1. Definição de Cumplicidade (Cat 1868-1869)
Por cumplicidade entendemos aqui o auxílio que alguém presta à realização de um ato mau que outra pessoa resolveu executar. Distinguimos entre cumplicidade formal e cumplicidade material.
1.1. Cumplicidade Formal
Esta consiste em colocar-se diretamente a serviço do mal, seja porque o cúmplice quer o pecado alheio, seja porque lhe presta uma colaboração que, por sua índole mesma, significa aprovação desse pecado.
A cumplicidade formal é sempre pecaminosa. Será mais ou menos grave de acordo com o tipo de pecado para o qual ela contribui e a importância de tal colaboração. A título de exemplo, seja citado o caso da enfermeira que colabora diretamente para a realização de um aborto; ainda que não tenha a intenção de contribuir para um pecado, a sua participação no abortamento é, por sua índole mesma, pecaminosa (não basta não ter a intenção de não pecar para que não haja pecado, se a ação como tal é pecaminosa). Outro exemplo é o do policial a quem mandam que aplique tortura a um prisioneiro; não pode eximir-se de responsabilidade, alegando que não age por própria iniciativa, mas apenas executa ordens superiores.
1.2. Cumplicidade Material
A cumplicidade material é um ato moralmente bom ou indiferente do qual alguém abusa, fazendo-o servir ao pecado. Quem é cúmplice nestas condições pode não saber das intenções alheias. É o caso de quem vende uma arma de caça (ação que em si não é pecaminosa) a alguém que vai utilizar-se dela para cometer um assassínio. É também o caso de quem ajuda a transportar objetos roubados, julgando que pertencem legitimamente à pessoa solicitante (e imaginando mesmo estar realizando assim um ato de caridade).
2. Moralidade da Cumplicidade Material
O cúmplice que ignora por completo as intenções do seu parceiro e age de boa fé, está isento de culpa.
Há casos, porém, em que o cúmplice pode prever o mau no uso do seu serviço, ou suspeitar dele porque conhece o parceiro e o seu procedimento habitual ou porque anteriormente já fez experiências semelhantes. Em tais circunstâncias, a pessoa chamada a colaborar deve ponderar a sua cooperação:
– Se a sua ação tiver uma finalidade boa, independente do pecado do parceiro
– Se o bem visado pelo cúmplice compensar o mal ou o pecado do parceiro.
– Se a intenção do cúmplice for voltada tão somente para o bem
– Se não houver como evitar esse tipo de colaboração.
A matéria é muito complexa, pois são freqüentes os casos de colaboração na sociedade moderna.
Essa finalidade boa não pode ser simplesmente o desejo de lucro, ou o receio de prejuízos materiais.
Se alguém aluga um apartamento ou um quarto a um cliente cujas intenções desonestas (adultério, prostituição …) lhe são conhecidas, peca gravemente. Verdade é que quem aluga pode geralmente presumir bom uso do apartamento mas, no caso em foco, as más intenções do locatário são patentes, o que implica na obrigação de não alugar.
Quanto mais diminui a iniciativa pessoal, tanto mais diminui também a cumplicidade propriamente dita. Tais são os casos da datilógrafa que, entre outras coisas, bate faturas fraudulentas (que ela não pode identificar claramente); o do gráfico que contribui para imprimir páginas, às vezes, pornográficas (que ele não reconhece bem); … o do funcionário de balcão que faz pacotes de mercadorias que ele mal conhece …
Quem presta colaboração material a uma empresa desonesta para poder ganhar seu pão, não tem a obrigação de abandonar imediatamente a empresa (o objetivo de sobrevivência justifica a sua permanência na firma), mas deve, sem demora, procurar outro emprego ou meio de subsistência.
Pode-se admitir que alguém colabore materialmente com pessoas desonestas se tem em mira exercer sobre elas uma influência sadia e transformadora (esta finalidade boa compensa os males que indiretamente decorrem da colaboração).
A um católico não é lícito ser testemunhas do casamento civil de dois católicos divorciados que contraem novas núpcias. Far-se-ia cúmplice de um ato que a consciência católica não aprova.
3. Definição de Escândalo (Cat 1938, 2282s, 2326, 2353s, 2489)
A palavra grega “skándalon” significa “pedra de tropeço”. Na linguagem teológica designa toda palavra ou obra capaz de tornar-se para outrem ocasião de ruína espiritual. Jesus Cristo mesmo censurou severamente a prática do escândalo (cf. Mt 18,6s).
Entende-se por escândalo toda palavra ou ação, contrária à caridade, que cria perigo de pecado para o próximo, seja por intenção de prejudicá-lo, seja para atender a interesses particulares.
O ato em si pode não ser “mau”, mas se sua aparência for “má” deve ser evitado, segundo o conselho de Paulo: “…tomai cuidado para que essa mesma liberdade, que é vossa, não se torne ocasião de queda para os fracos” (Rom 8,9).
Podemos classificar o escândalo como intencional ou não intencional, isto é, quando é premeditado e quando ocorre por negligêcia. As palavras de Cristo nos advertem contra tal perigo: “Desgraçado do mundo que causa tantas quedas! decerto, é necessário que haja escândalos, mas ai do homem por quem acontece a queda!” (Mt 18,7).
4. A Moralidade do Escândalo
O escândalo quando premeditado é pecado grave, haja vista os textos do Evangelho que o condenam: Mt 18,7-9. S. Paulo também o reprova (1Cor 8,12s; Rm 14,15). O fato de que a vítima não se tenha deixado seduzir para o mal não diminui a gravidade do pecado. Mesmo que alguém só procure seduzir para um pecado leve, pode estar cometendo pecado grave, especialmente se o sedutor é uma pessoa que, por seus encargos, deveria levar os outros à prática do bem.
Entre as maneiras de dar escândalo, está o mau exemplo. Alguém pode induzir os outros ao mal mesmo sem falar, mas simplesmente cometendo pecados. Tal comportamento pode ser contagioso, pois os exemplos arrastam e podem alastrar-se de pessoa a pessoa ou de grupo a grupo, causando danosa degradação de costumes. Sabe-se que a tibieza de vida e a mediocridade dos cristãos, especialmente daqueles que têm mais responsabilidade, vêm a ser grandemente prejudiciais para a sociedade eclesiástica e para o foro civil. De resto, a má conduta de alguém tem suas raízes em pecados internos dessa pessoa; são estes que remotamente preparam o escândalo – o que exige sempre a conversão do sedutor.
Existe grave obrigação de reparar o escândalo. Quem o provoca deve procurar deter a má influência desencadeada e restaurar os valores lesados, na medida do possível.
Como já foi dito, há escândalos que decorrem de ações que em si não são moralmente pecaminosas. É lícito promover uma ação benéfica, mesmo com risco de escândalo, desde que se cumpram as condições para exercer uma causalidade com duplo efeito: assim, por exemplo, quem, levado por espírito apostólico, deseja trabalhar na recuperação de pessoas entregues à prostituição, estará exercendo uma atividade que poderá ser mal entendida; todavia esta será legítima se for isenta de pecado, visto que o bem a ser atingido será muito mais vultuoso do que os males eventuais.
O escândalo dos fracos deve-se à simplicidade da pessoa que se escandaliza. É necessário evitá-lo, tanto quanto possível, ainda que a custo de sacrifícios por parte da pessoa tida como escandalosa. O próprio Cristo assim procedeu: (cf. Mt 17,24-27).
5. O Cristão e o Problema do Escândalo
Em nossos dias a consciência de muitos cristãos pode estar confusa e com a responsabilidade atenuada por causa das numerosas opiniões correntes sobre certos pontos de Moral: o aborto, os métodos de contracepção, de controle da natalidade, a masturbação, etc. É preciso que haja quem dissipe a perplexidade e as atitudes errôneas decorrentes de tal multiplicidade de “sentenças”.
São Paulo considerou o caso de cristãos que, tendo a consciência mal formada, julgavam que não era lícito comer carnes imoladas aos ídolos (o que, na verdade, não era pecado); declarava, em conseqüência, que preferia abster-se de tais alimentos (renunciando a um direito seu) a escandalizar irmãos, pelos quais Cristo morreu; (cf. I Cor 8,7-13; Rm 14,19-21). Fica claro que os cristãos mais esclarecidos têm a obrigação de procurar instruir os mais simples a fim de que compreendam melhor o que é e o que não é pecado. A atenção para com os fracos e a reparação dos males a eles causados são deveres que se impõem ao bom cristão.
Devemos avivar o senso da responsabilidade pessoal diante dos escândalos. Não basta registrar os escândalos e lamentá-los (ou, o que é grave, comentá-los e torná-los públicos), é necessário que cada cristão lembre-se que lhe toca uma responsabilidade perante tais males; com efeito, somos todos solidários entre nós, de modo que as falhas de uns podem estar na dependência de falhas de outros e podem encontrar seu remédio na santidade de vida dos irmãos. Para frear uma tendência a comentar o mau procedimento alheio, pode-se lembrar a máxima dos antigos monges: “Quem tem um morto em casa, não o abandona para prantear o morto do vizinho”.
Denunciar os escândalos, quando necessário, não pode ser a última palavra de um programa cristão. O Senhor quer que os seus discípulos tenham uma função construtiva em relação aos irmãos, fazendo as vezes de sal da terra, luz no mundo (Mt 5,13s) e fermento na massa (Mt 13,33). Aliás, Deus só permite os escândalos para que deles saiam bem maior.
Podemos ainda falar de um “escândalo salutar”. Com efeito; a vida cristã coerente pode sacudir, abalar e “escandalizar”; a palavra do Evangelho, oportunamente anunciada, pode “assustar” os ouvintes e provocá-los a façanhas que fogem da rotina, deixando perplexos os espectadores. Nesta perspectiva, Jesus foi o grande Escândalo; a pregação dos Apóstolos também o foi (cf. I Cor 1,23). É importante considerar que neste sentido não estamos tratando de escândalo equanto pecado, mas da força transformadora da Palavra de Deus, penetrante como uma espada de dois gumes, que fere o íntimo de cada homem (cf. Hb 4,12s).
Na verdade, o cristão não pode pactuar com o mal; tem que tomar posição contrária, que por vezes pode “escandalizar”… Sabiamente dizia o Papa Pio XI: “O maior obstáculo ao apostolado é a timidez ou, antes, a covardia dos bons”, e Pio XII: “O cansaço dos bons é o grande mal da nossa época”.
É preciso, porém que os cristãos não suscitem atritos desnecessários. Saibam aguardar e aproveitar os momentos adequados para tomar a autêntica atitude frente aos males que os cercam, evitando posições intempestivas e passionais que, em vez de edificar, só fomentam os erros.
Dentro da Igreja é necessário que os fiéis saibam distinguir entre sua santidade ontológica e a fragilidade das pessoas que lhe pertencem. Se estas falham, aquela não falha, pois o Senhor lhe prometeu assistência indefectível (Mt 28,18-20). Um Cristianismo sem fraqueza humana não existe; seria um milagre, que Deus não quer fazer. “O justo vive da fé”.
Oi eu espalhei em muitos vídeos do Tik Tok para assitir a novela Jesus da Record TV e pecado? O que eu faço?
Eu estava na praia e meu pai pegou meu celular e tirou uma foto de um idoso olhando para mulheres idosas de biquini, depois ele pediu para eu mandar a foto para ele, eu estava em dúvida se aquilo ela pecado, mas acabei mandando, estou tentando faz tempo descobrir se isso foi mortal mas nao consigo discernir 😓
Olá, Ana! Conversando com sacerdotes, vimos que não se caracteriza um pecado. Uma dica: converse com um sacerdote da sua paróquia. Shalom!
Acaso seria cooperação com o mal um católico manter sua conta corrente em um banco que ano passado apoiou exposições “artísticas” escandalosas e depois de polêmicas terminou com elas, alegando na sua nota que continuaria “apoiando debates sobre diversidade”?
Olá, Gabriel! Obrigado por sua participação. Sua reflexão e questionamento são muito oportunos, se essas reflexões e debates fossem feitos de modo sério, poderíamos apoiar, o problema é que no fundo estão querendo mesmo é promover certas ideologias. O que muitas vezes chamam de debates, no fundo, são doutrinações e imposições, por isso precisamos estar de olhos bem abertos. Uma coisa é você acolher com amor e respeito uma pessoa que tem em sua vida questões e provações relacionadas à sexualidade, por exemplo, outra coisa é você promover isso. Espero ter contribuído com sua reflexão.
Me disseram quando fui confessar, que quando me fosse pedido que realizasse alguma prática ilícita dentro da empresa onde trabalho, eu não deveria me martirizar por conta disso e que deveria deixar bem claro para meu gestor que eu não compactuava com esse tipo de ação e deveria colocar tudo em sua responsabilidade. O que o padre disse tem sentido ?
Olá Guilherme, tudo bem? primeiramente obrigado por sua sinceridade. Olha só, uma coisa é o pecado do seu chefe, outra coisa é o seu pecado, isso é verdade. Porem, olha só: Mesmo no ponto de vista jurídico, você pode receber alguma punição sim. Seu chefe com certeza receberá a punição mais forte, mas você pode receber alguma sanção judicial mesmo leve. No ponto de vista religioso é mais complicado ainda. Ser cristão nessas horas é um desafio. O pecado maior é do seu chefe com certeza, mas se você sabe que está errado e faz, você também tem alguma culpa, entende? Eu, no seu lugar, procuraria outro emprego, até porque você também pode receber alguma sanção judicial se o seu chefe for preso. Mesmo que você não seja preso, seu nome ficará sujo e terá dificuldade de conseguir outro emprego. Estarei rezando por você meu irmão, Deus te ilumine!
Olá, eu estou com dúvidas por favor me respondam urgente… um dia desses eu estava em aula e uma colega minha fez uma brincadeira com outro não muito limpa, eu começei a rir e não consegui controlar o riso, eu estaria cometendo um escândalo? E se cometi eu deveria falar com todos da sala sobre isso ? Tenjo dúvida se deveria, porque a maioria não são cristãos( e os que são, são protestantes) acho muito provavel conhecendo as pessoas da sala que elas só me ignorem…e não altere o seu comportamento.
Olá, quando não há intenção, não é pecado, porém não é coerente rir de um fato onde alguma pessoa é exposta e/ou humilhada. Peça desculpa a pessoa e se reconcilie consigo mesmo, amadureça seus pensamentos e amizades.