Os filhos nascem, mas antes de virem ao mundo, antes de serem concebidos no ventre materno, eles foram sonhados, amados e desejados pelo Pai que criou cada um de nós e nos separou para uma missão (como dito em Jeremias 1,5). E assim, desde sempre, os novos seres humanos, dotados de almas eternas e com vocação para o céu são considerados bençãos.
Na minha profissão, tenho a oportunidade de observar vários milagres acontecerem através da maternidade: Os filhos são capazes de mudar a história, mesmo que passem pouco tempo entre nós! Muitas mulheres, vêm ao consultório, após uma perda gestacional, testemunhando que nunca tiveram o desejo da maternidade, mas aquela experiência fez com que elas olhassem o mundo de outra forma, e vissem o sentido maior da vida, do amor e do Amor que gera vida.
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A partir de então desejaram buscar respostas para perda pois gostariam de gerar filhos que pudessem criar. Aquelas mulheres se tornaram mães e foram verdadeiramente abençoadas! Por isso, por mais curta que tenha sido a vida, aquele filho, tão digno quanto qualquer outro que ela venha a ter, cumpriu sua missão de transformar o sentimento de quem o gerou.
Doutora, meus filhos me salvaram!
Muitas vezes achamos que não é a hora certa para a maternidade no nosso casamento, e em meio a grandes batalhas, Deus permite que uma criança venha ao mundo. Certo dia, trabalhando em uma emergência do SUS, durante uma cesariana de urgência, observei nos braços abertos e estendidos da mãe que dava à luz, várias cicatrizes típicas de alguém que um dia se automutilou. Após finda a cirurgia, busquei a paciente para oferecer ajuda.
Perguntei então quantos filhos ela tinha e a idade do mais velho. Ela me respondeu que tinha três filhos e o mais velho com seis anos. Então questionei se ela se importaria de me dizer quando foi a última vez que ela havia deixado uma marca em seus braços… com um largo sorriso, ela me respondeu: 7 anos! E completou: “Doutora, meus filhos me salvaram”.
O Pai sabe o que precisamos
E os filhos especiais? Quantos de nós não deixamos de nos abrir à vida porque já “passamos da idade” e correríamos o risco de ter um filho com problemas. Outra noite atendi uma mulher em trabalho de parto que cheirava a cigarro e não havia, se quer, feito o pré-natal. Ela deu à luz a um filho que nasceu com coração parado e precisaria de cuidados especiais, ele foi pra UTI após a reanimação. Aquela mulher que já era mãe de outras duas crianças aos 24 anos, passava mais de uma semana sem visitar seu filho no hospital.
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O conselho tutelar foi acionado e diante do risco de perder não só aquele bebê, mas também as outras crianças, pois elas viviam largadas pelas ruas, ela, finalmente, se tornou mãe: aprendeu a cuidar e a amar, já não saía de perto do filho e todos os profissionais de saúde comentavam o quanto ela havia se tornado uma mãe dedicada. Ao final de 3 meses de internação, tiveram alta e ela também já havia aprendido a rezar. Deus permitiu que uma criança especial viesse ao mundo para transformar aquela família em família! Quem somos nós para sabermos do que precisamos? O nosso Pai que está no céu sabe e só Ele sabe.
Eu não posso ser hipócrita e falar das outras mulheres, sendo eu uma mulher e tendo quatro filhas comigo e uma no céu. Pois provei na pele a bondade e o amor do Senhor através da minha maternidade. Egoísta que sempre fui, mantinha meus olhos na terra, em experiências seculares e terceirizava a criação das minhas duas primeiras filhas às babás.
Grande missão
Então, no seminário de vida no Espírito Santo da Comunidade Católica Shalom, Deus me pediu a minha terceira filha e diante de todos os meus questionamentos sobre preço de escola, tempo para trabalhar e ganhar mais, liberdade para viajar, Deus me respondeu que a providência seria em não deixar faltar, mas também em não deixar sobrar para que eu parasse de gastar com supérfluos e conseguisse manter meu olhar no que importa, no céu! Na época foi muito impactante, pois tenho gestações de altíssimo risco de morte, para o qual não há tratamento, então a permissão da gestação era também uma oferta de vida a Deus, pois poderia morrer, e quem me pedia era o Senhor da vida e da morte!
O que eu não entendia é que essa gravidez era também a minha salvação e o início de uma grande missão. Na época, eu usava DIU (o que nunca mais aconteceu, graças a Deus), era uma ginecologista comum que prescrevia anticoncepcionais e não entendia o valor da vida, o valor dos métodos naturais no crescimento da intimidade e do amor do casal. Hoje, eu e meu marido vivemos a abertura à vida, usando os períodos infecundos e controlando as vontades, treinando a virtude da temperança, visto que a doença que pode me matar na gestação permanece. Porém hoje, sou odre novo, e cuido das minhas filhas e morro de saudade quando tenho que deixá-las para trabalhar. Uma história que, se não fosse a maternidade, jamais teria sido renovada verdadeiramente.
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Porque um filho é responsabilidade, custa tempo, preocupação, dinheiro, mas vale nosso tudo, pois ele nos salva! Nos tira do centro, de uma vida voltada para si mesmo e para o mundo e nos direciona para o outro, mas esse outro é um serzinho que amamos muito e então é a forma mais amorosa que temos de sermos formados por Deus para o céu.
Eu não sei dizer qual o número ideal de filhos, porque cada casal vive uma realidade diferente. Mas o que presencio na carne e na vida das pessoas que toco é que nenhum filho é mais do que deveria, Deus provê o que importa quando nos agarramos a Ele, porque ninguém vem ao mundo sem que seja vontade de Deus. E cada filho, cada um deles, diferentemente do outro, transforma nossa vida, sempre para o bem!
“Provei na pele a bondade e o amor do Senhor através da minha maternidade”, Melissa Abelha
Hoje trabalho com infertilidade, com aqueles casais que desejam receber e cooperar com o Criador na geração de filhos e que encontram dificuldade nisso que é seu maior desejo. O que vejo é que não somos nós que decidimos quando eles vêm encher nossa casa de alegria, mas nós podemos dar nosso sim a eles todos os dias, deixando que se cumpra em nossas vidas uma promessa que fizemos no altar: de receber todos os filhos que Deus nos mandar e educá-los para o céu.
Melissa Abelha
Discípula da Com. de Aliança e Ginecologista