O demônio tem um papel muito relevante na vida do padre Pio. Por bem ou por mal, ele procura sempre tentar o padre, dobrá-lo à sua vontade, cansá-lo e desviá-lo com a finalidade de fazê-lo cair ou, no mínimo, desistir de sua ação em favor das pessoas. Na verdade, ele ruge em torno das pessoas, para devorá-las, como diz são Pedro, e no pai-nosso Jesus nos convida a rezar e a não nos deixar cair em tentação. Por seu lado, o padre Pio adverte a seus filhos espirituais que não dêem trégua ao demônio e que fechem as portas da vontade às suas sugestões.
Mas ele mesmo, o padre Pio, tem algo que ver pessoalmente com satanás, o qual ainda que inimigo dos santos, é um instrumento da santidade. Porque, no plano divino, a missão do diabo é a de colaborador, como instrumento, ou seja, contra a sua vontade e a despeito da intenção a que ele se propõe, para a santificação do homem de Deus. com o padre Pio, a obra santificadora do Espírito Santo é mais do que evidente; mas a obra do demônio, ainda que sugestivamente oposta àquela, objetivamente converge para a mesma finalidade.
Os ataques diabólicos contra o padre Pio são espantosos. O demônio apresenta-se ora por meio de formas que lhe atormentam os sentidos, ora sob um aspecto horrivelmente tenebroso, ora para atacar o intelecto e a vontade, de modo a impedir o progresso no amor de Deus. O “ignominioso” atira-se sobre ele, em companhia de outras forças infernais, para suscitar-lhe “pensamentos de desespero e de falta de confiança em Deus”, para dar-lhe “a Deus” e, “sob as mais abomináveis formas”, para fazê-lo prevaricar.
Ele o tenta dia e noite, a tal ponto que o padre acredita “estar perdendo o juízo”; lança-se sobre ele, joga-o ao chão e o desnuda, atira longe seus livros, cadeiras, travesseiros; contorce-lhe os ferros do leito, emitindo “gritos desesperados e pronunciando palavras extremamente sujas”, o maldiz e promete agressões ainda mais ferozes.
O padre, reduzido a condições deploráveis, escreve a seu confessor: “Eu acreditava, realmente, que fosse aquela a última noite da minha existência”; “Agora já são 22 dias contínuos que Jesus permite a ele desafogar sua raiva sobre mim” (28 de junho de 1912; 1 e 13 de fevereiro de 1913; 18 de maio de 1913).
A permissão concedida por Jesus aos demônios é motivada pelo fato de o padre Pio constituir-se num baluarte formidável entre o demônio e as pessoas, uma almofada de proteção que impede ao demônio a passagem em direção às pessoas mais fracas e mais expostas. O enfurecimento diabólico é devido não apenas ao ódio em relação ao padre, mas ao obstáculo intransponível constituído, por ele para a agressão das pessoas.
O padre Pio tem, sim, pavor de satanás, mas o que verdadeiramente o aterroriza é o pensamento de ofender a Deus; quando acena às tentações, exclama: “Estas tentações me fazem tremer da cabeça aos pés de medo de ofender a Deus […]; não tenho medo de nada, a não ser das ofensas a Deus” (1° de outubro de 1910; 29 de março de 1911).
Está escrito (Tb 12,13): “Porque não hesitaste em levantar-te e deixar a refeição para ir sepultar um morto, eu fui enviado para pôr-te à prova”. A aspereza da prova à qual o padre é submetido faz com que se compreenda, também, o sentido purificador da intervenção diabólica permitida por Deus.
O padre grita: “Ai de mim! A mão do Senhor caiu sobre mim, oprimindo-me excessivamente. Ao redor do meu espírito não se ouve nada mais do que rugidos de bestas ferozes que me causam tanto medo a ponto de me fazer acreditar ter sido enterrado vivo no sepulcro” (19 de dezembro de 1917). E volta-se para seu confessor: “Mas, padre, quais são os objetivos de Deus? Por que permite ao demônio tamanha liberdade?”; “A batalha é superlativa e extremamente áspera; tenho a impressão de poder sucumbir a qualquer momento[…] Os inimigos, todos de acordo gritam: matemo-lo, escorracemo-lo, porque é fraco e não poderá resistir por muito tempo”; “Em resumo, afinal de contas, tenho a impressão de que o vencido deve ser justamente eu. Mas que digo? É possível que o Senhor permita? Jamais!” (25 de junho de 1911; 1° de abril de 1915; 9 de maio de 1915). De fato, como é ensinado na doutrina paulina, Deus não permitirá que o homem seja tentado acima de suas próprias forças (cf. 1Cor 10,13).
Quando, em seguida, a alma do padre é colocada diante daquela prova terrível que os teólogos chamam de noite escura da alma, os demônios fazem qualquer sacrifício para “ver se em tal estado lhes será possível arrancar-me do peito aquela fé e fortaleza que me vem do pai das luzes” (30 de outubro de 1914).
“Mas uma vez, nestes dias, minha alma desceu ao inferno. Mais uma vez o Senhor me expôs ao furor de satanás […] Parece que esse apóstata infame quer me arrancar-me do coração aquilo que nele existe de mais sagrado: a fé”. Por isso, pede ao Senhor comutar-lhe “a provação em outra, ainda que mais dura” (26 de novembro de 1917).
Desse fato compreende-se como deve ter sido essa forma de purificação. Ele se examina impiedosamente, mas não encontra em si mesmo motivos de condenação, e, então, em vez de apaziguar-se, chega à conclusão dilacerante para sua alma: “O que mais me dilacera a alma é que talvez este meu penar não seja aceito por Jesus, porque é proveniente de um condutor ignominioso; e pode ser até que seja um veículo de ira” (4 de agosto de 1919).
Seu anjo da guarda, que lhe apareceu depois de uma terrível luta que teve com os demônios, disse-lhe: “Jesus permite esses assaltos do demônio porque a sua piedade o torna caro a ele, e deseja que você se assemelhe a ele nas angústias do deserto, do horto e da cruz. Defenda-se, afaste-se sempre e despreze as insinuações malignas, e não se aflija nas situações em que do meu coração, eu estou perto de você” (18 de janeiro de 1913).
As tentações são um sinal seguro da divina predileção, e as tempestades suscitadas pelo demônio são sinal certo de que se está estabelecendo na alma o Reino de Deus. as iniqüidades que o demônio comete, exercita-as por si mesmo; mas a permissão de cometê-las advém de Deus.
No texto bíblico de 1 Samuel, lê-se: “No dia seguinte, o espírito deprimente enviado por Deus apoderou-se dele” (18,19), ou seja, um espírito que é qualificado simultaneamente como espírito do Senhor e como espírito ruim: é espírito do Senhor porque obteve dele a permissão de exercitar um poder, e é espírito mau devido ao desejo de sua vontade perversa.
O espírito maligno também se torna cruel contra o padre Pio com a expressa permissão de Deus; mas, nesses assaltos diabólicos, o Senhor está sempre presente. Quando santo Antônio abade, pergunta a Deus: “Onde estavas tu?”. “Eu estava presente”, responde-lhe uma voz, “e esperava, contemplando a sua luta, e uma vez que você soube enfrentá-la e sair-se vencedor, estarei sempre a seu lado…”. (N. Conte, Santana l’avversario [Satanás, o inimigo], p.880)
O demônio se enfurece contra os santos e parece forte, aliás, fortíssimo. Entretanto, com sua vinda, Cristo tirou-lhe a força, porque apenas Cristo pode enfrentar como vencedor o mistério da iniqüidade.
Também Francisco de Assis, como o padre Pio, é atacado por satanás num furioso corpo-a-corpo, saindo da luta mais morto do que vivo. Suplica a seu padre acompanhante que permaneça próximo a ele, “porque tenho medo de estar sozinho. Há pouco, os demônios venceram-me por santas razões”. E comenta: “Os demônios são os justiceiros dos quais Nosso Senhor se serve para punir nossas faltas”. Outras vezes diz aos demônios que se apresentam a ele: “Ordeno-lhes, demônios, que façam contra meu corpo tudo aquilo que lhes foi permitido”; mas os demônios, enfurecidos e humilhados, afastam-se.
O padre Pio, atacado cruelmente por seu inimigo, lamenta-se a seu diretor espiritual: “Esse espírito maligno procura, com toda sorte de fantasmas, introduzir em meu coração pensamentos de imundície e desespero […] Encontro-me, de fato, nas mãos do demônio […]”. O diretor espiritual responde-lhe: “Por que você teme tanto o inimigo? Não sabe que o Senhor está com você e que o adversário das almas nada pode contra quem resolveu ser de Deus?” (9 e 12 de abril de 1911).
Na fase de progresso espiritual, que vai amadurecendo durante a noite do espírito, em que a obscuridade é terrível e parece faltar qualquer esperança de bem, ressurgem aqueles vícios que, ainda que mortos na alma, são revividos pelos demônios, e surgem até aqueles que jamais existiram. São trevas purificadoras, onde satanás intervém, como instrumento de Deus, pelo refinamento da alma.
Apesar de esses espíritos malditos atormentarem o padre Pio, ele os afronta com coragem e posturas desafiadoras, porque sabe que sem a permissão de Deus sequer podem mover-se.
Parece um paradoxo, mas são justamente os assaltos diabólicos impiedosos que ajudam a padre Pio na conversão das pessoas: quantas delas encontram a paz no coração por meio do sofrimento provocado pelo diabo, que, a despeito de si mesmo, colabora para o bem das almas desejado pelo santo.
Os demônios se enfurecem no horrendo túnel da noite do espírito, mas o padre saiu dele resplandecente no firmamento da Igreja.
A mensagem da experiência do padre Pio, homem de fé e de perfeito equilíbrio psico-espiritual, conclama o mudo das almas a não contestar a realidade do ser demoníaco, nem a sua poderosa, oculta e incessante ação, que pode tornar as mais variadas formas, inclusive a mais conveniente: a negação de satanás.
Revista Shalom Maná