Vem aumentando o número de clínicas para tratamento de doenças de origem psíquica ou nervosa. Não faltam clientes. Pelo contrário, o número de doentes nessa área vem aumentando. Quais seriam as causas? Com certeza, uma das causas é de origem religiosa. É o que acontece com as pessoas escrupulosas. Não tendo conseguido se libertar da triste lembrança de seus erros e dos desvios dos caminhos de Deus, na sua vida passada, essas pessoas vivem agora a sua idade madura ou sua velhice cheia de angústias, ansiedades e escrúpulos. Essas pessoas continuaremos atendendo com carinho e zelo sacerdotal.
O passado, em tudo aquilo que foi negativo, deve ser esquecido. Devemos nos libertar da força negativa de tudo que se passou. Esse é o tema das três leituras da missa de amanhã, quinto domingo da quaresma: “Não relembreis coisas passadas; não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas que, aliás, já estão surgindo; acaso não as reconheceis?” Esta é a afirmação do profeta Isaias 43, 18, que está na primeira leitura da missa de amanhã. O povo de Israel, esquecendo todas as amarguras e sofrimentos no Egito, proclama as maravilhas da nova situação: “Quando o Senhor conduziu os exilados de Sião, parecíamos sonhar; nossa boca encheu-se de sorrisos e de júbilo a nossa língua” (Cant. De Medit. Da missa de amanhã).
Mas quem nos ensina, de modo claro e eloqüente, que devemos esquecer tudo de negativo que ficou para traz é o apóstolo Paulo: “Uma coisa, porém, eu faço: esquecendo tudo o que fica para trás, faço todo esforço para alcançar o que está na frente” (Fil. 3,13) . Quem mais do que Paulo tem uma vida passada tão negativa, cheia de gestos criminosos, como ele mesmo afirma: “Persegui a Igreja de Cristo; não mereço o título de apóstolo” (1 Cor. 15,9). Mas, tudo isso ficou para trás, deve ser esquecido: “Eu esqueço o que ficou para trás de mim” (Fil. 3,13). Devemos, porém, ter a idéia bem clara que toda essa firmeza que Paulo tinha do presente e do futuro provinha da escolha firme e definitiva da pessoa de Jesus Cristo, que ele tinha feito: “Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor. Por causa dele eu perdi tudo. Considero tudo como lixo para ganhar Cristo” (Fil. 3,8).
Também o evangelho da missa de amanhã (Jo. 3, 1-11) está bem dentro do tema de esquecer o que, em nossa vida, foi negativo no passado. Trata-se do episódio da adúltera. A lei judaica era muito severa no caso da fraqueza da mulher; se fosse vista em adultério, devia se apedrejada. Para o homem havia certos subterfúgios. E hoje? Parece-me que em vez de os homens assumirem a paridade de condições, a mulher vem reivindicando falas liberdades.
Os fariseus fizeram uma pergunta maldosa a Jesus: “Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério” (Jo. 8,4). Jesus tinha fama de ser liberal; e eles estavam curiosos por saber o que Jesus iria responder. A resposta inesperada de Jesus confundiu a todos: Quem dentre vós não tiver pecado seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra” (Jo. 8,7).
Cheio de bondade e misericórdia, Jesus se volta para a pecadora: “Mulher, ninguém te condenou? Nem eu te condeno; poder ir e de hoje em diante não peques mais!” (Jo. 8,10 e 11).
Aprendamos também nós a esquecer o passado, com suas manchas escuras do pecado, do erro e do desacerto. Em Cristo fomos renovados. Aprendamos com Paulo a olhar sempre para frente: “Esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente. Corro direto para a meta, rumo ao prêmio que, do alto, Deus me chama para receber em Cristo Jesus” (Fil. 3, 13 e 14).
Dom Antônio de Sousa
Bispo emérito de Assis