Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
“Preparai no deserto o caminho do Senhor” (Is 40,3). Estaadvertência no-la faz o profeta Isaías na Liturgia do segundodomingo do Advento. O alerta vem-nos desde os tempos bíblicos, em que opovo hebreu esperava pelo Messias que o tiraria do cativeiro da graçaem que se encontrava, e nos conclama a endireitarmos os caminhostortuoso e aplainarmos as veredas escarpadas (Is 40,4b).
Bafeja em nossa face, inundando-nos de graça, a inspiração divina aprepararmo-nos, desde hoje, para o retorno de Jesus. Nessa expectativa,no entanto, cabe-nos assumirmos nosso papel na Igreja e na comunidade,como discípulos de Cristo e seu missionário, atuando determinados econvictos nessa grande obra de evangelização. Cabe a cada cristão serevangelizador na família, na sociedade, entre os amigos, no local detrabalho, antes como exemplo pela sua conduta, depois pela preparaçãoque deve buscar, a fim de que coopere nessa obra da redenção. Assim,estaremos nos preparando e estimulando nossos irmãos a se prepararempara quando “então se manifestará a glória do Senhor e todo o homemverá a sua magnificência” (Is 40,5).
Naqueles anos bíblicos, o povo hebreu era cativo do ImpérioBabilônico e o profeta o consolava, anunciando o reino de paz e dejustiça que um dia se instauraria no mundo. Em nossos dias, o povo deDeus muitas vezes é cativo do modernismo, pelo oportunismo, pelocomodismo, pela insensatez, pela impiedade, pelo destemor, por tudoaquilo que nos priva da graça. É por isso que, nessa preparação para omomento em que a Santa Igreja nos propõe a meditação da vinda do SenhorJesus, para remir-nos do pecado, devemos nos preparar, limpar o nossocoração e tirar as arestas que nos remetem às constantes fragilidades.Desta forma, de coração puro, participando da Eucaristia, devidamentepreparados, e nos conduzindo de acordo com os preceitos cristãos,estaremos endireitando nossos caminhos, muitas vezes áridos, semeando aesperança da eternidade em Deus.
Ao clamar a libertação àquele povo sofrido do Antigo Testamento,muito mais do que consolar aqueles corações imersos em dor e decepção,Isaías apelava para a necessária conversão. E creio que, também emnosso tempo, haja uma necessidade premente de conversão, em todos ossentidos: no modo de vida, na conduta pessoal, familiar e social, notrabalho, nas palavras, inclusive na fé. Aliás, talvez seja a partir dafé que deva se iniciar esse processo de retorno. Retorno ao Pai, pormeio da Igreja, na formação espiritual e dogmática, na participação dosSantos Sacramentos e, por fim, no exemplo de vida cristã que devemostodos emanar. Seremos “sal da terra e luz do mundo” no meio em quevivemos e promoveremos uma constante conversão a Deus, estimulando,ainda, o próximo a fazê-lo.
Isaías anunciava por Deus que a consolação estava próxima. AsSagradas Escrituras, a Tradição e o Magistério da Igreja nos asseguramque temos a consolação, em meio a todas as tribulação que nos afligemneste conturbado século. O profeta anunciava “ao coração de Jerusalém”;anunciam-nos hoje do coração da Igreja, Corpo Místico de Cristo, noqual estamos inseridos desde o Batismo. É portanto do nosso coração quebrota – e não podemos impedi-lo – essa expressão do amor de Deus paraconosco, inspirados pelo Divino Amor, que é a consolação.
O povo hebreu tinha a convicção de que os seus pecados é quem oagrilhoara sob o domínio babilônico. Suportou-o, contudo, na esperançado resgate da eterna Aliança feita com seus pais. Devemos, também,saber compreender os desígnios de Deus e distinguir quais são eles e oque provém de nosso amor-próprio, de nosso orgulho, de nossaimprudência, de todas as nossas fragilidades que, muitas vezes, omaligno nos faz entendê-las equivocadamente como virtudes.
Com a tão recomendada resignação cristã, a humildade de reconhecernossas falhas e a dignidade de buscar a reconciliação com o próximo e,depois, com Deus, pelos sacramentos da Penitência e da Eucaristia,estaremos prontos para viver, intensamente, a união mística que tantossantos experimentaram e que Deus se delicia em repartir conosco: essaconvivência íntima na fé e na fraternidade.
Que a Virgem Maria, silente em sua concepção, confiante naProvidência Divina, inflamada de ardor pelo Santo Espírito, seja nossomodelo para nos mantermos atentos e fiéis à vontade de Deus. Pedindosua constante intercessão, recomendamos ao nosso clero e queridos fiéisque assumam cada vez mais convictos sua função na Igreja, enquanto nospreparamos, neste Tempo Litúrgico, para o que há de vir nos séculosfuturos.