No dia de hoje, Quinta-feira Santa, recordamos e celebramos a última ceia do Senhor com seus apóstolos.
Essa é a semana da recriação. O pecado nos dividiu interiormente mas a Obra de Jesus nos recria. O sangue de Jesus é superior ao sangue de Abel: este clamava por vingança enquanto o sangue de Jesus clamava por misericórdia.
Essa semana celebramos o tema central da nossa fé: a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo.
Hoje meditamos o mistério da Eucaristia. Na fé mistério não é um enigma que não pode ser decifrado mas é algo que só se entende com o olhar espiritual. Esse mistério podemos tocar aqui na Terra mas não ainda em plenitude.
A Eucaristia é dom do Pai que doa seu Filho
Uma liturgia, três personagens: Judas, Pedro e João
Na liturgia de hoje temos a oportunidade de meditar sobre três personagens e a forma como se relacionaram como o Senhor.
1º. Judas – ele tinha um coração marcado pelo egoísmo e pelo orgulho. Uma antiga tradição da Igreja diz que Judas era apegado a uma visão de um Messias político e devido ao orgulho não admitia mudar essa mentalidade. Judas também se negava a se abaixar e a servir aos outros como Jesus fez ao lavar os pés dos apóstolos.
2º. Pedro – sabemos que Pedro negou Jesus poucas horas depois daquela ceia. Pedro tinha o coração cheio de espinhos, como diz a parábola do semeador. O coração de Pedro tinha boa vontade, acolhia os ensinamentos de Jesus e tinha muita iniciativa, era muito enérgico. Mas diante das dificuldades suas boas intenções estremeciam e eram abafadas. Quando foi confrontado pelos guardas, Pedro negou Jesus diante de uma situação de ameaça, mesmo que, na sua intrepidez, tivesse jurado nunca fazer isso.
3º. João- esse é aquele que escolheu um outro lugar: escolheu reclinar sua cabeça no peito de Jesus para permanecer no Seu amor. Em Jo 15, 9 vemos essa frase: “permanecei no meu amor”. No original em grego, essa palavra “permanecer” significa mais do que simplesmente “ficar”; significa ter intimidade. Portanto João foi aquele que escolheu estar na intimidade do coração de Jesus.
“Em Jo 15, 9 vemos: “permanecei no meu amor”. No original em grego, “permanecer” significa mais do que simplesmente “ficar”; significa ter intimidade. Portanto João foi aquele que escolheu estar na intimidade do coração de Jesus.”
É dessa forma que nós vamos acolher a obra do Senhor em nossa vida e é preciso que colaboremos, que demos passos nessa direção..
Na última ceia e na celebração da Quinta-feira santa, encontramos a forma de acolher essa obra de salvação, e é a Eucaristia.
A instituição da Eucaristia
O Papa Francisco tem uma frase que diz “a Eucaristia não é o prêmio dos Santos mas é o pão dos fracos” . A Eucaristia é o remédio para nosso egoísmo, nosso orgulho, nossa inconstância e nossas negações. É nela que nós fazemos a nossa passagem, a nossa Páscoa do velho para o novo, do egoísmo para a oferta, da inconstância para a perseverança.
Na 1ª leitura da liturgia de hoje vemos Ex 12, 1-8.11-14. a instituição da páscoa dos judeus. A saída do Egito é um evento fundamental no Antigo Testamento. Os hebreus foram levados a comer às pressas porque a passagem que Deus prometera já estava acontecendo naquele momento. A libertação do povo é celebrada, antes mesmo de ter o seu ápice, através de uma ceia onde os hebreus comem o cordeiro do sacrifício e pães sem fermento.
Essa ceia se tornou um memorial da grandiosa obra de libertação que Deus tinha feito em favor do povo. Porém o povo, depois de liberto e uma vez no deserto, começou a murmurar. O próximo passo era inevitavelmente cair em pecado maiores. Entretanto, quando o povo pecava, eles se lembravam do memorial e isso atualizava no coração deles a libertação da escravidão.
No Novo Testamento, o evento fundamental é a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo. Esse evento também foi celebrado antecipadamente com uma ceia. A Eucaristia é o memorial vivo e atualizado, em nossa vida, da salvação do Senhor. Ele é o novo cordeiro sem mancha, aquele que realiza nossa passagem da escravidão para uma vida nova. E isso é atualizado sempre que participamos da ceia, do banquete eucarístico na missa.
Na Eucaristia nós nos unimos à Jesus na Cruz para ressuscitarmos com Ele. Santo Tomás de Aquino dizia uma frase que hoje é parte de uma oração específica para o momento antes de comungarmos: “Dai-me [Pai] que receba não só o Sacramento do Corpo e Sangue do Senhor, mas também o seu efeito e a sua força.” – força essa que vem do seu amor sem limites e das suas graças ilimitadas.. Não basta comungarmos do corpo e sangue de Jesus precisamos comungar também da sua força, mas isso só acontece quando nós pedimos.
A relação Espírito Santo e Eucaristia
Por isso precisamos nos aproximar da Eucaristia pedindo sobre nós o Espírito Santo. Esse, tantas vezes representado pelas línguas de fogo, é a mesma chama que queimou os lábios do profeta Isaías purificando-os para o profeta exercer sua missão. De forma semelhante, o Espírito Santo vem gerar em nós uma queimadura esponsal, que nos enche de amor e nos permite nos aproximar da Eucaristia com melhor disposição interior.
Percebemos uma relação próxima entre a Eucaristia e também em outros dois momentos da Celebração Eucarística: o primeiro é pouco depois do ofertório, quando, na oração eucarística, o sacerdote suplica que o Pai mande o Espírito Santo para santificar as ofertas, a fim de que elas se tornem no corpo e sangue de Cristo; o segundo é quando o sacerdote suplica o Espírito Santo sobre a assembleia, pedindo pela sua unidade, ao que a assembleia responde (costumeiramente ) “o Espírito nos una em um só corpo!”
Esse é o poder do Espírito Santo: tornar todos os cristãos em um só corpo sacramental – a Igreja, do qual Cristo é a cabeça. Assim caem os muros da inimizade e a graça da união acontece.
Através da Eucaristia os traços de Jesus são postos no nosso coração. Vamos aos poucos nos tornando iguais a ele em suas virtudes. E uma dos traços que obtemos de Jesus e que celebramos de forma especial na Quinta-feira Santa, é o traço da caridade. No lava-pés Jesus ensinou a caridade se abaixando para lavar os pés de todos – até mesmo de Judas. Jesus tendo amado os seus, amou-os até o fim. Pelo exemplo de Jesus e pela comunhão da Eucaristia, somos chamados a agir de modo semelhante.
Nesse 1º dia do Tríduo Pascal, entreguemos todo o nosso ser a Cristo, procuremos nos aproximar da Eucaristia cheios da sede de amor propiciada pela chama do Espírito Santo, e deixemos que essa mesma Eucaristia, nos cristificando cada vez mais, faça que nos tornemos um com nossos irmãos.”
Marcos Lopes (Marquinhos), seminarista, consagrado da Comunidade de Vida,
transcrito por Maria do Socorro Sobreira