Uma das realidades mais belas da vida é ter fé em Deus que, para organizar a nossa vida, do seu povo, não necessita dos nossos conselhos. Com sabedoria infinita, o faz e nos surpreende como o faz. O mais belo da nossa fé é que nós somos um povo de sacerdotes, de reis e de profetas. Esta verdade encontramos escondida no Antigo Testamento e revela-se plenamente no Novo Testamento não pelos teólogos, mas pelo próprio Jesus.
Hoje em dia, assistimos tantas discussões sobre o sacerdócio e, às vezes, o povo para na “casca” e não entra na profunda realidade, no coração do sacerdócio, no mistério, na vocação. Eu posso dar a certeza do que digo porque Deus me abriu a cabeça.
Somos um povo sacerdotal que devemos oferecer ao Senhor gestos e coração sacerdotal, a hóstia santa e imaculada da nossa vida. É belíssimo, mas também alguns entre a humanidade são chamados a ser sacerdotes numa forma diferente que é o que chamamos de sacerdócio ministerial. O nosso povo, quer dizer, eu e você como povo de Deus, é chamado a viver em comunhão com o Cristo Jesus.
Também participamos da realeza de Jesus, que é Senhor do universo, e com ele sentimos toda a nossa responsabilidade de viver, não dominando o universo, mas cooperando como reis que desenvolvem e fazem crescer a humanidade e o universo.
E participamos com alegria ao ministério profético do povo de Deus, sempre anunciando a verdade e condenado com coragem todo o mal. Na escuta da voz do Espírito e da Igreja, todos os caminhos são bons e nos conduzem à felicidade aqui e na eternidade.
Não é saudável amar o silêncio
“Não é saudável amar o silêncio e esquivar o encontro com o outro, desejar o repouso e rejeitar a atividade, buscar a oração e menosprezar o serviço. Tudo pode ser recebido e integrado como parte da própria vida neste mundo, entrando a fazer parte do caminho de santificação. Somos chamados a viver a contemplação mesmo no meio da ação, e santificamo-nos no exercício responsável e generoso da nossa missão”. (GE, 26)
Numa leitura superficial deste trecho “escandalizamo-nos”: como é possível que o Papa diga uma coisa assim, que não é saudável amar o silêncio quando toda a santidade, todo o mistério de Deus, e toda a oração se baseia no silêncio como escuta de Deus, e o mesmo Deus se define silêncio? Esta leitura apressada foi feita imediatamente quando saiu o documento, e aí as interpretações incoerentes. Precisamos ler todo o texto com amor e com atenção para chegarmos à conclusão de que existem vários tipos de silêncio, um dos quais é pernicioso e negativo, que mata a beleza do verdadeiro silêncio.
Escrevi um livro, que parece que agradou ao público, chamado “O Silêncio”, com as Edições Loyola. Nesta obra, procuro colocar em evidência os efeitos positivos e negativos do silêncio. Ele é negativo quando nos afasta de Deus e dos outros, quando nos fecha em nós mesmos. É negativo quando é fruto da raiva e da falta de diálogo, de um coração cheio de ressentimento. Até na maneira como se fecha uma porta ou como se caminha, há um silêncio que não é de palavra, mas que revela tantas coisas. Convido a refletir sobre este trecho acima da Gaudete et Exsultate (GE), pois, sem dúvida, se chega à conclusão que o Papa Francisco tem não só razão, mas muita razão.
Sereis um povo de sacerdotes
Moisés toma de novo o caminho para o monte do Senhor onde Deus irá falar a ele, para que seja capaz de conduzir o povo por caminhos novos. Deus quer fazer uma aliança que seja fundamentada na força do amor e da vida e, para isso, é necessário somente uma condição: escutar e praticar a Palavra de Deus. A escuta sozinha não é suficiente, e nem a prática sem a escuta, porque pode levar-nos a um caminho não segundo o projeto de Deus, mas segundo os nossos projetos. Somos de Deus porque O escutamos e caminhamos à luz de Sua Palavra. Deus assim faz de nós uma “propriedade” Sua, não para nos dominar, mas para nos salvar do peso dos nossos pecados.
O Salmo responsorial 100 nos apresenta uma belíssima realidade do amor: não somos um rebanho sem pastor que caminha sem rumo, contudo um rebanho guiado pela mão de Deus. É belo, neste sentido, meditar no silêncio, que não é fuga.
Só Jesus salva
O amor é uma palavra que sempre podemos discutir e tê-la com uma certeza ou também total desconfiança. Porém, o amor consagrado pelo sangue do dom de si mesmo não se pode colocar em discussão. É, sem dúvida, o caso do amor de Jesus, com a sua morte na Cruz. Com o derramamento do Seu sangue ele consagrou o Seu amor por nós e nos dá a certeza absoluta disto. Foi morto não porque somos justos, mas porque somos pecadores. Jesus nos comprou não com promessas inúteis, vãs, mas com promessas reais, dando tudo: “tendo dado a sua vida por nós e tendo nos amado, amou-nos até o fim” (Jo 13,1). Muitas vezes no silêncio da minha oração medito com amor e comoção estas palavras de Jesus: “tendo os amados até o fim” (Jo 13,1), “até a morte e morte de Cruz” (Fl 2,8). Como posso duvidar?
Enviados a ser misericordiosos
Há uma palavra que, na vida humana e cristã, nunca podemos esquecer: sozinho não se pode fazer nada, “sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). E mesmo Deus na história da salvação, como Ele quis, sozinho não pode realizar muitas coisas. Ele quer que nós cooperemos com Ele na difusão do seu Reino, no anúncio do Evangelho e no fazer o bem. “A messe é grande, mas os operários são poucos” (Mt 9,37). Devemos rezar para que este número aumente, mas também nos enviar pelo mundo a fora, pelas aldeias, por todos os lugares para sermos comunicadores de paz, de amor e de justiça. A curar as feridas do mal com o óleo da ternura, a expulsar os demônios, a não deixar que o mal vença. Somos enviados por Jesus a todos, sem distinção. Não existe uma nação que não tenha a presença da Igreja. Às vezes perseguida, silenciosa, escondida, mas presente como vida, como sal e como luz.