Certa vez, numa de minhas viagens missionárias, tive a graça de conhecer e conversar um pouco com uma freira de uma congregação de vida enclausurada. Na época, essa religiosa estava prestes a completar 60 anos de vida consagrada. Ao vê-la sorridente e comunicativa, eu não resisti e fiz-lhe uma pergunta. Disse: ”Irmã, me informaram que a senhora já tem mais de meio século de vida religiosa e isso é uma grande graça. A senhora poderia me dizer qual é o segredo da fidelidade? Já enfrentou alguma grande tentação?”
Essa idosa e fiel serva de Deus fechou um pouco os olhos e fez um silêncio de um minuto, mas que para mim pareceu uma eternidade. Em seguida, abriu os olhos novamente, deu-me um sorriso radiante e me respondeu: “Meu jovem, a maior tentação que podemos sofrer ou mesmo cair depois de anos de intimidade com Deus ou de vida consagrada é uma só, todas as outras tentações são filhas dessa”.
Eu arregalei os olhos e apurei os ouvidos muito mais, para não perder nada, nada mesmo. Ela, então, concluiu: “É achar que Deus não é mais novidade para nós. É achar que tudo que já vimos e ouvimos tudo sobre Ele. Como se Deus fosse um ser descodificado. Como se Deus fosse um livro que já li, como se fosse um filme que já assisti. Quando isso acontece, Jesus aparentemente se transforma apenas numa personalidade importante da história, como um Tiradentes ou um Napoleão Bonaparte, que fizeram coisas grandes, porém, ficaram sepultados e escondidos no passado. Quando Deus não é mais uma novidade para mim, a Bíblia vira somente uma literatura cheia de contos, como outra qualquer. Se Deus não é mais uma novidade para mim, a celebração da santa Missa vira uma peça de teatro que já vi uma tonelada de vezes. Se não é mais uma novidade para mim, o meu serviço na Igreja se transforma num voluntarismo vazio. E o que é pior, quando acho que Deus não é mais novidade para mim, corro um sério risco de ir buscar novidades em outros lugares, longe de Deus, da vocação e missão que ele me confiou”.
Nessa hora, a irmã me olhou e percebeu que fiquei um pouco assustado, afinal de contas, era uma religiosa experiente que estava falando. Ela, então, deu uma tapinha na minha mão e continuou: “Ao contrário, meu jovem, se Deus for uma eterna novidade na minha vida, Jesus não é apenas uma personagem importante do passado, mas uma pessoa viva, com a qual me relaciono diariamente. Alguém que é capaz de me ouvir e de me falar. Alguém que é capaz de me entender e de se compadecer de mim. Alguém que é capaz de se comprometer com as minhas dores e as dores da humanidade.
Se Deus for uma eterna novidade na minha vida, a Bíblia se revela em luz para os meus passos e lâmpada para os meus pés, base segura, onde o jovem consagrado pode construir seu futuro e o consagrado idoso encontra consolo em sua velhice ou mesmo na enfermidade. Se Deus for uma eterna novidade para mim, a celebração da santa Missa se revela como a atualização da oferta amorosa de Jesus. Se Deus for uma eterna novidade para mim, o meu serviço na Igreja se transforma num dar de graça o que de graça recebi. E o melhor, meu garoto, se Deus for uma eterna novidade para mim, jamais me sentirei tentada a ir buscar novidades em outros lugares, pois fora de Deus, da Igreja e de Sua vontade, tudo, tudo é vão. Deus é essa âncora segura, que permanece firme e imóvel enquanto o mundo gira. Fora de Deus tudo é vão”.
Desejo que essa minha partilha te ajude a entrar nesse novo ano com o renovado desejo de que Deus seja sua eterna novidade.
Um feliz e santo ano novo. Shalom!