Ao lermos o título deste artigo, encontramos um ideal que há muito vive no imaginário da população: um desejo profundo de que o governo, ou o poder, esteja nas mãos do povo, onde o governo não seja decidido por uma aristocracia, uma ‘tirania’, mas seja um instrumento universal para atingir o bem estar social. Da democracia se espera o crescimento da justiça social por meio da participação de todos, sejam homens ou mulheres, ricos ou pobres, tenham esta ou aquela ideologia. Nela, cada pessoa não seria tratada como melhor ou pior, mas como cidadã livre, capaz de escolher o que melhor define a direção a qual o governo deve seguir.
Entretanto essa definição de justiça social, ou bem comum, necessita sempre de três pressupostos básicos: o respeito da pessoa humana como tal; o bem estar social, ou o acesso da população ao necessário como comida, vestimentas, trabalho, direito de fundar um lar; paz e segurança.
Em primeiro caso, devemos entender a pessoa humana com direitos inalienáveis segundo a sua própria existência, como o direito à vida, ao livre pensamento, à possibilidade de discernir o que lhe cabe. Caso algum desses direitos e garantias fundamentais sejam feridos, o homem perde o fundamental caminho de dirigir a sua vida, de sua liberdade, e com isso o direito de escolha perante o poder, a política e o governo. Caso este mesmo homem não tenha acesso ao essencial, como comida ou educação, ficará sempre à mercê da escolha daqueles que mantêm o poder sobre tais atributos. Ficará sempre escravo da decisão de outros em um lugar onde o governo não será um instrumento de sua própria liberdade, mas ele mesmo se tornará instrumento do governo. Por fim, caso tenha sua segurança abalada, seja por pressão de grupos, pela violência comum na sociedade ou por qualquer risco à paz que esteja ocorrendo dentro da esfera política da sociedade, o homem terá abalado seu poder de participação na vida política. Ele não estará seguro de que uma decisão livre ou um posicionamento ideológico será respeitada ou atacada, ou se sua participação na vida política terá importância em um ambiente tão debilitado.
Todos esses pressupostos erguem-se como objetivo comum na construção de um país e da submissão do povo a um governo escolhido pelo mesmo, onde sempre existe a ansiedade de que o respeito ao homem, a justiça social e a paz possam ser os direcionadores do país, e que cada cidadão seja parte ativa no desenvolvimento da nação.
Ao voltar o olhar para o Brasil tem-se a sensação de que boa parte desses ideais foi perdida ou nunca fez parte da democracia instalada hoje. O povo vive uma política passiva, onde os governantes tomam quaisquer decisões sem que a população tenha consciência, a não ser quando noticiada em jornais, por interesses políticos. Essa situação se verifica na história do “nosso” país, onde temos uma república formada do governo para o povo, o que é fora do comum. O Brasil é uma nação onde se instituiu o governo sem a participação popular, formando-se o colegiado republicano através de intensas negociações e financiamento da aristocracia regional pelo governo federal durante os anos de início da república. Hoje se sofre pela herança dessa época.
Ao olhar para essa situação, busca-se uma saída para a reforma das instituições políticas, para a participação do povo nas decisões políticas e o direcionamento do estado. Nada mais justo! Entretanto deve-se sempre verificar como está sendo direcionada a participação popular, se o poder está realmente migrando de uma aristocracia, de poucos que comandam e “entendem” de política, para a população, que deseja ansiosamente poder mudar a direção tomada pelo estado. Corre-se o risco, o que já aconteceu na história do país e do mundo, de que o poder mude apenas de um grupo para outro, e que a reforma política seja uma revolução ditatorial disfarçada de mudança democrática.
Um governo, para ser governado pelo povo, deve respeitar todos os possíveis grupos que integram o seu corpo. Suas opiniões devem ser levadas em conta (desde que respeitem os princípios necessários para haver democracia, os quais já citamos). O governo não é para uma minoria ou maioria, mas para todo o povo. Dessa forma, deve-se procurar um modo de participação livre, em que cada cidadão possa escolher qual destino deseja dar ao país. Mesmo que não esteja filiado a partido político, sua escolha deve ser levada em consideração. Não podemos restringir a participação política a “esse ou àquele” grupo, apesar de estes terem extrema importância para o desenvolvimento dos institutos democráticos. Caso contrário, não viveremos uma democracia, mas uma aristocracia das minorias que terão acesso à vida político-partidária, retirando do povo o que lhe é de direito, o direcionamento livre da própria vida.
Por isso, devemos estar atentos às propostas de reforma política existentes nosso país, algumas de cunho popular, outras que visam restringir o acesso as decisões governamentais a pequenos grupos. A democracia deve permanecer sempre na mão do povo, com o governo como instrumento, nunca este último como pessoa ativa na participação política da nação, onde deverá apenas garantir o acesso de todos ao direito da cidadania. Caso exista uma inversão deste papel, o homem poderá ser submetido à escravidão de uma ditadura, sem direito ou poder de escolher o caminho que deseja para si e para seus filhos.
Aproximam-se as eleições. Tenhamos a consciência de que nossas escolhas são o modo como nos relacionamos com nossa própria existência, isto é: penso, encontro a verdade fundamentada em meus valores e ajo. Não nos limitemos à imparcialidade mas, como homens livres, possamos exercer nosso direito, nosso poder e, assim, participar da criação do futuro do nosso país. Votar é preciso!
Rafael Rosemberg