Um missionário, um consagrado é um ser humano como qualquer outro. Isso significa que os anos também chegam para ele. Junto com esses anos, aparecem os frutos de uma vida dedicada e ofertada a Deus, mas surgem também as consequências naturais em seu corpo e em áreas emocionais e até espirituais.
Diferente de um profissional qualquer do meio secular, não existe aposentadoria na vida missionária e consagrada a Deus. Claro, mudará talvez o modo de continuar servindo, trabalhando e se doando, no entanto, o missionário continuará sempre atuante. Sua oferta continuará frutificando, ainda que seja na forma de um testemunho silencioso e louco aos olhos do mundo, porém, mais reluzente e agradável aos olhos de Deus do que o anterior.
Jesus era muito consciente desses e outros desafios que seus escolhidos teriam que enfrentar no desempenho da missão, por isso não os iludiu ao dizer: “Aquele que quiser me seguir, negue-se a si mesmo e tome sua cruz e me siga, pois quem quiser salvar sua vida vai perder e quem perder vai ganhar” (Lc 9,23). O que significa esse: “Negue-se a si mesmo e tome sua cruz”?
Tomar a cruz significa abraçar uma íntima comunhão de vida e missão com Jesus, o Shalom do Pai, a paz completa. Essa tomada de cruz por amor, efetiva-se nesse: “Negue-se a si mesmo”. Dificilmente alguém conseguiria tomar a cruz com as exigências que esse ato supõe se antes não negasse a si mesmo. Por isso, essas declarações do Mestre a respeito da cruz parecem definir bem o perfil de seus verdadeiros servos, ou seja, daqueles que abraçaram sua mensagem de salvação (cf.Jo 19,17).
Hoje em dia, devido ao avanço das filosofias políticas e do acesso às informações e aos meios de comunicação, não é mais tão comum, pelo menos na maioria dos países globalizados, as pessoas serem assassinadas por causa da fé em Deus e da mensagem de Jesus. Porém, as cruzes, os martírios e os sofrimentos podem aparecer de outras formas. Entre essas, umas das que poderíamos destacar como mais desafiantes são as enfermidades. Jovens ou idosos, mesmo nós missionários, pessoas de fé, em algum momento da vida, com exceção de uma eventual morte súbita ou por acidente, viveremos a prova da enfermidade.
Mesmo enfermo, eu sou guerreiro!
Quando isso acontecer, precisaremos buscar em Deus a graça de jamais nos deixar derrotar pelas tentações. Entre essas tentações, está o pensamento de que fomos “jogados para escanteio”. Em meio ao desafio, algumas impressões podem surgir: “não sou mais consultado para nada”, “sou um inútil”, “não tenho mais ousadia, nem criatividade”, “sou um estorvo no ritmo ordinário da obra”.
No entanto, um coração apaixonado e que ama a Deus com sinceridade sempre encontrará novas formas de continuar amando e servindo ao Senhor. Saiba que, na maioria das vezes, será justamente através desse eventual obstáculo ou provação que encontraremos escondidos os recursos e instrumentos oportunos da graça de Deus. Por sua vez, esses instrumentos imprimirão em nós o perfil de santidade pensado pelo Senhor.
A matemática é: “Diga-me quais as alegrias e tristezas você traz e poderemos intuir o tipo de santo que Deus quer que você seja. Mostre-me o santo que você é e poderemos intuir os conflitos e alegrias que você traz”. Isso é amar a Deus de modo incondicional. Há um personagem bíblico que muito me fala, quando a temática é a fidelidade e ardor missionário, trata-se do grande apóstolo São Paulo. Deixo, assim, à sua disposição, um trecho de uma de suas últimas cartas, que parece um testamento espiritual:
“Caríssimo, quanto a mim, eu já estou para ser oferecido em sacrifício; aproxima-se o momento de minha partida. Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. Agora está reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que esperam com amor a sua manifestação gloriosa. Na minha primeira defesa, ninguém me assistiu; todos me abandonaram. Oxalá que não lhes seja levado em conta. Mas o Senhor esteve ao meu lado e me deu forças, ele fez com que a mensagem fosse anunciada por mim integralmente e ouvida por todas as nações; e eu fui libertado da boca do leão. O Senhor me libertará de todo mal e me salvará para o seu reino celeste. A ele a glória pelos séculos dos séculos! Amém” (2 Tm 4,6-8.16-18).
Deus te abençoe sempre, Shalom!