Formação

Onde fala Jesus? E onde Ele não fala?

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Frei Raniero Cantalamessa o.c.d

mat1_1665“Este é meu Filho amado, escutai-o”. Com estas palavras, Deus Pai dava Jesus Cristo à humanidade como seu único e definitivo Mestre, superior às Leis e aos profetas.

Onde fala Jesus hoje, para que possamos escutá-lo? Fala-nos antes de tudo por meio de nossa consciência. Ela é uma espécie de “repetidor”, instalado dentro de nós, da própria voz de Deus. Mas, por si só ela não basta. É fácil fazê-lo dizer o que nós gostamos de escutar. Por isso, necessita ser iluminada e sustentada pelo Evangelho e pelo ensinamento da Igreja. O Evangelho é o lugar por excelência no qual Jesus fala-nos hoje. Mas, sabemos por experiência que também as palavras do Evangelho podem ser interpretadas de maneiras distintas. Quem nos assegura uma interpretação autêntica é a Igreja, instituída por Cristo precisamente com tal fim: “Quem a vós escuta, a mim escuta” (Lc10,16). Por isso, é importante que busquemos conhecer a doutrina da Igreja, conhecê-la em primeira mão, como ela mesmo a entende e a propõe, não na interpretação – frequentemente distorcida e redutiva – dos meios de comunicação.

Quase igualmente importante como saber onde fala Jesus hoje é saber onde não fala. Ele não fala certamente através de magos, adivinhos, astrólogos, pretensas mensagens extraterrestres; não fala nas sessões de espiritismo, no ocultismo. Na Escritura, lemos esta advertência a respeito: “Não haja entre ti ninguém que faça passar seu filho ou sua filha pelo fogo, que pratique adivinhação, astrologia, feitiçaria ou magia, nenhum encantador nem consultor de fantasmas ou adivinhos, nem invocador de mortos. Porque todo aquele que faz estas coisas é uma abominação para teu Deus” (Dt 18,10-12).

Estes eram os modos típicos dos pagãos de referir-se ao divino, que buscavam a sorte consultando os astros, ou vísceras de animais, ou no vôo dos pássaros. Com essa palavra de Deus: “Escutai-o!”, tudo aquilo acabou. Há um só mediador entre Deus e os homens; não estamos obrigados a ir“às cegas” para conhecer a vontade divina, a consultar isto ou aquilo. Em Cristo temos toda resposta.

Lamentavelmente, hoje aqueles ritos pagãos voltam a estar na moda. Como sempre, quando diminui a verdadeira fé, aumenta a superstição. Tomemos a coisa mais inócua de todas: o horóscopo. Pode-se dizer que não existe jornal ou emissora de rádio que não ofereça diariamente a seus leitores ou ouvintes o horóscopo. Para as pessoas maduras, dotadas de um mínimo de capacidade crítica ou de ironia, isso não é mais que uma inócua brincadeira recíproca, uma espécie de jogo e de passatempo. Mas, enquanto isso, olhemos os efeitos ao largo. Que mentalidade se forma, especialmente nos jovens e nos adolescentes? Aquela segundo a qual o êxito na vida não depende do esforço, da aplicação no estudo e constância no trabalho, mas de fatores externos,imponderáveis; de conseguir dirigir em proveito próprio certos poderes, próprios ou alheios. Pior ainda: tudo isso induz a pensar que, no bem ou no mal, a responsabilidade não é nossa, mas das “estrelas”, como pensava Ferrante, de lembrança manzoniana (em referência ao romance “Os noivos” de AlessandroManzoni – 1785-1873)

Devo aludir a outro âmbito no qual Jesus não fala e onde,contudo, se lhe faz falar todo o tempo. É o das revelações privadas, mensagens celestiais, aparições e vozes de natureza variada. Não digo que Cristo ou a Virgem não possam falar também através destes meios. Fizeram-no no passado e podem fazer, evidentemente, também hoje. Só que antes de dar por certo que se trata de Jesus ou da Virgem, e não da fantasia enferma de alguém, ou pior, de farsantes que especulam com a boa fé das pessoas, é necessário ter garantias. Necessita-se neste campo esperar o juízo da Igreja, não precedê-lo. São ainda atuais as palavras de Dante: “Sede, cristãos, mais firmes ao mover-vos; não sejais como pena a qualquer sopro” (Par. V,73s.)

São João da Cruz dizia que desde que, no Tabor, disse-se de Jesus: “Escutai-o!”, Deus se fez, em certo sentido, mudo. Disse tudo; não tem coisas novas para revelar. Quem lhe pede novas revelações, ou respostas,ofende-o, como se não se houvesse explicado claramente ainda. Deus segue dizendo a todos a mesma palavra: “Escutai-o!”, lede o Evangelho: aí encontrareis nem mais nem menos do que buscais.

Formação Dezembro 2009


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