Tolkien, um católico fiel à Igreja
Sempre que lermos uma obra, seja qual for sua natureza, devemos levar em conta o autor, e, ao menos em linhas gerais, sua visão de mundo, contexto social, época, além de outros fatores que nos ajudem a ter uma real contextualização do que se passava durante a produção do livro.
Ao ler Tolkien, devemos, sem dúvida, lembrar que ele viveu como um católico fiel à Igreja e que a teologia, a tradição oral e bíblica lhe povoavam o imaginário e a memória.
Reli A sociedade do Anel, na semana litúrgica em que, providentemente, se lia sobre Abraão, e mais especificamente sobre a oferta que ele fez de Isaac, no monte Moriá. Moria! Apenas um acento, não pode ser coincidência. Claro que não é!
Ora, lá se ofereceu Gandalf, o único que de fato conhecia os problemas das minas, mas a decisão foi tomada pelo que carregava o Anel. Ele decidiu qual caminho percorrer para adentrar a mina. Então, toda a companhia do Anel, impedida pela neve, precisou ir por baixo, onde antes fora um palácio dos anões, cheio de glória e de riquezas.
Gimli fala tão empolgado dos salões de lá, de seus tesouros, pois “onde está teu tesouro, ali estará o teu coração” (Mt 6,21), que poderíamos, então, chamar as minas de Moria de Coração? Ao tomar essa analogia para essa reflexão, podemos encontrar algumas pistas que ajudem a aceitá-la.
Gandalf, representação de Cristo Messias
Amigo: a palavra que abre o coração. “Mas tu, Israel, meu servo. Jacó que escolhi, raça de Abraão, meu amigo” (Is 41,8). Mais uma vez podemos relacionar a estória com Abraão, reforçando a comparação. Tão logo o Mago abre a porta, uma terrível criatura trata de impedir que ele e seus companheiros entrem na mina.
Gandalf é uma representação de Cristo Messias, como podemos ler no livro Os Mistérios da Terra Média, assim como, na parábola do semeador (Mc 4,1-20; Mt 13,1-23 e Lc 8,4-15), apenas a Palavra encontra um coração, já lhe aparecem aves para comer as sementes e impedirem-nas de germinar.
Ao entrar no lugar que deveria ser acolhedor para o Senhor, encontra-se um espaço vazio, o coração vazio do homem que não vive de amor. Ao entrar em muitos corações, Jesus os encontra “vazios”, mas infelizmente não estão tão solitários assim. Estão, na verdade, cheios das riquezas do mundo.
A parábola fala também de terra rasa, como os anões derrotados pelos orcs e trolls, como também os menores pecados veniais, que vão matando nossa capacidade de amar. Até encontrar o Balrog, o pecado mortal, de quem os menores têm medo.
Combate contra o pecado mortal
A luta contra os veniais até consegue se dar com recursos que eles têm, ou melhor, as capacidades naturais daqueles que enfrentam tais perigos não são totalmente inúteis contra eles, mas o auxílio da graça, em Gandalf, Frodo e Aragorn, é essencial, bem representado na camisa de Mithril do Hobbit e no conhecimento do Maia.
Quando vamos ao combate contra o pecado mortal, não há Mithril que supere seus ataques. Podemos encontrar inúmeros santos na Tradição da Igreja, como São Pio de Pietrelcina e São Felipe Neri, explicando que só há um jeito de vencer o pecado mortal: fugindo dele, para que o próprio Jesus o vença. É tudo que a Sociedade do Anel pode fazer, exceto um, Gandalf.
O combate de forças tão poderosas é terrível, leva à morte. Assim como no mistério Pascal de Cristo, para vencer o domínio do pecado sobre nós, Ele o combateu, até a morte de ambos. Mas Jesus Ressuscitou, tal qual Gandalf, assim como um anjo apareceu para poupar Isaac, providenciando um sacrifício.
O coração do homem
Ainda insisto um pouco mais na metáfora, ao falar dos chifres do Balrog, característica ressaltada do carneiro que Abraão encontrou. Ele foi sacrificado no cume de Moria, não o mestre.
Logo, Jesus entra em nosso coração como um amigo, pois Ele é convidado a entrar. Porém, muito do que há fora e dentro dos corações tenta impedi-Lo, mas Ele é mais forte que tudo isso, se permitimos que Ele prossiga até nossa maior profundeza e fizermos o possível para colaborar com Sua obra.
Assim, percebemos que, quando Tolkien cria Moriá, ele quer falar do coração do homem, no qual se vive o sacrifício da oferta, como também os laços da amizade, em que se encontra o tesouro.
Não entendeu as referências? Seguem algumas leituras para embasar: Gênesis 22, Marcos 4,1-20 e os capítulos “Uma jornada no escuro” e “A ponte de Khazâd-dûm” em “A sociedade do Anel”, primeiro volume de O Senhor dos Anéis. E, claro, o livro Os mistérios da Terra-média para muitas outras reflexões como esta.
Elton Moura