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Os nigerianos estão juntos pela liberdade e dignidade

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Entrevista com D. Ignacio Kaigama, presidente da Conferência Episcopal da Nigéria

Na noite de 14 de abril, cerca de 275 meninas foram raptadas de uma escola pública, na cidade de Chibok, no estado de Borno, Nigeria. O grupo extremista Boko Haram assumiu a responsabilidade do sequestro. A Fundação AIS falou com D. Ignacio Kaigama, arcebispo de Jos e presidente da Conferência Episcopal da Nigéria:

Fundação AIS: Mons. Kaigama, esta não é a primeira vez que o grupo Boko Haram comete um ato de violência contra vítimas inocentes na Nigéria, mas desta vez o golpe chocou o mundo.

Mons. Kaigama: Eles queriam ferir o coração da Nigéria. Estou muito preocupado. Essas meninas nunca saíram da cidade e agora encontram-se na selva. Rezo para que os valores religiosos que o grupo Boko Haram defende sejam suficientes para respeitarem a dignidade dessas meninas. Elas são simplesmente meninas inocentes. A vida é sagrada.

Fundação AIS: É trágico que tenha de acontecer algo tão terrível para atrair a atenção do mundo.

Mons. Kaigama: Sim, o grupo Boko Haram tem cometido uma série de ataques e já mataram milhares de pessoas desde 2009. Na minha própria diocese de Jos, já sofremos vários ataques, por exemplo, contra a igreja católica de St. Finbarr, onde morreram 14 pessoas. Em Fevereiro, o grupo terrorista assassinou mais de 100 homens cristãos nas aldeias de Doron Baga Izghe, mas a comunidade internacional não reagiu. Desta vez foi diferente porque se trata de meninas inocentes e também porque afecta directamente o sofrimento de mulheres, as mães dessas meninas. E as mulheres podem identificar-se melhor com o sofrimento dos outros. As mulheres começaram a organizar manifestações: tanto com cristãos como com muçulmanos.

Fundação AIS: Apesar do grupo Boko Haram perseguir os cristãos e tentar islamizar todo o país, não é verdade que cada vez mais a perseguição e a violência afectam também a comunidade muçulmana?

Mons. Kaigama: Sim. No início, a ideia principal era destruir o Cristianismo, os denominados “valores ocidentais” e implementar a lei da Sharia, no norte da Nigéria. Os ataques dirigiram-se não só contra os cristãos, como também contra a polícia e outras instituições representativas dos valores ocidentais. Mas agora ninguém pode dizer que eles atacam apenas os Cristãos. O grupo Boko Haram matou também clérigos muçulmanos. Neste momento, não se trata apenas de uma luta entre norte e sul, nem tão pouco entre muçulmanos e cristãos. Trata-se de seres humanos. Os nigerianos estão juntos pela liberdade e dignidade; está a crescer uma única voz, uma voz que diz: «a violência não é a solução.

Fundação AIS: Quantas destas meninas raptadas são cristãs, e em que medida o elevado número de cristãs foi o motivo deste rapto?

D. Kaigama: A maioria das meninas são cristãs. A maioria das meninas que escaparam eram cristãs, pelo que podemos também supor o mesmo das outras meninas que ainda se mantêm sequestradas. Mas também é verdade que algumas são muçulmanas e também foram sequestradas. Portanto, este incidente demonstra uma vez mais que o grupo Boko Haram também se dirige contra os muçulmanos.

Fundação AIS: Não têm faltado críticas sobre a reacção do Governo relativamente à violência perpetrada pelo grupo Boko Haram, especialmente após o rapto das meninas. Essas críticas são justificadas?

D. Kaigama: O Governo subestimou a crise Boko Haram e, por isso, demorou a reagir. Parte do problema é que os recursos não são usados correctamente para fornecer as condições adequadas aos agentes de segurança e facilitar-lhes o equipamento apropriado para lutar contra a violência, talvez devido a algumas práticas corruptas. Algumas fontes das forças de segurança  queixam-se de que as armas do grupo Boko Haram são mais sofisticadas e são mais desenvolvidas do que as da polícia e do exército. Os recursos devem chegar às pessoas certas. Além disso, as famílias dos soldados que morreram ao tentar defender as pessoas não têm recebido ajuda suficiente. É importante que estas famílias recebam assistência.

Fundação AIS: O que é que a Igreja Católica está a fazer em resposta aos sequestros?

D. Kaigama: Temos tentado o diálogo e não tem funcionado. O Governo recorreu à força e não funcionou. Neste momento, o que temos de fazer é rezar: apenas Deus pode tocar o coração destas pessoas. Rezamos e pedimos as vossas orações. Como presidente da Conferência Episcopal , escrevi a todos os católicos da Nigéria, para que fizessem uma hora de Adoração, pedindo a todos os bispos, sacerdotes e fiéis que rezem por elas.

Fundação AIS: O que pede nas suas orações?

D. Kaigama: Rezo por três intenções: em primeiro lugar, que libertem as meninas o mais rapidamente possível, sãs e salvas. Em segundo lugar, que o grupo Boko Haram pare estes ataques e acabe com a violência. E em terceiro lugar, que o Governo receba ajuda de outros países de todo o mundo. Que os países se unam para lutar contra o terrorismo, a fome, a pobreza a fim de criar uma unidade autêntica e não apenas para servir os -hipócritas- interesses políticos.

Fundação AIS: Este problema já se arrasta há cinco anos. Tem esperança de que a comunidade internacional possa resolver este problema, agora?

D. Kaigama: Nós temos de nos manter unidos, esta é a única solução. O grupo Boko Haram tem armas, mas como é que estas armas chegaram aos terroristas? De onde vem este dinheiro? Quem os treina? Creio que a comunidade internacional pode solucionar. Eu sou um padre e esse não é o meu trabalho, mas penso que, se os governos internacionais colaborarem entre si, então pode haver uma solução. A Nigéria desempenha um papel importante em África e no mundo. É melhor ajudar agora antes que seja tarde demais e tornar-se ainda mais complicado.

Fonte: Fundação AIS/Zenit


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