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Frei Patrício: Ser profeta é uma vocação incômoda?

Os profetas de todos os tempos precedem sempre os tempos da própria Igreja, que não raramente não os compreende, sendo reconhecidos como profetas por ela apenas depois de sua morte.

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Não existe uma universidade que dê o diploma de profeta, embora hoje haja muitas pessoas que acham que se assume atitude de profeta ao anunciar desventuras e o fim do mundo. Estas coisas, por sua vez, se não acontecem como preveem, dizem eles, acontecerão no ano seguinte. Estes são profetas do pessimismo e do otimismo. Eles são tão exagerados que nem eles próprios acreditam no que dizem. 

Na nossa visão de fé, sabemos que ser profeta é uma vocação incômoda, da qual os profetas bíblicos fizeram todo o possível para fugir, porque comporta, sem dúvidas, sofrimentos e cruz. Aliás, me parece que nenhum dos profetas morreu de velhice. Eles foram mortos ou morreram de tristeza devido à perseguição. 

Quem é o profeta bíblico?

Vale a pena frisar que o profeta bíblico não é normalmente alguém que prevê o futuro, mas, sim, alguém que sabe ler o passado. Eles dizem: “se não se converterem, lhes acontecerá o mesmo que aconteceu com seus pais”, ou dizem ainda: “se não respeitarem a Deus, virão os antigos e novos inimigos e eles irão destruir as suas cidades”. Em outros momentos, o profeta, ensinado por Deus, anuncia, diante de alguma evidência, que as coisas do amanhã serão difíceis, especialmente quando o povo se afasta do Deus verdadeiro e se torna idólatra. 

O povo de Israel, como também o povo cristão de hoje, constrói para si continuamente, pela fraca fé, bezerros de ouro, de prata e de ferro. Estes são os ídolos que nos prejudicam no nosso amor a Deus.

O profeta não tem e não pode ter uma mensagem própria, porque a sua missão é repetir fielmente o que Deus lhe manda dizer, mesmo que saiba que não será escutado: “Você vai anunciar, quer o povo o escute ou não. Anuncie o que eu lhe mandarei dizer”.

O profeta é uma sentinela

A missão do profeta é difícil, porque muitas vezes ele se encontra sozinho no meio de um povo incrédulo. Além disso, nem sempre o profeta tem uma vida impecável. Às vezes,  ele mesmo não é sem culpa, mas ainda assim deve anunciar o que Deus lhe diz que deve proclamar. 

Os profetas de todos os tempos precedem sempre os tempos da própria Igreja, que não raramente não os compreende, sendo reconhecidos como profetas por ela apenas depois de sua morte.

Há uma caraterística que eu gostaria de destacar quanto à vida dos profetas: eles não são rebeldes à autoridade. Eles obedecem. Na história dos santos, encontramos muitos que não foram compreendidos, mas eles obedeceram a palavra da Igreja e souberam silenciar, porque também o silêncio é uma forte linguagem dos profetas. Recordemo-nos de São Pio de Pietrelcina ou mesmo de Santa Teresa d’Ávila, que, diante da palavra da Igreja, preferiram o silêncio a se colocarem contra ela.

O profeta é uma sentinela que está sempre atenta, a fim de que os inimigos não destruam a verdade, que grita quando chega o inimigo e que, se for preciso, morre para defender a verdade.

Contracorrente

“Estas palavras de Jesus, não obstante possam até parecer poéticas, estão decididamente contracorrente ao que é habitual, àquilo que se faz na sociedade; e, embora esta mensagem de Jesus nos fascine, na realidade o mundo conduz-nos para outro estilo de vida. As bem-aventuranças não são, absolutamente, um compromisso leve ou superficial; pelo contrário, só as podemos viver se o Espírito Santo nos permear com toda a sua força e nos libertar da fraqueza do egoísmo, da preguiça, do orgulho.” (GE 65)

Viver o Evangelho é navegar contra a correnteza que quer nos levar para baixo, pois as palavras de Jesus nos levam para o alto, para o céu, para uma vida que é de verdade, de forma que se pode viver de novo, cheio de paz e de alegria com todos. 

Somos chamados a construir o Reino de Deus, que, com as bem-aventuranças, é abertamente contrário à filosofia do mundo, que oferece o prazer, o domínio, a projeção, o dinheiro e coisas semelhantes. Jesus nos convida para a pobreza, para o dom total de si mesmo. 

O documento se prepara, pois, para meditar sobre o caminho das bem-aventuranças e, por isso, nos recorda que elas não são nem um caminho fácil nem superficial, mas um caminho exigente, que demanda coragem, perseverança e muito amor.

O povo precisa de profetas como Moisés 

O povo não pode ficar sem profetas. Sempre, desde o início da história humana, Deus suscitou homens e mulheres que souberam ir ao deserto ou subir as montanhas e se refugiar em lugares solitários para escutar a voz de Deus, voz que não se pode desobedecer, mesmo que se queira. Não é o profeta que fala o que quer, mas é Deus que lhe diz o que, como e quando deve falar. 

O povo tem medo de Deus e precisa de intermediários amigos do Senhor. Por causa disso, o próprio Deus promete a Moisés que fará surgir profetas como ele, e que o povo não vai ficar desorientado. 

É importante ter ciência de que o Senhor pede contas tanto do povo como do profeta que fala o que quer e não o que Deus lhe pede. É preciso saber ainda que é difícil a tarefa do profeta, mas que é bela e necessária. Precisamos saber que todos nós somos “pequenos profetas” a serviço de Deus e da comunidade.

O profeta Paulo ordena e aconselha 

Nem sempre Deus ordena. Nem tudo da Palavra de Deus é ordem. Muitas coisas são conselhos, mas que devem sim ser escutados e praticados segundo o próprio carisma pessoal. Há variedade de carismas, os quais são uma riqueza do povo de Deus. 

Se todos não se casassem, acabaria o mundo. Se todos se casassem, não teríamos a profecia da castidade. As duas coisas são importantes para revelar a beleza e a multiforme grandeza do Reino de Deus, onde há espaço para todos. Todos são chamados, casados e não casados, a viver no serviço de Deus e do povo, ainda que de formas diferentes. 

Paulo, que tinha escolhido a castidade como sinal do seu perfeitíssimo serviço ao Reino de Deus, dá um conselho para todos, dizendo: “Não é uma ordem, é um conselho: a castidade serve para estar ao serviço total de Deus e não pode ser fruto do egoísmo e do comodismo.”

Jesus usa a sua autoridade para libertar o povo

Gosto, antes de escrever o comentário da Palavra de Deus, de lê-la e depois deixar que ela me estimule, mostrando o que devo dizer e o que não devo. Aprecio Jesus que ensina com autoridade, sem se impor, mas servindo e ajudando os demais. 

Quando servimos e ensinamos a amar a Deus, os diabos ficam furiosos no inferno e na terra. Todos os que não gostam de Jesus tentam impedir que a liberdade aconteça. 

Já escrevi várias vezes, mas não é fácil colocar na cabeça: o diabo conhece a Deus e O odeia, devido a isso procura, por todos os meios, afastar-nos Dele. Já os santos conhecem a Deus e O amam, por isso procuram, por todos os meios, nos aproximar cada vez mais Dele.

A voz de Jesus contra o mal, contra o demônio que domina, é forte, é um grito de libertação: “Cala-te e sai dele!” Como viu-se, ouvindo isto, o diabo se foi. Não se expulsam os demônios com boas maneiras, educação e gentileza, mas com a força de Jesus. 

Palavra que ilumina a semana 

Devemos vivenciar a nossa missão de profetas, lutando com toda a nossa fé contra todas as formas do mal que vemos. O mal é sempre uma expressão do demônio que quer nos dominar.


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