Frei Patrício Sciadini, ocd.
Irmã Elisabeth da Trindade, ocd.
O Papa João Paulo II declarou o dia internacional da mulher, “o dia do Jubileu das mulheres”.
Aproveitando esta oportunidade, quero prestar a minha homenagem a todas as mulheres e agradecer-lhes a força que possuem de humanização e de amor, capazes de conquistar o coração e de fazer-nos experimentar a ternura e a bondade de Deus. A mulher, mais do que o homem, é um reflexo do amor trinitário onde, na comunicação do amor, a vida se faz presente e comunica-se.
A missão da mulher é imensa neste momento histórico em que estamos vivendo. Será sua missão não permitir que a humanidade se distancie das coisas belas da vida. Ela carrega toda a força de sensibilidade e de delicadeza necessárias para a alegria da vida.
Fui educado por mulheres
Não conheci meu pai. Ele foi vítima da guerra e morreu aos 12 de julho de 1944. Nada de mais insano que a guerra. Em sua irracionalidade, alimenta o desejo de grandeza e de orgulho de poucos políticos, pagando o duro preço com vidas humanas que vão à guerra e morrem sem saber por que. Na morte de meu pai, minha mãe Domênica estava grávida de mim. Ela me educou com amor e com carinho e, na sua pobreza, soube dar-me princípios de respeito e de amor para com todas as pessoas. Nunca fez pesar sobre mim a falta de pai, mas, com a ternura feminina que possuía, introduziu-me na vida. Dela aprendi muitas coisas e uma das mais importantes foi respeitar as mulheres e ter para com elas uma veneração muito grande. Nas mulheres, sempre vi espelhada a grandeza de coração e a força educativa – não com as palavras, mas com a vida.
Em minha mãe, quero prestar a minha homenagem a todas as mulheres mães que lutam para educar os próprios filhos. As viúvas que, vendo-se privadas da presença do marido, sabem viver com dignidade a própria viuvez na fidelidade ao amado que lhes foi arrancado com a morte. Recordo minha mãe dizer que nunca se casaria de novo porque o amor prometido a meu pai foi para sempre.
Na vida religiosa, tive a alegria de escolher uma Ordem, o Carmelo, onde as mulheres sempre tiveram uma projeção toda especial e foram grandes educadoras. Mulheres que, pela própria santidade e humanidade, souberam viver uma missão especial. No Carmelo nunca faltou o feminino que dá a todos os carmelitas descalços um toque todo particular. Conviver com uma espiritualidade dirigida por mulheres não somente é um fato acidental, mas algo de mais profundo e essencial.
Nunca poderei esquecer o meu primeiro encontro com Santa Teresa de Ávila. Nela, vi o reflexo do amor de Deus e o amor de minha mãe Domênica. Teresa cativou-me imediatamente, não tanto pela sua inteligência, nem pela sua experiência mística da qual nada sabia, mas pela sua humanidade, pela sua simpatia. Eu a considerava uma mulher bonita, atraente, delicada. Uma mulher que sabia, com fino humor, vencer todas as barreiras. À medida que fui lendo seus escritos, encontrei-me seduzido por ela e fiz dela minha mãe, mestra e mistagoga nos caminhos do Espírito. Ela revela toda a profundidade do coração feminino, sabe tratar de Deus com extrema simplicidade e aplica aos mistérios do amor eterno o amor humano. Como é bonito quando ela diz que não encontrou nenhum exemplo para falar do matrimônio espiritual a não ser o matrimônio humano. “…Deu-me sua mão direita e disse-me: ‘olha este cravo, é sinal que serás minha esposa desde hoje… daqui por diante não só como Criador e como Rei e teu Deus olharás a minha honra, mas como verdadeira esposa minha’.”
Como costuma chamar a Jesus “meu Esposo”! E trata-o com tanta ternura e bondade… “Vós bem sabeis, Bem meu, que, se tenho algum bem, ele não me é dado por outras mãos senão pelas Vossas… sois o Bem que supera todos os bens… Ó meu Senhor e meu Esposo, já é hora de nos vermos!”
Em Teresa de Ávila quero prestar a minha sincera homenagem a todas as mulheres que no dia-a-dia lutam na experiência mística e que nos ensinam a rezar com o nosso coração humano. A todas as teólogas que, com força e quase “violência”, conquistam o próprio espaço na teologia, na mística, na Igreja, na sociedade.
Em Santa Teresinha do Menino Jesus, Elisabeth da Trindade, Teresa de los Andes, encontrei irmãs me que fizeram compreender que a mulher jamais pode ser “objeto”, mas uma companheira fiel na vida com quem tecemos, quer sejamos casados ou celibatários, um relacionamento de amor.
A maior alegria é quando sabemos olhar nos olhos de uma mulher contemplando nela a beleza do Deus criador. Jesus deu-nos a medida da nossa pureza e de como devemos ver as mulheres. “Quem olhar uma mulher desejando-a já cometeu adultério” (Mt 5,28). E a mulher que olhou para o homem desejando-o já cometeu adultério. Sabemos em que consiste esse desejo. É o desejo da paixão não purificada, do amor sensual e sexual não visto como caminho de complementaridade e de sentido profundo da vida.
Nenhuma mulher poderá viver sem a presença do homem e nenhum homem sem a presença da mulher. Deus os fez homem e mulher para se ajudarem mutuamente.
Assim como a mulher humaniza o homem e educa-o para a sensibilidade e ternura, também o homem ajuda a mulher a ser mais objetiva na vida e na forma de se expressar. Ele pode educá-la a uma purificação de sentimentalismos exagerados, pode levá-la a uma profundidade e agudeza maior de pensamento e à busca do essencial. Num relacionamento de verdadeiro companheirismo entre o homem e a mulher, nota-se também como geralmente o homem transmite à mulher um sentido de segurança e de coragem, enquanto esta sabe ficar no anonimato para ceder consciente e livremente o lugar de destaque a ele. É próprio na mulher uma certa capacidade para a oblatividade.
A nova fecundidade e maternidade que devemos buscar é gerar ao nosso redor o verdadeiro amor. Um amor que constrói e que nos torna capazes de doar a nossa vida.
Nestas santas do Carmelo quero prestar a minha homenagem a todas as jovens que buscam na vida consagrada não uma fuga, mas a plenitude, a dedicação sem limites, e assumem, desde a própria consagração, todos os sofrimentos da humanidade.
Maria, a mulher perfeita
Nunca deveríamos nos cansar de olhar para Maria como modelo de toda mulher. Em Maria, virgindade e maternidade se fundem numa maravilhosa harmonia. Nela, contemplamos a maturidade afetiva que, integrada pela fé, oferece-nos um novo caminho de libertação e de alegria na própria vida.
Deus, na Encarnação do Verbo, dispensou a cooperação do homem mas não da mulher. Essa única realidade deveria fazer exultar todas as mulheres e fazer do “Magnificat” o seu cântico de libertação. Deus continua a olhar cada mulher com carinho e amor, como um dia olhou para a Virgem Maria, chamando-a a esse grande gesto de cooperação. Enquanto houver homens e mulheres abertos ao mistério da vida, teremos a experiência do amor.
Em Maria de Nazaré, a mulher assume o seu verdadeiro valor e sentido. O mundo feminino, depois do mistério da Encarnação, não será o mesmo. A mulher não foi criada nem mais nem menos importante que o homem, mas como alguém sem o qual não existe a presença da vida.
Na escola de Maria de Nazaré, devemos aprender a respeitar a mulher e a colocar-nos lado a lado na construção de um mundo novo.
No dia do “Jubileu das mulheres”, todos os homens devem pedir desculpa a elas por não as amar como merecem, por não as respeitar e por transformá-las tantas vezes em objeto descartável. Resgatar a dignidade da mulher é obra de todos.
Em Maria, quero prestar a minha homenagem a todas as mulheres que se abrem à vida, que lutam para gerar vida e são capazes de morrer para que a vida possa viver. Amar Maria é amar toda mulher.
O que mais me comove em Maria é contemplá-la grávida, carregando e gerando a vida. Que toda mulher grávida possa ser sempre o símbolo mais forte da vida e encontre em todos acolhida. Quem acolhe uma mulher grávida não acolhe somente uma vida, mas duas. Que toda mulher grávida, seja quem for, sempre se sinta amada, jamais explorada.
Não posso concordar
Gosto muito de viver! Agradeço ao Senhor porque minha mãe Domênica soube levar à frente uma gravidez difícil e não optou por abortar-me. O meu amor pela vida não me permite concordar com algumas atitudes que andam soltas por aí com filosofias e ideologias que nós, vivos, queremos impor aos que estão para nascer. Concordo com um planejamento familiar sadio, orientativo, cristão que, na paternidade e maternidade responsáveis, dão a vida a novos seres no momento certo.
Concordo com o sadio feminismo que resgata toda a sacramentalidade do corpo e uma espiritualidade da sexualidade vista como caminho de transmissão da vida e como complementaridade que ajuda a viver a harmonia do encontro humano. É bom como o novo conhecimento do ser humano leva-nos a uma nova leitura ética do relacionamento homem-mulher.
Não posso concordar com teorias “abortistas” como sinais de liberdade e capacidade de gerir a própria vida eliminando a alheia. Nem posso concordar com um feminismo masculinizante que faz a mulher perder a sua força amorosa e afetiva. A mulher é a flor mais bela da humanidade que deve ser cultivada no jardim da vida, dando-lhe a liberdade de florescer, de dar seu fruto e de encontrar o ambiente que lhe permite viver em totalidade sua existência.
Não podemos concordar com um mundo desumano que obriga as mulheres a deixar seus filhos aos cuidados dos outros para ir trabalhar e ganhar o seu pão de cada dia. No meu modesto entender, “creches e asilos de velhos” são, na maioria das vezes, frutos de desamor, de egoísmo. Toda mãe deveria ter o melhor salário para educar seus filhos. Todos sabemos que não é suficiente dar a vida, é necessário cuidar dela e fazê-la crescer.
É triste saber que as mulheres recebem salários mais baixos que os homens, e são colocadas, às vezes, nos lugares mais duros de trabalho.
Que o Jubileu nos leve a todos a contemplar a mulher não como um ser de segunda categoria, mas alguém que, igual ao homem, caminha ao seu lado para fazer nascer uma nova sociedade.
Ave Maria, mulher cheia de Graça
Que em toda mulher eu saiba contemplar a ternura de Deus;
Que em toda mulher grávida eu saiba adorar a vida;
Que em toda mulher eu possa ver alguém que me complementa;
Que eu possa lutar com toda a força para que não haja mais mulher marginalizada, sofrida, desrespeitada.
Que nenhuma mulher seja obrigada a se vender e a prostituir-se para poder sobreviver…
A toda mulher, seja quem for, quero prestar a minha homenagem e pedir perdão porque nem sempre as amei nem lutei ao seu lado.
Deus abençoe cada mulher neste dia e que sejam muito felizes!
Amém.