-los com frequência os repetirá, por assim dizer, instintivamente na hora da morte.
Portanto, uma prática benéfica também nos casos de pecados veniais, ou até mesmo quanto às imperfeições. Saibamos aproveitar a imensa bondade do Criador que nos dá essa misericordiosa oportunidade de nos apresentarmos diante dEle inteiramente limpos de pecado!
- Driesch , Johann Von Den. A Contrição Perfeita – uma chave de ouro para o céu, Tip. São Francisco, Bahia, 1913.
- Cf. DENZINGER – HÜNERMANN, n. 1677.