Dom Benedicto de Ulhôa Vieira
AIgreja, logo após a festividade de todos os Santos, dia 1º XI, convidaa lembrarmo-nos dos que partiram desta vida e ainda precisam de nossaspreces para, purificados, serem introduzidos na visão beatifica deDeus, que chamamos céu.
Odia dos finados não precisa ser comemorado levando flores paraornamentar os túmulos ou acendendo uma vela no jazigo da pessoa que nosé saudosa. É um dia especial de, lembrando os mortos, tomarmosconsciência da transitoriedade de nossa vida terrena e de nosso destinoeterno.
Acomemoração dos que partiram desta vida nos leva à reflexão dodesapego, que a maturidade da existência inexoravelmente acarreta. Umdia temos de nos afastar das responsabilidades, dos bens, das amizades,das pessoas que amávamos e que nos amam também. Teremos que partir.
Seo partir para longe já é quase morrer um pouco – “partir c’est mourirum peu” diz o poeta francês – a despedida final dos que amamos causauma dor tão profunda que só a certeza de uma vida imorredoura nos podeconsolar. É o que a liturgia da Igreja lembra para iluminar a fé edespertar a esperança.
Daía necessidade da pedagogia do desapego no correr dos dias terrenos. Osmais velhos dão lugar aos mais novos. Os que estão à frente de umaempresa, de uma escola, de uma paróquia ou diocese cedem o posto a quemos substitua com mais vigor e mais capacidade. A lei da vida exige atransitoriedade das funções.
Acomemoração dos que se despediram da vida terrena necessariamente nosleva a pensar na vida futura, aquela que não tem fim. O coração humanoparece adivinhar que a morte não é o fim da existência, mas a passagempara uma vida melhor. A palavra de Deus é que nos dá a certeza de umavida que não tem fim.
Parece-nosàs vezes que a alma humana sente ter asas para subir, buscando espaçosmais largos e mais altos, como se fôramos pássaros que amam asalturas…
Lembra-meaqui o inspirado anseio de Tristão de Ataíde: “O que sinto são asas quepedem mais azul, são asas que pedem mais espaço, são asas que pedemmais estrelas.” E remata dizendo: “Sinto que a terra não basta paramim, pássaro do caminho.”
Alembrança dos mortos não pode ser tecida só de saudades. É por certo umconvite para subir… Nossas asas nos levam acima das estrelas. O portode chegada é o coração de Deus.