Formação

Pagamento do Reino é igual para todos

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Comentário do Padre Raniero Cantalamessa, OFM Cap., Pregadorda Casa Pontifícia, sobre a Liturgia da Palavra deste domingo.

 

XXV Domingo do Tempo Comum

Isaías 55, 6-9; Filipenses 1, 20c-27a; Mateus 20, 1-16a

“Ide vós também para a minha vinha”

 

A parábola dos trabalhadores enviados à vinha em horasdiferentes do dia sempre gerou grande dificuldade aos leitores do Evangelho. Éaceitável a maneira de atuar do dono, que dá o mesmo pagamento para quemtrabalhou uma hora e para quem trabalhou uma jornada inteira? Ele não viola oprincípio da justa recompensa? Os sindicatos hoje se rebelariam contra quemcomportasse como esse patrão.

 

A dificuldade nasce de um equívoco. Considera-se o problemada recompensa em abstrato e em geral, ou em referência à recompensa eterna nocéu. Visto assim, realmente haveria uma contradição com o princípio segundo o qualDeus "dá para cada um segundo suas obras" (Rm 2, 6). Mas Jesus serefere aqui a uma situação concreta, a um caso bem preciso: o único denário queé dado a todos é o Reino dos Céus que Jesus trouxe à terra; é a possibilidadede entrar para fazer parte da salvação messiânica. A parábola começa dizendo:"O Reino dos céus é como a história do patrão que saiu demadrugada…".

 

O problema é, mais uma vez, o da postura dos judeus e dospagãos, ou dos justos e dos pecadores, frente à salvação anunciada por Jesus.Ainda que os pagãos (respectivamente, os pecadores, os publicanos, asprostitutas, etc.) só diante da pregação de Jesus se decidiram por Deus,enquanto antes estavam afastados ("ociosos"), não por isso ocuparãono Reino um lugar diferente e inferior. Eles também se sentarão à mesma mesa egozarão da plenitude dos bens messiânicos. E mais, como eles se mostraram maisdispostos a acolher o Evangelho que os chamados "justos", realiza-seo que Jesus diz para concluir a parábola de hoje: "os últimos serão osprimeiros e os primeiros serão os últimos".

 

Uma vez conhecido o Reino, ou seja, uma vez abraçada a fé,então sim há lugar para a diversificação. Então já não é idêntico o destino dequem serve Deus durante toda a vida, fazendo render ao máximo seus talentos,com relação a quem dá a Deus só as sobras de sua vida, com uma confissãoremediada, de alguma forma, no último momento.

 

A parábola contém também um ensinamento de ordem espiritualda máxima importância: Deus chama todos e chama em todas as horas. O problema,em suma, é o chamado, e não tanto a recompensa. Esta é a forma com que nossaparábola foi utilizada na exortação de João Paulo II sobre a "vocação emissão dos leigos na Igreja e no mundo" (Christifideles laici): "Osfiéis leigos pertencem àquele Povo de Deus que é representado na imagem dostrabalhadores da vinha (…). Ide vós também. A chamada não diz respeito apenasaos Pastores, aos sacerdotes, aos religiosos e religiosas, mas estende-se aosfiéis leigos: também os fiéis leigos são pessoalmente chamados peloSenhor" (n. 1-2).

 

Quero chamar a atenção sobre um aspecto que talvez sejamarginal na parábola, mas que é muito vivo na sociedade moderna: o problema dodesemprego. À pergunta do proprietário: "Por que estais aí o dia inteirodesocupados?", os trabalhadores respondem: "Porque ninguém noscontratou". Esta resposta poderia ser dada hoje por milhões dedesempregados.

 

Jesus não era insensível a este problema. Se Ele descrevetão bem a cena é porque muitas vezes seu olhar havia pousado compassivamentesobre aqueles grupos de homens sentados no chão, ou apoiados em uma porta, comum pé na parede, à espera de serem contratados. Esse proprietário sabe que osoperários da última hora têm as mesmas necessidades que os outros; também elestêm filhos para alimentar, como os da primeira hora. Dando a todos o mesmopagamento, o proprietário mostra levar em conta não só o mérito, mas também anecessidade.

 

Nossas sociedades capitalistas baseiam a recompensaunicamente no mérito (com freqüência mais nominal que real) e no tempo deserviço, e não nas necessidades da pessoa. No momento em que um jovem operárioou um profissional tem mais necessidade de ganhar para construir uma casa e umafamília, seu pagamento é o mais baixo, enquanto que no final da carreira,quando já se tem menos necessidade, a recompensa (especialmente em certascategorias sociais) chega às nuvens. A parábola dos operários da vinha nosconvida a encontrar um equilíbrio mais justo entre as duas exigências, domérito e da necessidade.


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