Deus me fez homem e junto com essa eleição existe um chamado, uma resposta que Ele espera de mim. Uma das respostas que preciso dar com o meu ser homem é o meu chamado à paternidade espiritual.
O primeiro local que o homem é formado para acolher, responder e crescer sua identidade é dentro de casa, na igreja doméstica, onde o Pai é o referencial de homem, encontrando nele abrigo, segurança e consolo.
Referencial de homem
Meu pai foi um grande exemplo para mim de homem que acolhe sua esposa, seus filhos, sua situação financeira, sua realidade como um todo e busca crescer e dar o melhor para a esposa e os filhos.
Retirávamos nossa fonte de renda de um comércio que meu pai tinha e me recordo das idas dele em todos os turnos, bem como dos investimentos que ele realizava para tornar mais lucrativo aquele negócio, tudo para proporcionar para nós um bom estudo, uma boa alimentação e uma vida saudável.
Outra característica muito forte do Seu Régis era o seu carinho e proximidade conosco, sua família. Costumamos dizer que ele “fazia tudo por nós”. Admito que não consigo contar tantas vezes que eu ficava doente, me sentia mal durante a noite e ele sem pestanejar me levava para Sobral para me consultar. Minha mãe sempre me disse que quando eu era criança, meu pai não conseguia dormir enquanto eu estivesse com febre ou outra enfermidade, sinal de um homem que realmente assumia seu papel de Pai e zelava pelos filhos que Deus lhe deu.
Quanto à educação, tive aquele pai que pelo simples olhar formava, exortava e repreendia. Logo, meu pai era muito “esquentado” (inclusive puxei essa característica dele), mas ele sabia resolver os problemas de casa dentro de casa, sem fazer escândalo ou cena na rua. No mesmo contexto, sempre admirei a característica do Seu Régis de me mandar sentar para “termos uma conversa”, para saber “o que eu estou fazendo da vida”, para me dar um “choque de realidade”. Entretanto, admito que, como jovem teimoso, deveria ter escutado mais, mas, ainda assim, eu saía muito questionado desses momentos.
Ser o pai do meu pai
Em 2016, depois de um tempo com alguns desmaios e queda de pressão, meu pai foi diagnosticado com câncer, linfoma de não-Hodgkin, e no mesmo ano, em 06 de dezembro, fez sua páscoa. Nesse período, eu tive que, com 21 anos, ser o “pai do meu pai”. Vivi antecipadamente a experiência de cuidar do meu pai, de tentar retribuir em 08 meses o amor e carinho que ele me deu por 21 anos. Admito que falhei nisso, pois não se compara a todo tempo que ele se dedicou a mim.
Me recordo que um dos grandes presentes que Deus me deu foi uma “última conversa” com ele. Meu pai estava sedado, mas consciente, e lá naquele momento tive a oportunidade de agradecer pelo pai espetacular que ele foi para mim, pedir perdão pelo filho teimoso que fui e dizer que ele podia ir em paz que eu cuidaria da nossa família. Obviamente, lágrimas não me faltaram.
Paternidade Espiritual
Assim, foi a partir desta responsabilidade que tive que ter para cuidar do meu pai que fui me abrindo a paternidade espiritual que Deus pedia de mim. Inicialmente, com minha família. De fato, cuidar da minha mãe, dos meus irmãos e dos outros familiares que necessitam. Logo, essa experiência foi muito forte quando meu avô paterno ficou doente e acamado em 2018/2019, entendi que era minha responsabilidade cuidar, me dedicar e dispor do meu tempo para ajudar nos cuidados dele.
Outra paternidade espiritual que precisei assumir na minha vida foi a que adveio da minha consagração de vida na Comunidade Católica Shalom. Assumi os filhos que não tinham uma ligação sanguínea, mas eram ligados pela eucaristia, pelo mesmo carisma. A primeira experiência que eu tive foi a de exercer o serviço de coordenador da irradiação de Massapê, cidade que atualmente resido. Desse modo, aprendi empenhar o meu tempo e a minha vida em vista da obra que Deus queria realizar nesta cidade, a cuidar dos membros da obra e os da comunidade também, a renunciar meus momentos de descanso para aprender a descansar em Deus, descansar na vinha, sabendo que quando eu cuido do outro, Deus cuida de mim.
No mesmo contexto, em 2019 recebi a missão de ser formador pessoal, um orientador espiritual para ajudar os membros da comunidade a trilharem o caminho de santidade que Deus nos chama. Logo, nesse serviço tenho a experiência de ser “o meu pai” para os formandos da comunidade, ou seja, de ensinar, exortar, educar, auxiliar e, principalmente, apontar o céu como caminho certo de felicidade. O que o pai pode dar para um filho melhor do que o céu? Nada. E é nessa certeza que peço a Deus a graça de a cada dia ser ungido para poder, não obstante as minhas fraquezas, ajudar os meus formandos a serem santos. Da mesma forma que meu pai gastava turnos e turnos de trabalho para nos alimentar materialmente, eu me sinto chamado a gastar meu tempo para, pela graça de Deus, alimentar meus filhos espiritualmente, amando, cuidando e, quando preciso for, exortando.
O Senhor me ajuda quando eu cuido dos meus filhos.
De fato, é da vontade de Deus esta missão de formador, pois por muitas vezes vejo meus formandos trazendo realidades que eles enfrentam para serem fiéis aquilo que Deus nos chama, à santidade, porém são realidades que eu mesmo luto, que eu mesmo ainda não encontrei uma “solução”, mas é aí que vou entendendo que a solução para enfrentar minhas dificuldades é, cheio da graça de Deus, lutar contra os pecados, numa vida ascética. Assim, vou entendendo que, verdadeiramente, o Senhor me ajuda quando eu ajudo/cuido dos meus filhos. É uma belíssima sabedoria, pois aí entendemos que o amor é doação, é gastar a vida, o tempo em vista do outro e também é ai, na minha família e na minha missão de formador pessoal, a escola que Deus me dá caso um dia venha a ser Pai biológico também.
Por Régis Filho Albuquerque – Consagrado da Comunidade Aliança Shalom (Missão Sobral -CE)