Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer
Arcebispo metropolitano de São Paulo
Por ocasião da 12ª Assembléia Geral do Sínodo dos Bispos, em Roma
Tenho a certeza que será um documentode grande repercussão. Uma mensagem breve, porém, já será emitida nofinal dos trabalhos sinodais, que serão encerrados no domingo, dia 26de outubro, com a concelebração da missa do papa junto com os padressinodais, na basílica de São Pedro. Houve insistência sobre algunstemas nas intervenções dos participantes do Sínodo. Um desses temas foio da “revelação divina”, fundamental quando se trata do caráterreligioso da Sagrada Escritura e de sua relação com outros livros desabedoria humana.
A revelação é uma ação divina, mediante a qual Deusdirige-se ao ser humano e este, em plena liberdade, responde com aobediência da fé (cf DV 5); a iniciativa no ato revelador não é humana,mas de Deus, embora o autor humano expresse, depois, em conceitoshumanos aquilo que recebeu de Deus por revelação. É por isso que aIgreja é muito criteriosa em relação a supostas “revelações privadas”:estas são muito diversas da revelação bíblica, reconhecida pela Igrejanos textos que formam o elenco, ou cânon dos livros inspirados darevelação divina. Em Jesus Cristo Deus falou aos homens sua palavramais clara e definitiva, por isso, Cristo é o centro da Escritura e aomesmo tempo o critério decisivo, ou “chave”, para entender asEscrituras. O cânon bíblico está fechado e não se acrescentam outroslivros ou textos supostamente inspirados por Deus. Significa isso queDeus calou e não fala mais aos homens? De forma alguma! A Igreja ensinaque a Palavra de Deus continua viva e atual, de muitas maneiras; eladeve ser buscada, acolhida e interpretada mediante a constante leiturae atenta escuta dos textos sagrados, “com fé”, nacomunidade eclesial, APalavrade Deus permanece para sempre e cabe a nós acolhê-la de formassempre novas, em situações e contextos diversos, sintonizados com aTradição viva da Igreja. Deus não se contradiz.
O Sínodo recordou que aPalavra de Deus não nos vem unicamente através da Sagrada Escritura,mas também através da Liturgia, da Sagrada Tradição e do Magistério daIgreja. A Palavra de Deus, em última análise, é o próprio Cristo,Verbo/Palavra de Deus que se fez “carne” e veio habitar no meio de nós,e que permanece vivo na Igreja, seu “corpo”; pela ação do EspíritoSanto, a Palavra da salvação continua viva na Igreja e se dirige semcessar ao mundo e às pessoas. A própria Igreja, comunidade de fé, é aprimeira destinatária e ouvinte da Palavra divina e, pelo seumagistério, ela tem a missão de zelar para que a Palavra sejaproclamada a todos e retamente interpretada.
S.Agostinho dizia que aIgreja é a voz e Cristo é a Palavra. Toda a comunidade eclesial deveacolher com fé e alegria esta Palavra da salvação, traduzindo em vidaaquilo que ouve; ao mesmo tempo, também é tarefa de cada batizadotransmitir aos outros a Palavra de vida, de muitos modos, de acordo comas condições e as responsabilidades de cada um na Igreja e no mundo;muito importante é o papel dos pais e da família para iniciar os filhosna acolhida amorosa e interessada da Palavra de Deus. Também oscatequistas e os religiosos e religiosas têm um papel importante. Mas étarefa preponderante dos ministros ordenados, diáconos, padres ebispos, zelar para que a Palavra do Senhor “não se torne rara”, como sedizia em certas ocasiões nos tempos bíblicos, mas seja amplamenteproclamada a todos.
Esta é nossa missão primeira. Teremos que trabalharmuito sobre isso em nossas comunidades e, se for preciso, também reverpráticas e métodos pastorais. No mundo secularizado e, muitas vezes,desorientado, há verdadeira fome e sede da Palavra de Deus e nósdevemos partilhar o Pão da vida com fé e viva esperança, com largueza ecriatividade. Para isso, é necessário comunicar ao povo o apreço pelapreciosa Palavra; ao mesmo tempo, preparar e educar os anunciadores daPalavra de Deus, para comunicarem ao povo a alegria do encontro com aPalavra vivificadora de Deus: “Senhor, tu tens palavras de vidaeterna!”.