Deus mesmo suscita fome e sede da Palavra (Amós 8,11-12). Estamos enfastiados de discursos vazios, palavras falsas, lábia, demagogia, mentira. Estamos ensurdecidos de tanta propaganda enganosa e ideologias. Nossa fome é da Palavra que contém o esplendor da verdade e a revelação do amor. A Palavra de Deus é de amigo para amigo que provoca encontro, conversão e aliança. A Bíblia é carta de amor, a Palavra amiga.
A Palavra sai da boca de Deus (Mt 4,4) para chegar aos nossos ouvidos, corações e lábios. Assim acontece a revelação íntima de Deus, sua comunicação gratuita, sua relação interpessoal e também o diálogo amigo, a comunhão de vida. Esta Palavra é pão, mel, leite, sustento, comida “toma o livro e come-o” (Ez 3,3). É na escola da Palavra que se forjam os discípulos, os profetas, os missionários, os catequistas, os evangelizadores. A Igreja deve “ouvir piamente, guardar santamente e expor fielmente a Palavra” (DV 3).
A Palavra está no mundo desde o princípio (Jo 1,1). Deus criou tudo pela Palavra: “Deus disse, faça-se…”. O primeiro livro da Palavra de Deus é a criação. O segundo livro é a comunidade que conserva a Palavra e depois vem o terceiro livro, a Bíblia. O quarto livro é o coração dos fiéis “vós sois a carta de Cristo” (2Cor 3, 2-3). O cristão que vive a Palavra torna-se ele mesmo a Palavra que se fez carne. Você e eu, se vivermos a Palavra somos a segunda encarnação desta Palavra. O Verbo escrito se faz carne em nós. A Bíblia já não é livro, letra, mas carne, pessoa, “espírito e vida” (Jo 6,63).
Temos fome e sede da Palavra porque ela ilumina os problemas humanos, é resposta às indagações e angústias, é fundamento dos valores perenes, é satisfação das grandes aspirações. Quanto mais formos homens e mulheres da Palavra, seremos pessoas de palavra. O potencial da Palavra divina é tão forte que rezamos “Senhor, dize uma só Palavra” (Mt 8,9). Basta uma Palavra. Nem o pingo do “i” deve ser mudado. Não podemos falsificar a Palavra, nem ajeitá-la ao nosso gosto.
Portanto, haja bons leitores da Palavra, bons microfones, santos pregadores, Igrejas com boa acústica. Além disso, nossos grupos bíblicos de reflexão, as escolas bíblicas, nossos catequizandos recebam o fascínio pela Palavra. Precisamos dedicar mais tempo à Bíblia à televisão. Olhar mais a Palavra que o espelho. O futuro do catolicismo e a primavera da Igreja têm um endereço: “Bíblia na mão, no coração e pés na missão!”
A Palavra de Deus ainda circula pouco, a maioria do Povo não tem acesso à Bíblia, grande é a distância que muitos católicos têm em relação à Bíblia. São graves as conseqüências da ignorância bíblica. Não basta a pastoral bíblica, precisamos de uma “mobilização bíblica”. Se a palavra humana é terapêutica, criativa, inspiradora, interpeladora, a Palavra de Deus é vida, salvação, verdade, amor. Céus e terra passarão, a Palavra permanecerá. Ela é a rocha da casa, a rocha do mundo.
Dom Orlando Brandes
Arcebispo de Londrina