Formação

Matrimônio como Escola intensiva do amor de Deus

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O matrimônio é uma das melhores escolas do amor de Deus, o lugar onde Ele quer educar muitos de seus alunos.

Assim afirma Dom Cormac Burke, que atualmente ensina antropologia na Universidade Strathmore de Nairobi(Quenia).

-Quais são as «leis da felicidade» e como se encontram e vivem no matrimônio cristão?

-Dom Burke: A primeira coisa que se deve ter em conta é que o matrimônio não pode dar a felicidade perfeita, nem nada parecido aqui na terra. O propósito não é dar aos esposos essa felicidade, mas amadurecê-los para ela.

Em tudo aqui, na terra, Deus está tentando ensinar-nos a amar, o que desfrutaremos plenamente no céu. O matrimônio é uma das mais intensivas escolas de amor, onde Deus quer treinar muitos de seus alunos.

A felicidade exige um esforço. Quando uma pessoa casada em dificuldades se permite pensar: «Conseguirei o divórcio e me casarei com outro homem ou outra mulher, porque serei mais feliz com ele ou com ela», está dizendo na realidade, «minha felicidade depende de que não me seja pedido demais. Serei feliz só se não tenho que fazer muito esforço para amar».

A pessoa que escolhe pensar assim nunca pode ser feliz, porque a felicidade é sobretudo uma conseqüência de dar-se, como dizem os Atos dos Apóstolos (20, 35): «Há mais felicidade em dar que em receber».

A felicidade não é possível nem dentro nem fora do matrimônio para aquela pessoa que está determinada a conseguir mais do que ele ou ela esteja disposto a dar.

No matrimônio, portanto, tem que se aprender a amar. Se a pessoa não aprende, seguirá apegada a seu egoísmo, como o diabo ou a alma no inferno. Contudo, o matrimônio é uma instituição divina que gradualmente os tirará desse egoísmo.

Também se tem que empenhar nesta tarefa, que é inscrever-se de forma definitiva nesta escola de amor. Se só se prepara somente para dar amor com um único intento e abandonar se não parece que funciona, não funcionará, nem nunca se converterá em uma pessoa capaz de amar.

-Como consegue, aprofunda, amadurece e faz permanente no matrimônio a felicidade pessoal de cada um?

-Dom Burke: Sobretudo saindo de nós mesmos. Nunca conseguiremos começar este caminho de felicidade até que sejamos conscientes de que o principal obstáculo somos nós mesmos –nossas preocupações, inquietudes e cálculos centrados em nós mesmos. Paradoxalmente tudo isto é obstáculo para nossa felicidade pessoal.

Para o cristão, este paradoxo não deveria ser difícil de entender, porque vem do ensinamento do coração de Cristo sobre aqueles que salvam suas vidas de modo egoísta e calculador: «Quem quiser salvar sua vida a perderá; e quem a perde por minha causa, a encontrará». A frase «por minha causa» aponta o que é bom, generoso, puro e meritório.

Um dos erros modernos mais comuns é pensar que a felicidade vem do cálculo. Pensamos que nossa felicidade depende de considerar as coisas de maneira inteligente e cuidadosa: «Mais disto, menos disto, far-me-á feliz?»; não é assim. A felicidade pessoal e a felicidade no matrimônio dependem principalmente da generosidade e do sacrifício.

-Como podem os filhos trazer felicidade ao matrimônio e a cada um dos esposos individualmente?

-Dom Burke: Este século veio a separar e opor plenitude matrimonial e filhos. Muitos olham o matrimônio de maneira como os filhos são considerados como uma possível vantagem ou um possível obstáculo ao cumprimento pessoal. Isto é fundamentalmente não confiar no desenho de Deus para o matrimônio.

Quem se casa necessita ponderar que cada filho é um presente totalmente único e irrepetível para a união dos esposos. Também necessitam dar-se conta de que os filhos desafiam a capacidade de amar de cada um dos esposos ainda mais que a vida conjugal em si mesma. Só a pessoa que está preparada para fazer frente aos desafios do amor crescerá no amor.

Quarenta anos colocando ênfase na auto-realização ou no conforto material foram acompanhados de uma ênfase similar em limitar a família.

Os filhos –um ou dois, na maior parte dos casos– viram-se considerados como «extras opcionais» para um casal, não como o cumprimento natural de suas aspirações matrimoniais. Emprego, status, vida social, ocupações, férias, tranqüilidade e conforto parecem oferecer mais felicidade que os filhos.

Contudo, se julga-se pelo crescente número de lares destruídos, menos filhos não parece que tenha levado a uma maior estabilidade, plenitude ou felicidade matrimoniais. Os casais católicos se viram também profundamente afetados pela mentalidade da planificação familiar, até o ponto que se apresenta uma família «planificada» como a norma na instrução pré-matrimonial. Provavelmente a maioria de nossos jovens se case hoje considerando a planificação natural como uma parte normal do matrimônio; muitos, para os que nunca se projetou, estão experimentando seus efeitos em sua vida matrimonial.

-O que pode ser obstáculo para a felicidade conjugal?

-Dom Burke: O sacramento do matrimônio dá especiais graças a um casal para perseverar na missão de cuidar um do outro e dos filhos que Deus lhes dê. Ser negligentes com o sacramento pode de fato por obstáculo a esta felicidade, porque o sacramento leva sua graça sacramental –uma ajuda específica de Deus que ajuda os casais a viver o compromisso que implica o amor matrimonial.

O matrimônio não é um sacramento ao que se «vai» com freqüência, como ocorre com a sagrada comunhão; é um sacramento que se recebe uma vez. Mas para ser fiel se necessita invocar a graça do sacramento constantemente, como um sacerdote necessita invocar o sacramento de sua ordenação.

-Como contribui a «teologia do corpo» de João Paulo II à felicidade conjugal?

-Dom Burke: O Papa João Paulo II apresenta o corpo como um instrumento de comunhão interpessoal, ensinando que isto é verdade quando se respeita o pleno significado humano do corpo e da relação intercorporal, o que não faz a anticoncepção. Anular deliberadamente a orientação à vida do ato conjugal é destruir seu poder essencial de significar união.

A anticoncepção nega a «linguagem do corpo». Volta o ato conjugal em autodecepção, ou em uma mentira mútua entre os próprios esposos; aquele que verdadeiramente não se está doando, na realidade não está aceitando o outro.

-Que papel desempenha a liberdade no matrimônio?

-Dom Burke: Muitos consideram hoje que se ater em uma eleição irrevogável leva a perder a própria liberdade. Não é assim. Casar-se é confiar em si mesmo em um exercício constante e amoroso da liberdade.

Que classe de amor é o que prefere deixar uma «saída» sempre aberta? A pessoa verdadeiramente enamorada não teme perder sua liberdade, mas perder seu amor. Não é a liberdade para comprometer-se o que se deve temer, senão a liberdade de respaldar o próprio compromisso.

A liberdade que deveria assustar-nos é a liberdade de ser infelizes –que nos acompanha até o fim. Por isso o amante humilde sente a necessidade de orar, «Senhor, faz-me fiel».

E é também pelo que os que se retiram estão tristes, porque não só abandonaram a quem deveriam amar, também se abandonaram a si mesmos. Não há caminho fácil para a felicidade. Aqueles que buscam o divórcio devido às dificuldades que implica o matrimônio estão simplesmente sendo burlados pelo que implica a felicidade. Estão pondo-se no caminho que conduz longe da felicidade.

-Como pode levar os casais à verdadeira felicidade o seguimento dos ensinamentos da Igreja sobre o matrimônio, os filhos e a anticoncepção?

-Dom Burke: Se um casal não observa os ensinamentos da Igreja pode parecer feliz hoje, provavelmente a sua é uma felicidade muito superficial com uma grande parte de egoísmo por conquistar. E há poucas possibilidades de que sejam felizes amanhã.

Em contraste com isto, também há hoje muitos casais que tentam estar incondicionalmente nas mãos de Deus, aceitando tanto que seu matrimônio «durará» como que Deus é o melhor planificador familiar natural. Deus é quem tem mais conhecimento e mais longa experiência, quem melhor conhece a resposta à pergunta: «Quantos filhos podem coroar nosso projeto familiar?».

Quando se olha a questão da felicidade desde um ponto de vista puramente individual e, em última instância, com preocupação por si mesmo, será difícil que se compreenda todo o positivo que há no ensinamento da Igreja. A felicidade de um cristão reside também em ser partícipe nos planos de Deus. O sentido deste privilégio tem que estar na raiz de nossa felicidade.

Os casais casados de hoje necessitam ter mais consciência do maravilhoso testemunho que estão chamados a dar ao mundo que não confia em Deus. O Papa João Paulo II escrevia na «Familiaris Consortio» que «dar testemunho do inestimável valor da indissolubilidade e fidelidade matrimonial é um dos deveres mais preciosos e urgentes dos casais cristãos de nosso tempo».

A indissolubilidade e a procriação são dois grandes valores do matrimônio que são vistos hoje como cargas negativas, quando são as chaves para a verdadeira plenitude e felicidade. Um casal unido e feliz é um testemunho da possibilidade e o valor de um amor inquebrantável, assim como uma família unida e feliz é um testemunho da benção dos filhos.


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