Certo dia, voltando para casa, escutando uma música de Charlie Brown, parei por um instante e pensei conmigo mesma. “O vocalista Chorão já gritava por socorro, desejava, mesmo sem perceber, experimentar do Amor que sacia tudo em nós.” Me dei conta da verdade professada pela Igreja no CIC, artigo 27, que afirma que “O desejo de Deus está inscrito no coração do homem”. A cada dia contemplo no outro, nas partilhas, em minhas próprias experiências como esse desejo é real e que de fato só iremos encontrar a felicidade plena quando estivermos em Deus. Naquela noite a música que escutava em uma rádio local, a saber, um pequeno trecho, “Fica comigo então, Não me abandona, não. Alguém te perguntou como é que foi seu dia? Uma palavra amiga, uma notícia boa. Isso faz falta no dia a dia…”, mesmo sendo tão simples e parecendo não dizer muito, me fez perceber nas suas entrelinhas a necessidade do Amor que nos ama, que se importa, cantada por aquela banda com tanta verdade. É justamente nas entrelinhas que se esconde o essencial de uma música.
Também nos afirma no CIC, no artigo 28, que “Em sua história, e até os dias de hoje, os homens têm expressado de múltiplas maneiras sua busca de Deus por meio de suas crenças e de seus comportamentos religiosos (orações, sacrifícios, cultos, meditações etc.). Apesar das ambigüidades que podem comportar, estas formas de expressão são tão universais que o homem pode ser chamado de um ser religioso” estando inclinado a voltar-se para Deus, seja de forma consciente ou não.
São inúmeras as formas que o homem, em sua capacidade, expressa essa sede de céu, do que é eterno. Gostaria de ressaltar a via da música, e de forma ainda mais específica, músicas de artistas seculares que mesmo que não admitam, não queiram, ou não saibam, expressam essa busca pelo Amado de nossas almas. Eu poderia citar muitas letras, muitos artistas, mas me detive em alguns trechos de cantores que foram marcos na música brasileira e na vida nos jovens. Ainda com a banda Charlie Brown, tendo o seu vocalista morto à tão pouco tempo, deixo aqui mais um trecho suplicante por socorro. “É quando eu volto a me lembrar do que eu pensava nem ter feito. Vem me traz aquela paz. Você procura a perfeição e eu tenho andado sob efeito, mas posso te dizer que eu já não aguento mais…”
Buscando saciar esse desejo de Deus, o homem sai em uma corrida desenfreada a procura desse Amor, de algo que o preencha e o faça sentir-se completo. Muitos chamam esse desejo de vazio, outros de solidão, outros ainda de falta de sentido de vida. Como já dizia Frejat, “Eu procuro um amor, que ainda não encontrei, diferente de todos que amei”, procuramos um Amor diferente de todos que já experimentamos; um Amor que nos ame da forma que somos e que estamos; que nos faça sentirmo-nos completos e não usados, estraçalhados; um Amor que nos lance ao outro e não em nós mesmos. Segundo C.S Lewis, “as criaturas não nascem com desejos que não podem ser satisfeitos. Um bebê sente fome: bem, existe o alimento. Um patinho gosta de nadar: existe a água. O homem sente o desejo sexual: existe o sexo. Se descubro em mim um desejo que nenhuma experiência deste mundo pode satisfazer, a explicação mais provável é que fui criado para um outro mundo.” Infelizmente nem todo homem consegue compreender de forma tão lógica e rápida, o que foi compreendido por Lewis, e achando ser desse mundo, esse desejo insaciável, o busca em milhares de coisas, frustrando-se em todas as tentativas. Como não buscamos o Amor diretamente na fonte que é o próprio Deus, vamos ajustando neste espaço coisas, pessoas, profissões, sonhos, e no final das contas nos deparamos com o mesmo vazio inicial ou até maior, fruto de experiências traumáticas e dolorosas que o mundo vai nos proporcionando.
A partir dessas frustrações, o homem começa a expressar, além do desejo de Deus, uma dor por não encontrá-lo. Perdidos da luz, vêem-se em um verdadeiro escuro, chegando a dizer, como Cássia Eller, que “Quando tá escuro. E ninguém te ouve. Quando chega a noite. E você pode chorar… Há uma luz no túnel. Dos desesperados. Há um cais de porto. Prá quem precisa chegar…” Essa luz no fim do túnel, cantada por tantos cantores, é a luz da esperança, esperança que se foi com muitos, esperança que se perdeu em meio a mortes tão trágicas. Mas essa luz existe, essa luz é o próprio Cristo gritado por tantos corações, gritos que foram sufocados pela dor, pela desesperança. Essa luz é o Cristo em sua imensa misericórdia que todos os dias vem nos encontrar e mesmo que muitos não saibam, acredito que o nosso coração anseia por Deus, anseia por ser feliz, e baterá sempre inquieto, gritando por socorro, enquanto não descansarmos Naquele que é o nosso amparo.
Por Kelyane Abreu