Formação

o espírito da evangelização

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Apelo instante

74. Não quereríamos concluir este colóquio com os nossosIrmãos e Filhos muito amados, sem um instante apelo, ainda, quanto àsdisposições interiores que hão de animar os obreiros da evangelização.

Em nome do próprio Senhor Jesus Cristo, em nome dosapóstolos Pedro e Paulo, nós exortamos todos aqueles que, graças aos carismasdo Espírito Santo e ao mandato da Igreja, são verdadeiros evangelizadores, ademonstrarem-se dignos da própria vocação, a exercitarem-na sem reticênciasnascidas de dúvidas ou do medo e a não descurarem as condições que hão detornar essa evangelização, não apenas possível, mas também ativa e frutuosa.Passamos a apontar, entre muitas outras, as condições que reputamosfundamentais e que queremos pôr em realce.

Sob a inspiração doEspírito Santo

75. Nunca será possível haver evangelização sem a ação doEspírito Santo. Sobre Jesus de Nazaré, esse Espírito desceu no momento do batismo,ao mesmo tempo que a voz do Pai, "Este é o meu Filho amado, em quem mecomprazo",(107) manifestava de maneira sensível a eleição e a missão domesmo Jesus.

Depois, foi "conduzido pelo Espírito" que eleviveu no deserto o combate decisivo e superou a última prova antes de começaressa sua missão. (108) Foi "com a potência do Espírito",(109) ainda,que Jesus voltou para a Galiléia e inaugurou a sua pregação, aplicando a sipróprio a passagem de Isaías, "o Espírito do Senhor está sobre mim"."Cumpriu-se hoje, acrescentou ele, esta passagem da Escritura".(110)E aos discípulos que estava prestes a enviar, disse soprando ao mesmo temposobre eles: "Recebei o Espírito Santo".(111)

Realmente, não foi senão depois da vinda do Espírito Santo,no dia do Pentecostes, que os apóstolos partiram para todas as partes do mundoafim de começarem a grande obra da evangelização da Igreja; e Pedro explica oacontecimento como sendo a realização da profecia de Joel: "Eu efundirei omeu Espírito",(112) E o mesmo Pedro é cheio do Espírito Santo para falarao povo acerca de Jesus Filho de Deus.(113) Mais tarde, Paulo, também ele, écheio do Espírito Santo(114) antes de se entregar ao seu ministério apostólico,e do mesmo modo Estêvão, quando foi escolhido para a diaconia e algum tempodepois para o testemunho do martírio.(115) Espírito que impele Pedro, Paulo, ouos doze a falarem inspira-lhes as palavras que eles devem proferir e descetambém "sobre todos os que ouviam a sua palavra".(116)

Repleta do "conforto do Espírito Santo", a Igreja"ia crescendo".(117) Ele é a alma desta mesma Igreja. E ele que fazcom que os fiéis possam entender os ensinamentos de Jesus e o seu mistério. Eleé aquele que, hoje ainda, como nos inícios da Igreja, age em cada um dos evangelizadoresque se deixa possuir e conduzir por ele, e põe na sua boca as palavras que elesozinho não poderia encontrar, ao mesmo tempo que predispõe a alma daqueles queescutam afim de a tornar aberta e acolhedora para a Boa Nova e para o reinoanunciado.

 

As técnicas da evangelização são boas, obviamente; mas,ainda as mais aperfeiçoadas não poderiam substituir a ação discreta do EspíritoSanto. A preparação mais apurada do evangelizador nada faz sem ele. De igualmodo, a dialética mais convincente, sem ele, permanece impotente em relação aoespírito dos homens. E, ainda, os mais bem elaborados esquemas com basesociológica e psicológica, sem ele, em breve se demonstram desprovidos devalor.

Nós vivemos na Igreja um momento privilegiado do Espírito.Procura-se por toda a parte conhecê-lo melhor, tal como a Escritura o revela.De bom grado as pessoas se colocam sob a sua moção.

Fazem-se assembléias em torno dele. Aspira-se, enfim, adeixar-se conduzir por ele. É um fato que o Espírito de Deus tem um lugareminente em toda a vida da Igreja; mas, é na missão evangelizadora da mesmaIgreja que ele mais age. Não foi por puro acaso que a grande balada para aevangelização sucedeu na manhã do Pentecostes, sob a inspiração do Espírito.Pode-se dizer que o Espírito Santo é o agente principal da evangelização: éele, efetivamente que impele para anunciar o Evangelho, como é ele que nos maisíntimo das consciências leva a aceitar a Palavra da salvação.(118) Mas pode-sedizer igualmente que ele é o termo da evangelização: de fato, somente elesuscita a nova criação, a humanidade nova que a evangelização há de ter comoobjetivo, com a unidade na variedade que a mesma evangelização intenta promoverna comunidade cristã. Através dele, do Espírito Santo, o Evangelho penetra nocoração do mundo, porque é ele que faz discernir os sinais dos tempos, ossinais de Deus, que a evangelização descobre e valoriza no interior dahistória.

O Sínodo dos Bispos de 1974, que insistiu muito no lugar doEspírito Santo na evangelização, exprimiu também o voto de que Pastores eteólogos, e nós acrescentaremos ainda os fiéis marcados com o selo do Espíritopelo batismo, estudem melhor a natureza e os modos da ação do Espírito Santo naevangelização, em nossos dias. Fazemos nosso também este voto, ao mesmo tempoque exortamos os evangelizadores, sejam eles quem forem, a pedir sem cessar aoEspírito Santo fé e fervor, bem como a deixarem-se prudentemente guiar por ele,qual inspirador decisivo dos seus planos, das suas iniciativas e da suaatividade evangelizadora.

Testemunhasautênticas

76. Consideramos agora, brevemente, a própria pessoa dosevangelizadores.

Ouve-se repetir, com freqüência hoje em dia, que este nossoséculo tem sede de autenticidade. A propósito dos jovens, sobretudo, afirma-seque eles têm horror ao fictício, aquilo que é falso e que procuram, acima detudo, a verdade e a transparência.

Estes "sinais dos tempos" deveriam encontrar-nosvigilantes. Tacitamente ou com grandes brados, sempre porém com grande vigor,eles fazem-nos a pergunta: Acreditais verdadeiramente naquilo que anunciais?Viveis aquilo em que acreditais? Pregais vós verdadeiramente aquilo que viveis?

 

Mais do que nunca, portanto, o testemunho da vida tornou-seuma condição essencial para a eficácia profunda da pregação. Sob este ângulo,somos, até certo ponto, responsáveis pelo avanço do Evangelho que nósproclamamos.

O que é feito da Igreja passados dez anos após o final doConcílio?, perguntávamos nós, não princípio desta meditação. Acha-se elaradicada no meio do mundo e, não obstante livre e independente para interpelaro mesmo mundo? Testemunha ela solidariedade para com os homens e, ao mesmotempo, o absoluto de Deus? É ela hoje mais ardorosa quanto à contemplação e àadoração, e mais zelosa quanto à ação missionária, caritativa e libertadora?Acha-se ela cada vez mais aplicada nos esforços por procurar a recomposição daunidade plena entre os cristãos, que torna mais eficaz o testemunho comum, afimde que o mundo creia? (119) Todos somos responsáveis das respostas que sepossam dar a estas interrogações.

Exortamos, pois, os nossos Irmãos no episcopado,constituídos pelo Espírito Santo para governar a Igreja;(120) exortamos ossacerdotes e diáconos, colaboradores dos Bispos no congregar o povo de Deus ena animação espiritual das comunidades locais; exortamos os religiosos,testemunhas de uma Igreja chamada à santidade e, por isso mesmo, convidadoseles próprios para uma vida que testemunhe as bem-aventuranças evangélicas;exortamos os leigos, e com estes, as famílias cristãs, os jovens e os adultos,todos os que exercem uma profissão, os dirigentes, sem esquecer os pobres,quantas vezes ricos de fé e de esperança, enfim, todos os leigos conscientes doseu papel evangelizador ao serviço da sua Igreja ou no meio da sociedade e domundo; e a todos nós diremos: É preciso que o nosso zelo evangelizador brote deuma verdadeira santidade de vida, alimentada pela oração e sobretudo pelo amorà eucaristia, e que, conforme o Concílio no-lo sugere, a pregação, por sua vez,leve o pregador a crescer em santidade.(121)

O mundo que, apesar dos inumeráveis sinais de rejeição deDeus, paradoxalmente, o procura entretanto por caminhos insuspeitados e quedele sente bem dolorosamente a necessidade, o mundo reclama evangelizadores quelhe falem de um Deus que eles conheçam e lhes seja familiar como se eles vissemo invisível.(122) O mundo reclama e espera de nós simplicidade de vida,espírito de oração, caridade para com todos, especialmente para com ospequeninos e os pobres, obediência e humildade, desapego de nós mesmos erenúncia. Sem esta marca de santidade, dificilmente a nossa palavra fará a suacaminhada até atingir o coração do homem dos nossos tempos; ela corre o riscode permanecer vã e infecunda.

Artífices da unidade

77. A força da evangelização virá a encontrar-se muitodiminuída se aqueles que anunciam o Evangelho estiverem divididos entre si, portoda a espécie de rupturas. Não residirá nisso uma das grandes adversidades daevangelização nos dias de hoje? Na realidade, se o Evangelho que nós apregoamosse apresenta vulnerado por querelas doutrinais, polarizações ideológicas, oucondenaçães recíprocas entre cristãos, ao capricho das suas maneiras de verdiferentes acerca de Cristo e acerca da Igreja e mesmo por causa das suas concepçõesdiversas da sociedade e das instituições humanas, como não haveriam aqueles aquem a nossa pregação se dirige vir a encontrar-se perturbados, desorientados,se não escandalizados?

 

O testamento espiritual do Senhor diz-nos que a unidadeentre os fiéis que o seguem, não somente é a prova de que nós somos seus, mastambém a prova de que ele foi enviado pelo Pai, critério de credibilidade dosmesmos cristãos e do próprio Cristo.

Como evangelizadores, nós devemos apresentar aos fiéis deCristo, não já a imagem de homens divididos e separados por litígios que nadaedificam, mas sim a imagem de pessoas amadurecidas na fé, capazes de seencontrar para além de tensões que se verifiquem, graças à procura comum,sincera e desinteressada da verdade. Sim, a sorte da evangelização anda semdúvida ligada ao testemunho de unidade dado pela Igreja. Nisto há de ser vistauma fonte de responsabilidade, como também de reconforto.

Quanto a este ponto, nós quereríamos insistir sobre o sinalda unidade entre todos os cristãos, como via e instrumento da evangelização. Adivisão dos cristãos entre si é um estado de fato grave, que chega a afetar aprópria obra de Cristo. O Concílio Ecumênico Vaticano II afirma com justeza ecom firmeza que ela "prejudica a santíssima causa de pregar o Evangelho atoda a criatura e fecha a muitos o acesso à fé".(123) por isso mesmo, aoproclamar o Ano Santo consideramos necessário recordar a todos os fiéis domundo católico que "a reconciliação de todos os homens com Deus, nosso Pai,pressupõe o estabelecimento da comunhão plena entre aqueles que já reconhecerame acolheram, pela fé, Jesus Cristo como o Senhor da misericórdia, que libertatodos os homens e os une no Espírito de amor e de verdade".(124)

É com um grande sentimento de esperança que nós vemos osesforços que estão a ser envidados no mundo cristão para tal recomposição daplena unidade querida por Cristo. E São Paulo assegura-nos que "aesperança não desilude".(125)

Assim, ao mesmo tempo que continuamos a trabalhar a fim deobter do Senhor a plena unidade, queremos que se intensifique a oração nessemesmo sentido. Ademais fazemos nosso o voto dos Padres da terceira AssembléiaGeral do Sínodo dos Bipos, isto é, que se colabore com maior empenho com osirmãos cristãos com os quais não estamos ainda unidos por uma comunhãoperfeita, baseando-se sobre o fundamento do batismo e sobre o patrimônio de féque é de todos, para dar daqui por diante mais amplo testemunho comum de Cristodiante do mundo. A isso nos impele a mandamento do Cristo, exige-o a obra depregar e de dar testemunho do Evangelho.

Servidores da verdade

78. O Evangelho de que nos foi confiado o encargo é tambémpalavra da verdade. Uma verdade que torna livres(126) e que é a única coisa quedá a paz do coração, é aquilo que as pessoas vêm procurar quando nós lhesanunciamos a Boa Nova. Uerdade sobre Deus, verdade sobre o homem e sobre o seumisterioso destino e verdade sobre o mundo. Dificil verdade que nós procuramosna Palavra de Deus e da qual nós somos, insistimos ainda, não os árbitros nemos proprietários, mas os depositários, os arautos e os servidores.

Espera-se de todo o evangelizador que ele tenha o culto daverdade, tanto mais que a verdade que ele aprofunda e comunica, outra coisa nãoé senão a verdade revelada; e, por isso mesmo, mais do que qualquer outra,parcela daquela verdade primária que é o próprio Deus. O pregador do Evangelhoterá de ser, portanto, alguém que, mesmo à custa da renúncia pessoal e dosofrimento, procura sempre a verdade que há de transmitir aos outros. Elejamais poderá trair ou dissimular a verdade, nem com a preocupação de agradaraos homens, de arrebatar ou de chocar, nem por originalidade ou desejo de darnas vistas. Ele não há de evitar a verdade e não há de deixar que ela se obscureçapela preguiça de a procurar, por comodidade ou por medo; não negligenciaránunca o estudo da verdade. Mas há de servi-la generosamente, sem a escravizar.

Enquanto Pastores do povo fiel, o nosso serviço pastoralobriga-nos a preservar, defender e comunicar a verdade, sem olhar asacrifícios. Tantos e tantos Pastores eminentes e santos nos deixaram oexemplo, em muitos casos heróico, deste amor à verdade. E o Deus da verdadeespera de nós precisamente que sejamos os defensores vigilantes e pregadoresdevotados dessa mesma verdade.

Quer sejais doutores, teólogos, exegetas ou historiadores, aobra da evangelização precisa de todos vós, do vosso labor infatigável depesquisa e também da vossa atenção e delicadeza na transmissão da verdade, daqual os vossos estudos vos aproximam, mas que permanece sempre maior do que ocoração do homem, porque é a mesma verdade de Deus.

Pais e mestres, a vossa tarefa, que os múltiplos conflitosatuais não tornam fácil, é a de ajudar os vossos filhos e os vossos discípulosna descoberta da verdade, incluindo a verdade religiosa e espiritual.

Animados pelo amor

79. A obra da evangelização pressupõe no evangelizador umamor fraterno, sempre crescente, para com aqueles a quem ele evangeliza. Aquelemodelo de evangelizador que é o apóstolo Paulo escrevia aos tessalonicensesestas palavras que são para todos nós um programa: "Tanto bem vosqueríamos que desejávamos dar-vos não somente o evangelho de Deus, mas até aprópria vida, de tanto amor que vos tínhamos",(127) E de que gênero é essaafeição? Muito maior do que aquela que pode ter um pedagogo, é a afeição de umpai, e mais ainda, a de uma mãe.(128) É uma afeição assim, que o Senhor esperade cada pregador do Evangelho e de cada edificador da Igreja.

Será um sinal de amor a preocupação de comunicar a verdade ede introduzir na unidade. Será igualmente um sinal de amor devotar-se semreservas e sem subterfúgios ao anúncio de Jesus Cristo.

E acrescentamos ainda mais alguns outros sinais deste amor.O primeiro é o respeito pela situação religiosa e espiritual das pessoas a quemse evangeliza: respeito pelo seu ritmo que não se tem o direito de forçar paraalém da justa medida; e respeito pela sua consciência e pelas suas convicções.Elas hão de ser tratadas sem dureza.

Um outro sinal deste amor é a preocupação por não feriroutrem, sobretudo se esse outrem é débil na sua fé,(129) com afirmações quepodem ser claras para os iniciados, mas para os simples fiéis podem tornar-sefonte de perturbação e de escândalo, como se fosse uma ferida na alma.

 

Será também um sinal de amor o esforço para transmitir aoscristãos, não dúvidas ou incertezas nascidas de uma erudição mal assimilada,mas certezas sólidas, porque ancoradas na Palavra de Deus. Sim, os fiéisprecisam dessas certezas para a sua vida cristã, eles têm mesmo direito a elas,na medida em que são filhos de Deus, que se abandonam inteiramente nos seusbraços, às exigências do amor.

Com o fervor dossantos

80. Um outro nosso apelo, aqui neste ponto, inspira-se nofervor que se pode observar sempre na vida dos grandes pregadores eevangelizadores, que se consagraram ao apostolado. Entre estes, apraz-nosrealçar, particularmente, aqueles que, no decorrer deste Ano Santo, nós tivemosa dita de propor à veneração dos fiéis. Eles souberam superar muitos obstáculosque se opunham à evangelização.

De tais obstáculos, que são também dos nossos tempos,limitar-nos-emos a assinalar a falta de fervor, tanto mais grave por isso mesmoque provém de dentro, do interior de quem a experimenta. Essa falta de fervormanifesta-se no cansaço e na desilusão, no acomodamento e no desinteresse e,sobretudo, na falta de alegria e de esperança em numerosos evangelizadores. Eassim, nós exortamos todos aqueles que, por qualquer título e em alguma escala,têm a tarefa de evangelizar, a alimentarem sempre o fervor espiritual.(130)

Este fervor exige, antes de mais nada, que nós saibamosbanir os álibis que pretendessem opor-se à evangelização. Os mais insidiosossão certamente aqueles para os quais se presume encontrar um apoio neste ounaquele ensinamento do Concílio.

É assim que se ouve dizer, demasiado freqüentemente, sobdiversas formas: impor uma verdade, ainda que seja a verdade do Evangelho,impor um caminho, ainda que seja o da salvação, não pode ser senão umaviolência à liberdade religiosa. De resto, acrescenta-se ainda: Para queanunciar o Evangelho, uma vez que toda a gente é salva pela retidão do coração?E sabe-se bem, além disso, que o mundo e a história estáo cheios de sementes daPalavra. Não será, pois, uma ilusão o pretender levar o Evangelho aonde ele jáse encontra, nestas sementes que o próprio Senhor aí lançou?

Quem quer que se dê ao trabalho de aprofundar, nos mesmosdocumentos conciliares, os problemas em base aos quais esses álibis são formulados,de maneira demasiado superficial, encontrará uma visão totalmente diversa darealidade.

É claro que seria certamente um erro impor qualquer coisa àconsciência dos nossos irmãos. Mas propor a essa consciência a verdadeevangélica e a salvação em Jesus Cristo, com absoluta clareza e com todo orespeito pelas opções livres que essa consciência fará, e isso, sem pressõescoercitivas, sem persuações desonestas e sem aliciá-la com estímulos menosretos,(131) longe de ser um atentado à liberdade religiosa, é uma homenagem aessa liberdade, à qual é proporcionado o escolher uma via que mesmo osnão-crentes reputam nobre e exaltante. Será então um crime contra a liberdadede outrem o proclamar com alegria uma Boa Nova que se recebeu primeiro, pelamisericórdia do Senhor? (132) Ou por que, então, só a mentira e o erro, adegradação e a pornografia, teriam o direito de serem propostos e cominsistência, infelizmente, pela propaganda destrutiva dos "massmedia", pela tolerância das legislações e pelo acanhamento dos bons e peloatrevimento dos maus? Esta maneira respeitosa de propor Cristo e o seu reino,mais do que um direito, é um dever do evangelizador. E é também um direito doshomens seus irmãos o receber dele o anúncio da Boa Nova da salvação. Esta salvação,Deus pode realizá-la em quem ele quer por vias extraordinárias que somente eleconhece.(133) E entretanto, se o seu Filho veio, foi precisamente para nosrevelar, pela sua palavra e pela sua vida, os caminhos ordinários da salvação.E ele ordenou-nos transmitir aos outros essa revelação, com a sua própriaautoridade.

Sendo assim, não deixaria de ter a sua utilidade que cadacristão e cada evangelizador aprofundasse na oração este pensamento: os homenspoderão salvar-se por outras vias, graças à misericórdia de Deus, se nós nãolhes anunciarmos o Evangelho; mas nós, poder-nos-emos salvar se, pornegligência, por medo ou por vergonha, aquilo que São Paulo chamava exatamente"envergonhar-se do Evangelho",(134) ou por se seguirem idéias falsas,nos omitirmos de o anunciar? Isso seria, com efeito, trair o apelo de Deus que,pela voz dos ministros do Evangelho, quer fazer germinar a semente; e dependeráde nós que essa semente venha a tornar-se uma árvore e a produzir todo o seufruto.

Conservemos o fervor do espírito, portanto; conservemos asuave e reconfortante alegria de evangelizar, mesmo quando for preciso semearcom lágrimas! Que isto constitua para nós, como para João Batista, para Pedro epara Paulo, para os outros apóstolos e para uma multidão de admiráveisevangelizadores no decurso da história da Igreja, um impulso interior queninguém nem nada possam extinguir. Que isto constitua, ainda, a grande alegriadas nossas vidas consagradas. E que o mundo do nosso tempo que procura, ora naangústia, ora com esperança, possa receber a Boa Nova dos lábios, não deevangelizadores tristes e descoroçoados, impacientes ou ansiosos, mas sim deministros do Evangelho cuja vida irradie fervor, pois foram quem recebeuprimeiro em si a alegria de Cristo, e são aqueles que aceitaram arriscar a suaprópria vida para que o reino seja anunciado e a Igreja seja implantada no meiodo mundo.

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